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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Arruamento em Matosinhos

         O engenheiro José de Carvalho Almeida, em 1893, realizou estudos do sistema de várzeas do Marçal, do Porto e da Água Limpa (Matosinhos), com vistas a instalação da futura capital mineira nesta área. No relatório consta esta observação[1]:

"A Varzea de Mattosinhos possue igreja regular e alguns predios de valor (p.7) (...) O bairro de Mattozinhos, que será absorvido na futura cidade, possue uma boa igreja e alguns predios regulares de algum valor. Seu arruamento é pessimo; podendo ser transformado lentamente, coagindo-se os proprietarios, nos casos de reparação e reconstrucção dos predios actuaes, ou construcções de novos, a obedecer ao plano de arruamento e edificação que for decretado"(p.19).

         O crescimento urbano do bairro inicia aproximadamente por essa época, como fica claro na resolução nº 210 da Câmara Municipal, de 22/03/1899, que cria uma comissão provisória ... [2] “para dar nomes a certas ruas do Barro, Mattosinhos e outros pontos da cidade, afim de se poder regularisar o lançamento de impostos”. Eram portanto vias novas que se abriam e que nem nomes tinham ainda.

O arruamento de Matosinhos no século XX teve origem com o fim das grandes e numerosas chácaras, cujo levantamento fornece HENRIQUES (2003). Elas espalhavam-se aqui e acolá pela área do grande bairro, ligadas tenuemente por trilhas e caminhos precários, carroçáveis no máximo.

O aspecto urbano era pois esparso, pouco denso, com muito verde. A exceção era a praça do templo, que tinha um pequeno núcleo de construções.

Outro núcleo, aliás diminuto, estava na atual comunidade de Santa Clara, hoje contido no Grande Matosinhos (parece que originalmente fez parte do bairro das Fábricas). Em 28 de junho de 1901, a câmara decide proibir a construção de casas entre o Córrego do Lenheiro e a via férrea, e o Ribeirão da Água Limpa e o córrego da Tabatinga (que desce da Caieira, hoje bairro São Judas Tadeu). A mesma resolução autorizava a despesa de seiscentos mil réis para indenização de concessões anteriores, bem como, arborização da praça ali existente, a qual se deu então, o nome de Pedro Paulo, em homenagem ao antigo comandante da guarnição militar desta cidade, coronel Pedro Paulo da Fonseca Galvão [3].

Com base nessa resolução, a câmara indeferiu os requerimentos de concessão de lotes na “rua da Fábrica de Louça” (que dá acesso à Bernardo Guimarães, antes da Ponte Beltrão), feitos por José Joaquim Chaves, Guellere Giovani Maria, Affonso Neves de Carvalho e de José Antônio das Neves [4].

Segundo relatório do tenente-coronel Francisco Joaquim de Andrade e Silva, prestado à câmara, datado de 12 de julho de 1901, Matosinhos media então 55.000 metros quadrados [5], o que dá uma ideia do tamanho do bairro na época.

Em 1905, no lançamento de impostos prediais para Matosinhos, aparece na “Beira da Praia” (margem do ribeirão da Água Limpa) cinco propriedades da viúva do dr. Queiroz, perfazendo 144.000 de valor locativo [6].

Outra referência ao aspecto daquele núcleo urbano é esta, destacando o templo [7]:

"Egreja do Senhor Bom Jesus de Mattosinhos, mediana, situada mais perto do Rio das Mortes, em um logar ameno, no meio de um quadrilatero formado pelas casas de campo. O frontispicio com duas torres é bonito, e o interior é de um aceio que reluz. (A vasta praça em que está situada esta egreja denomina-se hoje “Chagas Doria” e é ahi que está sendo levantado o pavilhão para a exposição que será realisada em 8 de dezembro do corrente anno)."

     Nos anos trinta o bairro era formado por poucas ruas, todas sem pavimentação [8]:

-          Praça Chagas Dória (antigo Largo de Matosinhos; atual Praça Senhor Bom Jesus de Matosinhos).
-          Rua do Matadouro Novo [9] (atual Amaral Gurgel): 950m de extensão.
-          Rua Bernardo Guimarães (nome mantido): 360m.
-          Rua Josué de Queiroz (nome conservado, porém como avenida): 450m.
-          Rua do Porto (atual Tomé Portes del-Rei): 70m.
-          Rua 13 de Maio (atual João Hallack): 260m.
-          Rua 6 de Abril (atual General Aristides Prado): 175m.
-          Rua 21 de Abril (atual Dr. Kleber Filgueiras): 180m.
-          Rua 7 de Setembro (nome mantido, mas como avenida): 410m.

