Nas comemorações quaresmais em São João del-Rei, acontecem as interessantes procissões do depósito, que são duas, uma dedicada a Nossa Senhora das Dores e a outra ao Senhor dos Passos.
A das Dores acontece na quarta sexta-feira da quaresma, após a missa das 19 horas na Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar. O andor da santa, cheio de ervas aromáticas, é encoberto por um quadro de varas que sustenta um pano roxo, de brocado agalonado, chamado velário. Nessa altura da quaresma todos os altares estão tapados por cortinados, impedido a visão das imagens. O assoalho está cheio de folhas de rosmaninho, que conferem um perfume especial ao ambiente religioso.
Após a celebração o sacerdote incensa e abençoa o andor e então sua cortina é fechada. Com a imagem toda oculta é que a procissão sai, anunciada pelos dobres do sino. Membros das irmandades fazem alas ao cortejo sagrado com laternas acesas; a centenária Banda Theodoro de Faria executa de maneira acurada uma plangente marcha fúnebre. O povo já toma lugar nas filas, rumo à Igreja do Carmo, onde ficará a Senhora das Dores.
Um senhor passa com um saquinho de pipocas; uma criança se delicia com as amêndoas de um cartucho. Dos casarões, em velhas sacadas, senhoras se persignam ante a passagem do andor velado. Não dá para ver a santa, mas ela está ali, dando graças.
A procissão é curta, mas não dispensa pompa e essência sagrada. A imagem é "depositada" noutra igreja, a do Carmo, como dissemos, e lá ficará temporariamente.
No outro dia, à mesma hora, é a vez da Procissão do Depósito dos Passos (*), quando, no mesmo padrão, a imagem do Senhor carregando pesada cruz preta de madeira, é levada a partir do Pilar para a Igreja de São Francisco de Assis, onde também ficará "depositada" por um prazo. Na vizinha cidade de Tiradentes também acontece este cortejo sagrado.
Domingo cedo, 8 horas no Carmo, 9 h e 30 min no São Francisco, ocorrem as respectivas rasouras ao redor destes templos coloniais, com as imagens depositadas, mas sem o velário. Essas rasouras já foram alvo de textos neste blog, lincados ao fim desta postagem.
Mesmo antes e depois das rasouras, as imagens ficam expostas à veneração dos fiéis e recebem um grande número de visitas carinhosas. O ritual se completa à noite, com a concorrida Procissão do Encontro, quando cada imagem saindo das igrejas citadas, acompanhadas de irmandades e banda, se encontram solenemente no Largo das Mercês, local onde acontece um eloquente sermão eclesiástico. Então, vão juntas as imagens, Mãe e Filho, em contemplativa marcha para a Matriz do Pilar, que enfim as recolhe para as demais cerimônias das comemorações dos Passos.
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Velário ainda aberto deixando ver parcialmente a imagem de Nossa Senhora das Dores. |
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Incensando... |
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O andor velado deixa o adro da Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar. |
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Cenário da Rua Direita (atual Getúlio Vargas) durante a passagem
da Procissão do Depósito de Nossa Senhora das Dores.
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Senhor dos Passos sob o velário na Igreja de São Francisco de Assis. |
Leia também:
RASOURA DOS PASSOS
RASOURA DAS DORES
Notas e Créditos
* Obs.: notícias jornalísticas de 112 anos atrás narraram: "realizou-se hontem com extraordinária concurrencia o Depósito dos Passos, da Igreja Matriz para São Francisco, onde fez ouvir no sermão do Pretório, o eloquente orador sacro padre João Sacramento, que produziu bella oração. Amanhã realizar-se-á a procissão do Encontro, pregando o reverendo monsenhor Felisberto Edmundo da Silva e do calvário o revdo. Padre Julio José Ferreira." (Fonte: jornal O Combate, n.160, 22/03/1902, São João del-Rei/MG, exemplar da Biblioteca Municipal Baptista Caetano d'Almeida, acervo digital).
** Texto: Ulisses Passarelli
***Fotos: Iago C.S. Passarelli (Dores) e Ulisses Passarelli (Passos)
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