PASTORINHAS EM SÃO TIAGO [1]
Sob o nome de pastorinhas é conhecido um grupo folclórico do Sudeste do país, constituído de crianças, no geral meninas, trajadas à pastora. No período natalino visitam as residências e igrejas, cantando na Missa do Galo ou noutra celebração. Saúdam os presépios com cantos, danças e toques instrumentais.
É uma tradição de bases históricas
ibéricas. Através de variados personagens e por vezes de cenas dramáticas,
anunciam a natividade de Jesus e episódios correlatos à boa nova, tais como a
visita dos magos e dos pastores. Além disso, podem recolher ofertas. É uma
modalidade reiseira.
Existe Brasil afora diferentes versões
congêneres dessa manifestação. Rarefeita em toda sua área geográfica de ocorrência,
encontra em Minas Gerais algum refúgio nas comunidades tradicionais. No
centro-sul do estado, microrregião Campo das Vertentes, foi costume muito
arraigado e ora em ocaso. Persistem três grupos ativos, sendo um em São João
del-Rei, outro em Tiradentes e um terceiro em São Tiago. Deste último se ocupa
este texto, segundo observações realizadas em 2001.
Desconheço
a data precisa de sua introdução nesta cidade, o nome do primeiro responsável
ou de onde seria o seu modelo. Já existia na década de 1940, organizadas pela
sra. Percília Maria da Conceição. Mais tarde assumiu o grupo a sra. Antônia
Geralda São Tiago. Desativou-se em 1981. Reativou-se vinte anos mais tarde, com
notável apresentação na Festa do Divino, de São João del-Rei.
O grupo
conta com 16 a 20 crianças pré-adolescentes. As Pastoras trajam vestido branco, com avental vermelho, chapéu de
palha com fita vermelha ao redor da copa. Carregam xique-xiques feitos de
tampinhas de garrafas amassadas, trespassadas por um arame e presas a uma haste
de madeira. São os únicos instrumentos. Há também os personagens: São José, Nossa Senhora (que carrega a
imagem do Menino Jesus, oferecendo-a para o beijo devoto) e os Três Reis Magos, todos com trajes
caracterizadores.
Não é
grupo peditório, mas levam uma bandeja sobre a qual se pode depositar o
donativo voluntário.
O
primeiro canto que entoam é o seguinte:
Natal! Natal!
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Os anjos
cantaram
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Glória in
excelsis
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Nasceu Jesus!
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glória a
Belém,
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ao peregrino,
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Nasceu a
vida,
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hinos
entoaram
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Filho do
Eterno,
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nasceu a luz.
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vamos também.
|
Jesus Menino.
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A
primeira quadra é muito tradicional. Bisada, funciona como refrão.
A seguir entoam qualquer outra peça do
repertório, que inclui também a conhecida canção natalina “Noite Feliz”, de
Franz Gruber. Não há ordem fixa para a execução. Outro canto:
Louvemos ao
Filho
|
Louvemos ao
Filho
|
Louvemos ao
Filho
|
da Virgem
Maria;
|
que veio da
altura;
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que é feito
menino;
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que glória na
Terra,
|
tomando os
aspectos,
|
terá sobre a
Terra,
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no céu
alegria!
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da humana
figura!
|
sublime
destino!
|
Também
aqui a primeira quadra é o refrão.
Vinde
cristãos,
|
Foi numa
noite venturosa
|
Juntemos aos
pastores,
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vinde à
porfia,
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em que nasceu
o Salvador
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vamos com
eles a Belém
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cantar um
hino de louvor
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e os anjos
com voz harmoniosa,
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e lá nós
cantemos
|
hino de paz e
alegria.
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deram no céu
este clamor.
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ao Salvador
que hoje vem.
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O refrão
lamentoso é em latim: “Glória! / In excelsis Deo” (Glória a Deus nas alturas).
Ainda em latim, cantam um tradicional
hino natalino. A tradução é uma gentileza do professor Antônio Gaio Sobrinho:
Adeste
fideles
|
(Aproximai-vos fiéis
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Natum videte
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(Vêde nascido
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laeti
triunfantes,
|
alegres, triunfantes,
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regem
angelorum!
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o Rei dos Anjos!
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venite,
venite,
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vinde, vinde,
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Venite,
adoremus! - bis
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Vinde, adoremos!
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in Bethlém!
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a Belém!)
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Venite
adoremus Dominum
|
Vinde adoremos o Senhor!)
|
A
coreografia das partes é quase inexistente, limitando-se o pé de dança ao
balançar ritmado do corpo na cadência da toada musical.
O grupo
mescla características eminentemente folclóricas com outras de origem erudita
ou ao menos semi-culta, como o hino católico cantado em latim. Sua organizadora
é uma devota afeita aos rituais da Igreja, sendo muito ligada à vida musical
daquela cidade e a outras manifestações folclóricas locais.
Chama
especialmente a atenção no conjunto sua composição estritamente feminina,
inclusive nos papéis masculino, a saber, São José e os Reis Magos,
representados por meninas travestidas de homens, segundo observação efetuada em
2001. Note-se que alguns grupos deste folguedo abrem exceção à participação de
meninos na execução dos papéis masculinos. Ë de se observar também que certos
versos são tradicionais no repertório de outras pastorinhas e folias de Reis.
Anoto por
fim, que se confrontado com outros modelos de Pastorinhas é um grupo
relativamente simples na sua estruturação, com poucos personagens, conservando
além das Pastoras, apenas aqueles outros de cunho bíblico. Sua singeleza não
lhe diminui o valor, senão mesmo o reforça.
A vida
ativa deste grupo se deve hoje, sem dúvida alguma, aos esforços abnegados de
sua fiel organizadora, que merece aplausos e o respeito de todos nós.
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Pastorinhas, São Tiago / MG,1947. Foto de arquivo, que ilustrou a edição deste texto no jornal Cidadania (São Tiago, n.54, dez./2006 – jan./2007), uma gentileza do editor Ricardo Alessandro da Mata. |
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Pastorinhas,São Tiago / MG, 1981. Foto cedida para reprodução pela mestra do grupo, sra. Antônia Geralda, a quem dedico e manifesto gratidão. |
* Texto: Ulisses Passarelli
Prezado Ulisses,
ResponderExcluirUm humilde tributo de reconhecimento ao seu trabalho.
http://diretodesaojoaodelrei.blogspot.com.br/2012/10/sao-joao-del-rei-alem-do-rei.html
É... além do rei tem muita coisa! E São João é o pólo cultural dessas vertentes do saber! Parabéns ao "Direto de São João del Rei" que enxergou a muito esta riqueza! Obrigado!!!
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