As últimas quatro receberam os nomes originais em 1914, segundo GUIMARÃES (1994). A mesma fonte informa que o nome Bernardo Guimarães surgiu em 18/12/1925, por força da lei nº 459, que alterava para tal nome um trecho da rua 13 de Maio [10].

Reparar que a extensão da Avenida Josué de Queiroz era curta em comparação ao tamanho atual, 2.600 m da travessia dos trilhos ferroviários ao Trevo do Elói, prova que o lado sul estava praticamente despovoado, pelo que se justifica a afirmação de HENRIQUES (2003): “O pequeno bairro de Matosinhos naquela época desenvolveu-se muito timidamente para o lado da hoje Vila Santa Terezinha, que na época chamava-se ‘Vila Nova’. O nome Vila Nova durou até a inauguração da Igreja de Santa Terezinha”. Ora, tal construção religiosa foi benta em 1945.

No ano seguinte, informa GUIMARÃES (1994), nas suas proximidades, são nomeadas duas novas ruas: a Expedicionário Francisco Batista Rios e a Antônio Coelho da Silveira. Ainda conservam estes nomes.

      Não obstante esse aspecto, o crescimento urbano e também o comercial nessa época foram relativamente lentos. Em 1931, apenas dois profissionais liberais ali residiam: Dr. Paulo de Resende Campos e Dr. Silvano Carneiro, ambos dentistas, já sem exercer a profissão, moradores da Praça de Chagas Dória [11]. Em 1935 o único ponto comercial citado no bairro era a casa de secos e molhados do varejista José Sbampato [12]. Em 1948 só é citado o dr.Paulo Campos como profissional liberal e no campo industrial, a Fiação e Tecelagem Matosinhos s./a. e a Mineração Apollo s./a., que explorava estanho, ambas com escritório na Praça Chagas Dória [13].

Em 1959 algumas ruas do grande bairro são calçadas [14].

            No princípio da década seguinte, informam CRISTÓFORO & PALHARES (1941), por intermédio de Tancredo Neves, foi construído em Matosinhos, dois conjuntos residenciais do IAPI, um maior, próximo à Rua Amaral Gurgel e outro com 75 moradias, na Praça Pedro Paulo.

No fim dos anos 70, o prefeito Otávio Neves promoveu calçamentos no Jardim Paulo Campos, ajardinamento da praça de Matosinhos, instalou quebra-molas na avenida Josué de Queiroz e meio-fio na praça Santa Teresinha [15].

          O Prefeito Rômulo Viegas fez melhorias na praça de Santa Terezinha [16]. A seguir caiu em longo abandono. No ano 2000 as obras foram retomadas, mas impasses políticos logo a paralisaram, gerando revolta nos moradores [17]. Só em 2002 foi reurbanizada, após longas polêmicas e aproveitamento político da situação, muito comentado no boca-a-boca. Diante dessa realidade histórica absurda, parece até irônica a placa ali afixada, quando da solenidade de inauguração da praça, cujo texto é o seguinte: “O sonho de 35 anos virou realidade graças a todos vocês eleitores que acreditaram em nós com seus votos. Obrigado.” 

Tal praça conta com um coreto, play-ground e fonte. Além das festas do orago desta igreja (outubro), a Praça de Santa Teresinha durante muitos anos se destacou pelas animadas festas de queima de Judas, aí realizadas na Páscoa.

