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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




sábado, 3 de maio de 2014

Remédios de Macaia

Fruta do lobo ou lobeira.
O povo brasileiro, sendo uma mescla cultural de várias etnias, delas herdou muitas receitas de fórmulas e técnicas adotadas de forma empírica para tratar a saúde. Algumas se valem propriamente das substâncias químicas de fonte animal e vegetal, extraídas por meio de esfregaços, decocção, infusão, trituração, emplastros, unguentos, mastigação da folha para extrair o sumo e garrafadas; outras, como as simpatias, se apegam a receitas atreladas a crenças de natureza espiritual, que confiam num certo poder de cura. 

Muitas vezes esse saber da "medicina popular" tem sido menosprezado pela ciência, mas o povo se vale dele o tempo todo, por vezes em paralelo ao tratamento alopático, colocando mais fé na ciência do mato. Há mesmo quem busque os chás, as raízes a vida toda, evitando ao máximo o medicamento industrializado. 

Existem riscos nesse uso por não se saber com exatidão as dosagens, efeitos colaterais, interações medicamentosas, farmacocinética, farmacodinâmica, presença de alcaloides, grau de toxicidade. No mais o nome popular das espécies varia com as regiões e a perfeita identificação das espécies é tarefa de especialista. Assim sendo não recomendo o uso, mas registro o saber popular que o envolve. 

Seria de alto interesse para o país a pesquisa séria dessa homeopatia popular. Muitas vezes foram revelados importantes princípios ativos para o desenvolvimento industrial de medicamentos. Mas certamente existe na nossa vastidão territorial, com tantos ecossistemas, um grande número de produtos naturais a se descobrir. Talvez sejam o caminho de cura para muitas doenças que hoje desafiam a humanidade. Não é à toa que diversas vezes ouvimos rumores de estrangeiros de olho em nossas plantas medicinais. Mais tarde pagaremos caro por uma tecnologia que deixamos de pesquisar.

Apresenta-se a seguir uma pequena coleta gentilmente informada pelo sr. José Campos, radicado em São João del-Rei, natural de Macaia, distrito de Bom Sucesso, a quem agradeço e ofereço.

Maracujá silvestre

- Gripe: beber o caldo de um limão espremido numa dose de pinga (cachaça).
- Gripe e tosse: cozinhar três folhas da fruta cítrica lima-doce, com uma pitada de sal. Tomar morno. 
- Pneumonia: usar sumo do assa-peixe branco com uma pitada de sal, bebendo-o.
- Ferida, erisipela: ferver urina de criança abaixo de 10 anos com folhas de fumo (tabaco) e banhar a parte afetada.
- Diabetes: esfregaço em água de folhas de isopo (mané-turé), para tomar de manhã bem cedo.
- Bronquite: um porção pequena de gordura de capivara dissolvida num copo de café bem quente. 
- Otite: aplicação de sementes de laranja da terra masseradas, contidas dentro de um pano fino. Para tirar dor de ouvido, deixa-se pressionado sobre a região da entrada da tuba auditiva.
- Bócio: pega-se uma fruta do lobo (Solanum lycocarpum) madura e põe-se na brasa. Depois de um tempo, logo que esfriar um pouco, espremer o sumo dentro da boca, para curar a "papeira". 
- Rins: para limpeza dos rins usa-se tomar frio o chá de folhas da panacéa. 
- Amigdalite, faringite: ferver folhas de amora-branca (rosaceae) e quando estiver morno, gargarejar para melhorar dor de garganta.
- Estrepada: para extrair um pequeno pedaço de pau ("estrepe") acidentalmente fincado dos pés (que se não for tirado a ferida não fecha), aplicar em cima da área afeta um pão velho embebido em leite, afixado por um envoltório de pano. Isto ajuda a puxar o corpo estranho, para que aflore na pele e possa assim ser retirado. 
- Rendido: para curar quebradura (hérnia) do indivíduo "rendido", a simpatia é na sexta-feira, levar o sujeito ao mato onde exista um pé de maracujá-silvestre (Passiflora, a flor da Paixão) ou de cipó de São João (Pyrostegia venusta). Estira-se uma rama sem cortá-la e tira-se uma "média" da pessoa, ou seja, a medida da circunferência da pessoa ao nível mais largo do corpo (ombros ou barriga), formando uma circunferência correspondente no cipó. No local que a ponta do cipó encontra com a haste, formando o aro, descasca-se com canivete, sem cortar, e se encosta e envolve com uma fita bem ajustada a ponta do cipó com a haste descascada, consolidando o aro. O doente deve então ser passada por completo três vezes dentro dessa circunferência, da cabeça para os pés, com a ajuda de uma pessoa. Repete-se em mais duas sextas consecutivas usando-se a mesma planta. A medida que a ponta se fundir à parte descascada, formando com ela um todo em nova casca, a hérnia também vai fechando.

                              
Da esquerda para a direita: amora-branca, panacéia e isopo. 


Para saber mais leia também: 


* Texto: Ulisses Passarelli
** Fotos: do informante, Iago C.S. Passarelli (19/04/2014) e dos vegetais, Ulisses Passarelli (01 e 02/05/2014)

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