A cruz é o maior símbolo do cristianismo. Historicamente a catequese dos conquistados se construiu sob sua égide. Não é de admirar que os reflexos devocionais impregnassem a alma popular. Assim é que o povo fiel ao passar diante de um cruzeiro o saúda persignando-se, pedindo licença, cantando, rezando. Em Santa Cruz de Minas (*), por exemplo, ouvi este apelo sincero:
"Deus te salve, Santa Cruz,
oi, livras e fugidas,
valei-me, Nossa Senhora,
a Santa Mãe de Cristo."
O sentido da saudação é que a cruz como símbolo cristão, livre o devoto dos males, afugentando as forças contrárias. Os capitães de congados sempre saúdam um cruzeiro ao passar com sua guarda em forma, diante deles, valendo uma parada:
"Deus te salve, Santa Cruz,
neste campo tão sereno,
onde mora Jesus Cristo,
Bom Jesus de Nazareno."
Em
São João del-Rei, assim cantava o Capitão José Camilo, enquanto Luís Santana se saía com a seguinte variante:
"Deus te salve, Cruz Santa,
ai, neste campo sereno!
onde mora Jesus Cristo,
filho de Deus Verdadeiro!"
Porém a quadra mais bela na composição poética e de maior expressividade religiosa ouvimos de "Zé Carreiro", conhecido capitão de congado de Coronel Xavier Chaves:
"Deus te salve, Santa Cruz,
ai, com seus braços abertos!
Perdoai os nossos pecados,
aqueles mais encobertos..."
Maio é o mês da Santa Cruz. Outrora o dia 03 era muito festejado. O povo enfeitava as pequenas cruzes de fachada e os grandes cruzeiros. Nestes, reunida a comunidade, rezavam o terço, cantavam hinos e benditos e a seguir _ quem sabe? _ acontecia uma festa singela, com comes e bebes, fogueira (a primeira do ano), cantorias ao som da viola, danças rurais (catira, cana-verde, rodinha, quimbete, caxambu). A Festa da Santa Cruz prenunciava o ciclo de festejos juninos, ou mesmo o abria.
Com o passar dos anos este festejo esmaeceu e quase não se pratica mais. Mas ainda vemos daqui e dali seus vestígios ou pequenas festas, sem o brilho de antanho, mas ainda fiéis ao costume, sobretudo no carinhoso gesto de adornar as cruzes com flores e papel picado, em cordões de bandeirinhas e rabiolas. Em Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, Terra de Nhá Chica, distrito de São João del-Rei, estes enfeites são especialmente notórios e o povo mantém as rezas de maio, não apenas no dia 03. Confira nas fotos seguintes alguns enfeites de cruzes.
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Cruz de Fachada, fixada numa porta de residência de São João del-Rei, 04/05/2014. |
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Cruzeiro enfeitado, Atalho, Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, 20/05/2014. |
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Cruzeiro enfeitado, praça central de Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, 20/05/2014. |
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Cruzeiro enfeitado,Trabanda (**) - Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, 20/05/2014. |
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Cruz de Beira de Caminho, Estrada do Cascalho, Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, 20/05/2014. |
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Cruz de Beira de Caminho, Estrada das Águas Santas, Tiradentes, 18/05/2014. |
Notas e Créditos
* Informante: Elvira Andrade de Salles, 1998.
** Trabanda: comunidade no distrito do Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno, zona rural de São João del-Rei, localizada na outra banda do Córrego das Pombas, ou seja, na margem oposta à vila que sedia o distrito, daí a corruptela popular: "Trabanda", ou seja, "do lado de lá..."
***Texto e fotos: Ulisses Passarelli
Boa noite Ulisses. Gostei muito do seu blog. Pesquiso sobre Capelas da Santa Cruz, Cruzeiros e Cruzes da beira da estrada. Sempre bom ouvir relatos de Minas ! Abraços.
ResponderExcluirObrigado por visitar nosso blog e seja bem vinda. Acompanhe as novas postagens. Para saber mais sobre este assunto leia também nesta página eletrônica a postagem CRUZES E CRUZEIROS, de 25/03/2015.
ExcluirOI, ULISSES ! BOA NOITE, TUDO BEM? FELIZ PÁSCOA EM CRISTO! ESTOU TENTANDO FALAR COM VOCÊ SOBRE A SERRA DO LENHEIRO....PODE ME RETORNAR O ZAP, POR FAVOR ? UM ABRAÇO! MARIZABEL
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