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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




terça-feira, 9 de outubro de 2012

Um tradicional grupo de pastorinhas das Vertentes

PASTORINHAS EM SÃO TIAGO [1]

         Sob o nome de pastorinhas é conhecido um grupo folclórico do Sudeste do país, constituído de crianças, no geral meninas, trajadas à pastora. No período natalino visitam as residências e igrejas, cantando na Missa do Galo ou noutra celebração. Saúdam os presépios com cantos, danças e toques instrumentais.

É uma tradição de bases históricas ibéricas. Através de variados personagens e por vezes de cenas dramáticas, anunciam a natividade de Jesus e episódios correlatos à boa nova, tais como a visita dos magos e dos pastores. Além disso, podem recolher ofertas. É uma modalidade reiseira.

Existe Brasil afora diferentes versões congêneres dessa manifestação. Rarefeita em toda sua área geográfica de ocorrência, encontra em Minas Gerais algum refúgio nas comunidades tradicionais. No centro-sul do estado, microrregião Campo das Vertentes, foi costume muito arraigado e ora em ocaso. Persistem três grupos ativos, sendo um em São João del-Rei, outro em Tiradentes e um terceiro em São Tiago. Deste último se ocupa este texto, segundo observações realizadas em 2001.

            Desconheço a data precisa de sua introdução nesta cidade, o nome do primeiro responsável ou de onde seria o seu modelo. Já existia na década de 1940, organizadas pela sra. Percília Maria da Conceição. Mais tarde assumiu o grupo a sra. Antônia Geralda São Tiago. Desativou-se em 1981. Reativou-se vinte anos mais tarde, com notável apresentação na Festa do Divino, de São João del-Rei.

            O grupo conta com 16 a 20 crianças pré-adolescentes. As Pastoras trajam vestido branco, com avental vermelho, chapéu de palha com fita vermelha ao redor da copa. Carregam xique-xiques feitos de tampinhas de garrafas amassadas, trespassadas por um arame e presas a uma haste de madeira. São os únicos instrumentos. Há também os personagens: São José, Nossa Senhora (que carrega a imagem do Menino Jesus, oferecendo-a para o beijo devoto) e os Três Reis Magos, todos com trajes caracterizadores.

            Não é grupo peditório, mas levam uma bandeja sobre a qual se pode depositar o donativo voluntário.

            O primeiro canto que entoam é o seguinte:

Natal! Natal!
Os anjos cantaram
Glória in excelsis
Nasceu Jesus!
glória a Belém,
ao peregrino,
Nasceu a vida,
hinos entoaram
Filho do Eterno,
nasceu a luz.
vamos também.
Jesus Menino.

            A primeira quadra é muito tradicional. Bisada, funciona como refrão.

A seguir entoam qualquer outra peça do repertório, que inclui também a conhecida canção natalina “Noite Feliz”, de Franz Gruber. Não há ordem fixa para a execução. Outro canto:

Louvemos ao Filho
Louvemos ao Filho
Louvemos ao Filho
da Virgem Maria;
que veio da altura;
que é feito menino;
que glória na Terra,
tomando os aspectos,
terá sobre a Terra,
no céu alegria!
da humana figura!
sublime destino!

            Também aqui a primeira quadra é o refrão.

Vinde cristãos,
Foi numa noite venturosa
Juntemos aos pastores,
vinde à porfia,
em que nasceu o Salvador
vamos com eles a Belém
cantar um hino de louvor
e os anjos com voz harmoniosa,
e lá nós cantemos
hino de paz e alegria.
deram no céu este clamor.
ao Salvador que hoje vem.

            O refrão lamentoso é em latim: “Glória! / In excelsis Deo” (Glória a Deus nas alturas).

Ainda em latim, cantam um tradicional hino natalino. A tradução é uma gentileza do professor Antônio Gaio Sobrinho:

Adeste fideles
(Aproximai-vos fiéis
Natum videte
(Vêde nascido
laeti triunfantes,
alegres, triunfantes,
regem angelorum!
o Rei dos Anjos!
venite, venite,
vinde, vinde,
Venite, adoremus! - bis
Vinde, adoremos!
in Bethlém!
a Belém!)
Venite adoremus Dominum
Vinde adoremos o Senhor!)

            A coreografia das partes é quase inexistente, limitando-se o pé de dança ao balançar ritmado do corpo na cadência da toada musical.

            O grupo mescla características eminentemente folclóricas com outras de origem erudita ou ao menos semi-culta, como o hino católico cantado em latim. Sua organizadora é uma devota afeita aos rituais da Igreja, sendo muito ligada à vida musical daquela cidade e a outras manifestações folclóricas locais.

            Chama especialmente a atenção no conjunto sua composição estritamente feminina, inclusive nos papéis masculino, a saber, São José e os Reis Magos, representados por meninas travestidas de homens, segundo observação efetuada em 2001. Note-se que alguns grupos deste folguedo abrem exceção à participação de meninos na execução dos papéis masculinos. Ë de se observar também que certos versos são tradicionais no repertório de outras pastorinhas e folias de Reis.

            Anoto por fim, que se confrontado com outros modelos de Pastorinhas é um grupo relativamente simples na sua estruturação, com poucos personagens, conservando além das Pastoras, apenas aqueles outros de cunho bíblico. Sua singeleza não lhe diminui o valor, senão mesmo o reforça.

            A vida ativa deste grupo se deve hoje, sem dúvida alguma, aos esforços abnegados de sua fiel organizadora, que merece aplausos e o respeito de todos nós.

Pastorinhas, São Tiago / MG,1947. Foto de arquivo, que ilustrou a edição deste texto no jornal Cidadania (São Tiago, n.54, dez./2006 – jan./2007), uma gentileza do editor Ricardo Alessandro da Mata.


Pastorinhas,São Tiago / MG, 1981. Foto cedida para reprodução pela mestra do grupo, sra. Antônia Geralda, a quem dedico e manifesto gratidão. 
* Texto: Ulisses Passarelli


[1] - In: Cidadania, São Tiago, n.54, dez./2006 – jan./2007. 

2 comentários:

  1. Prezado Ulisses,

    Um humilde tributo de reconhecimento ao seu trabalho.

    http://diretodesaojoaodelrei.blogspot.com.br/2012/10/sao-joao-del-rei-alem-do-rei.html

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    1. É... além do rei tem muita coisa! E São João é o pólo cultural dessas vertentes do saber! Parabéns ao "Direto de São João del Rei" que enxergou a muito esta riqueza! Obrigado!!!

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