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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




sábado, 27 de outubro de 2012

Notas folclóricas


Breves notas sobre o folclore de São João del-Rei [1]


        A diversidade cultural brasileira prende-se à nossa grande miscigenação étnica e aos processos de nossa formação histórica, econômica e social. A complexidade é gigantesca e no Brasil continental todo este legado teve oportunidade de se miscigenar em sangue e saber, tendo a vastidão da natureza como meio físico inspirador para sua evolução e troca de experiências. Na filtragem secular dos saberes a cultura popular consolidou-se com pujança. Não é portanto de se admirar que o folclore florescesse com tamanho viço como aconteceu no Brasil.

Em Minas Gerais também é este o panorama da cultura popular. Nossas Folias (de Reis, de São Sebastião, do Divino, etc.) e Congados (Congos, Moçambiques, Catupés, Marujos, Caboclinhos, Candombes, Vilões)são oriundos deste caldeamento étnico-cultural e povoam todos os rincões mineiros.

       A tricentenária São João del-Rei é reconhecida pela amplitude de seu patrimônio cultural. Não foi por acaso que recebeu em 2007 o título de Capital Brasileira da Cultura. Na música é um expoente, no toque dos sinos idem, bem como nas tradições religiosas praticadas em suas históricas igrejas, com destaque para a linguagem dos sinos, as novenas, celebrações e cortejos processionais. O patrimônio ferroviário aqui presente nos enaltece, não obstante o declínio das ferrovias brasileiras.  Nesta “Cidade dos Sinos”, emoldurada pelo casario colonial, também a cultura popular é muito bem representada.

       Todos os ramos do folclore podem ser aqui bem observados, tais como culinária regional, lúdica infantil, literatura popular, danças folclóricas, crenças e superstições, artes e técnicas, artesanato, festejos populares e rituais da religiosidade popular.

       A Festa do Divino que aqui tem o status de jubileu perpétuo, graças a um breve pontifício do Papa Pio VI, datado de 1786, possui um passado glorioso de intensa atividade religiosa-cultural, que declinou nos meados do século XX para ser reativada em 1998. Desde então tem sido um momento muito especial de evangelização e um dos mais importantes  eventos para o folclore são-joanense nos últimos dez anos, quando se congregam no santuário diversos grupos folclóricos, entre congados, folias, pastorinhas e danças-das-fitas, além de outras atrações, que se unem com o objetivo de festejar o Divino.

       Seu colorido e musicalidade são sem dúvidas um atrativo turístico. Esta festa extrapola bastante os limites do Bairro de Matosinhos, que a sedia, para abraçar a cidade toda e na verdade ganha um ar regional, pelo imenso poder congregador.  

Em especial sobre as folias e os congados, pode-se afirmar que são manifestações profundamente arraigadas à religiosidade popular e que contam com um histórico de ocorrência antiga nesta região mineira e por conseguinte estão muito enraizadas.

Acontecem sobretudo em dois momentos: as folias, como peditórias e itinerantes, visitam as casas cantando louvores ao Espírito Santo da Páscoa a Pentecostes (folia do Divino) ou ao nascimento de Jesus e episódios correlatos do Natal ao Dia de Reis (folia de Reis) ou ainda ao martírio de São Sebastião, de 7 a 20 de janeiro, portanto em seqüência (folia de São Sebastião). Os congados em marcha pelas ruas e visitando igrejas, surgem na Festa do Divino (maio-junho) e nas do Rosário (agosto-novembro). Esse é o tempo. Fora este, só em esporádicas apresentações dispersas ao longo do ano. Mas quem de fato quiser conhecer há de assisti-los em seu ambiente, à sua época própria. Aí são espontâneos, demonstram a sua verdade.

No quadro atual estas manifestações folclóricas enfrentam severos problemas frente às acentuadas questões trazidas pela globalização, as fortíssimas mudanças sociais carreando novos valores, outras concepções de vida e de vivência com o elemento religioso. Para sua salvaguarda, além de se suprir as necessidades materiais dos grupos folclóricos, há uma questão mais profunda que chama todos à responsabilidade: o respeito humano. Felizmente nossos folieiros e congadeiros estão aprendendo a se auto-valorizar como artistas populares. Os dançantes de fato dão tudo de si para a conservação de seus grupos. São pessoas humildes, que muitas vezes gastam o que não podem para mantê-los. Felizmente contudo a visão destas necessidades vem se ampliando e o apoio ora dado é maior que noutros tempos.

Os participantes desses grupos folclóricos são heróis da cultura popular, que por diversas gerações vem mantendo estas tradições.

Felizmente na cidade de São João del-Rei, a Festa do Divino tem sido um ícone da valorização destas manifestações e as folias prosseguem, com sete grupos na zona urbana e cinco na rural, plenamente ativas, além de cinco congados na zona urbana (um dos quais surgidos neste ano) e três na rural (dois centenários e um de 2007), prova de que na Capital da Cultura o folclore viceja com esplendor.

Cartuchos de amêndoa da Festa de São Miguel Arcanjo.
São Miguel do Cajuru (São João del-Rei / MG).

Notas e Crédito

* Texto e fotografia (1999): Ulisses Passarelli
** Obs.: esta fotografia não faz parte da publicação original deste artigo.


[1] - In: Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, SEC, dez. / 2007,  p.16.

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