        Resta esclarecer que o Matosinhos tradicional está compreendido nos limites extremos da Ponte Presidente João Pinheiro e a Rua Farmacêutico Guillarducci. A área mais ao sul é relativamente recente e foi ganhando outros nomes, embora no todo se considere como Matosinhos: Vila Santa Terezinha, Bom Pastor, Pio XII. Faz também parte o Jardim Paulo Campos, Vila Nossa Senhora de Fátima, Vila Santo Antônio, Santa Clara. Em 1989 a câmara de vereadores considerou a cidade com apenas oito bairros: Centro, Jardim Central, Tijuco, Bonfim, Senhor dos Montes, Fábricas, Colônia e Matosinhos. Os limites deste último seriam [18]:

"Foz do Córrego do Porto (hoje seco) no Rio das Mortes; Rio das Mortes (inclusive ilha próxima à Ponte do Porto) até a foz do Córrego do André; Córrego do André (passando pela ponte na BR-265) até a foz do Córrego Morro Redondo (a uma distância de 500 metros da Rodovia BR-265) à margem da BR-265, a uma distância de 500 metros até o Ribeirão da Água Limpa; Ribeirão da Água Limpa até sua foz no Córrego do Lenheiro; Córrego do Lenheiro até sua foz no Rio das Mortes; Rio das Mortes até a foz do Córrego do Porto (hoje seco), onde finaliza."

Esta seria a área que se convencionou chamar mais tarde de “O Grande Matosinhos”, compreendendo as divisões supracitadas.

Notas e Créditos: 

* Texto: Ulisses Passarelli




[1] - Existe um exemplar deste relatório na Biblioteca Municipal Baptista Caetano d'Almeida, de São João del-Rei.
[2] - S. João d’El-Rey, n. 14, 22/04/1899.
[3] - O Combate, n. 83, 27/07/1901.
[4] - O Combate, n. 81, 20/07/1901.
[5] - O Combate, n. 82, 24/07/1901.
[6] - O Repórter, n. 21, 04/06/1905.
[7] - O Repórter, n. 79, 13/071901.
[8] - Cf.: SINOPSE ESTATÍSTICA DE SÃO JOÃO DEL-REI. São João del-Rei: Casa Assis, 1931. edição Comemorativa do Cinqüentenário da EFOM.
[9] - Matadouro novo: o anterior ficava no final do Matola e a rua fronteira ganhou por isto o epíteto “Rua do Matadouro Velho” (Rua Padre Sacramento, desde 1923). A Rua do Matadouro Novo surgiu após a retirada dos trilhos e retificação para o itinerário atual da ferrovia, defronte à igreja.
[10] - Sobre a mudança de topônimos que ora atingiu graus absurdos, foi assim comentada: “De tempos em tempos, os brasileiros, e em especial nós são-joanenses, somos surpreendidos com mudanças de nomes de ruas da nossa cidade, do nosso bairro, da nossa rua. (...) A rua é uma extensão da casa. Mudar o nome da rua sem uma razão muito convincente é ferir a individualidade do cidadão”. FERREIRA, José Alberto. Nomes de rua: referência histórica e sentimental. Gazeta de São João del-Rei, n. 205, 13/07/2002.
[11] - SINOPSE  ESTATÍSTICA DE SÃO JOÃO D’EL-REY. São João del-Rei: Casa Assis, 1931. edição Comemorativa do Centenário da EFOM.
[12] - INDICADOR URBANO DE SÃO JOÃO D’EL-REY, ESTADO DE MINAS. São João del-Rei: Castello, 1935.
[13] - SINOPSE ESTATÍSTICA DO MUNICÍPIO DE SÃO JOÃO DEL-REI. Belo Horizonte: Departamento Estadual de Estatística (IBGE), 1948.
[14] - O Correio, n. 2.960, 31/05/1959.
[15] - Tribuna Sanjoanense, n. 205, 14/02/1978.
[16] - Gazeta de Matozinhos, n. 2, mar./1993.
[17] - Gazeta de São João del-Rei, n. 92, 29/04/2000.
[18] - Jornal de S. João del Rey, n. 138, 09/09/1989. 

2 comentários:

  1. Olá Ulisses mais uma vez parabéns. Na referência de fontes consta "Gazeta de Matosinhos" (16). Não me lembro dessa publicação. Você tem mais dados a respeito da Gazeta de Matosinhos? Abraços. José Claudio Henriques.

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    1. Camarada: pesquisei muito nos jornais. Lembro desse vagamente e ora não recordo de detalhes para te dar. Vou ver acho algo a respeito e te repasso. Grato pela visita e elogios. Você é sempre muito bem vindo. Considero-o um notável pesquisador da histório e tradições desse grande bairro. Abraços, UP.

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