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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




sábado, 15 de dezembro de 2012

Iconografia do Divino

 

            Observou ABREU (1999)*, em comentário sobre as folias cariocas do século XIX, que:

 "o trânsito da pombinha era bastante amplo entre os diferentes segmentos sociais da cidade e redondezas, seus significados – e os da comemoração, em termos amplos – eram suficientemente universais para permitir a apropriação de todos (...) nenhum segmento social, étnico ou profissional, identificou-se seletivamente com ela, elegendo-a para sua própria proteção" (p.52).

            Ainda essa autora, baseando-se em Mary Karasch, comentou acerca da devoção dos escravos ao Divino, que os bantus angolanos e congoleses poderiam ter associado a forma da pomba à do pássaro, que na concepção religiosa centro-africana representa o limite entre o dia e a noite e por conseguinte entre a vida e a morte (p.53).

            O lado místico se revela pela própria abstração de uma devoção não antropomórfica.

       A representação artística do Espírito Santo sob a forma de pomba branca é bem típica e uniforme. Surge nas esculturas e pinturas. Quando possível é acrescida de elementos simbólicos que reforçam as impressões populares pela adição de efeitos. Entendo-os assim: 

-          efeitos luminosos (halo, fachos, raiadas, línguas de fogo);
-          efeitos de santidade (auréola, resplendor);
-          efeitos de poder (coroa, cetro);
-          efeito de pacificação e esperança (ramo verde no bico, interpretado como de uma oliveira);
-         efeitos sacramentais (1- figuração de água – lembrança do batismo de Cristo no Rio Jordão; 2- pombinha ao centro de uma custódia – representação bastante generalizada);
-        efeitos de divindade (1- pintura de nuvens se afastando para aparição da pomba; 2- nuvens em torvelinho ao seu redor, acinzentadas como num cataclisma; 3- céu se abrindo, como se tragado de um plano superior donde emana luz, representado em gradação branca-amarela-laranja);
-          efeito de efusão (vento representado como tracejado paralelo branco-azulado-cinzento,  saindo da pomba em direção à Terra);
-         efeito de movimento (quase sempre a pomba está de asas abertas, pairando ou voando em graciosa lateralidade, ou ainda, em fase de descida. Por estar voando suspensa confere a ideia de estar acima de nós, de um ser superior).

Interior do oratório de pescoço da Festa do Divino de São João del-Rei.
Escultura e pintura: Osni Paiva. 

Em São João del-Rei a imagem que há no Santuário de Matosinhos foi doada pelo Imperador do Divino Tomaz Antônio Gonçalvez. Tem a forma de custódia. Atrás dela existe a seguinte inscrição: “Feita nesta cidade de São João del-Rei, em maio de 1868, por Manoel Pereira Maya, natural de Piracatu[1], por mandado do Imperador do Espírito Santo Thomaz”. A inscrição foi descoberta numa restauração. Retirou-se então dezesseis lâmpadas coloridas, com as respectivas boquilhas, que alguém fixara nas raiadas da imagem, descaracterizando-a. O acréscimo de gosto duvidoso, fora realizado na segunda metade do século XX, dando-lhe aparência de árvore de Natal com pisca-pisca aceso, ou de entrada de clube noturno. Atrás, sobre a dita inscrição, um terrível emaranhado de fios punha a peça sacra sob o risco de incêndio, por um muito plausível curto-circuito. Considere-se que é feita de madeira. Retomou sua autenticidade.

Imagem do Divino de Matosinhos antes e depois da restauração.
Acervo da Paróquia do Santuário do Senhor bom Jesus de Matosinhos,
São João del-Rei/MG. 

Notas e Créditos

* ABREU, Martha. O Império do Divino: festas religiosas e culturas popular no Rio de Janeiro, 1830-1900. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo: FAPESP, 1999. Col. Histórias do Brasil.
** Texto e fotomontagem: Ulisses Passarelli


[1] - Piracatu (sic): possivelmente Paracatu, cidade do noroeste mineiro.

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