Aproxima-se mais uma festa em honra a Nossa Senhora do Rosário no município de São João del-Rei, deste vez no distrito de São Gonçalo do Amarante, cujo tríduo preparatório principia hoje às 19 horas na imponente e bicentenária igreja de seu padroeiro.
A mais dias houve a visita da imagem da santa festejada às residências dos congadeiros, nas quais vias de regra se reúne a família em prece do terço. Houve também um terço comunitário celebrado na Gruta do Divino, naquela vila.
Como já acontece a muitos anos o dia maior será no segundo domingo de outubro, data já fixada em tradição, este ano caindo no dia 09. Madrugadinha, 05 h, os caixeiros percorrem as ruas, rodeiam o mastro, o cruzeiro, vão à igreja, tocando céleres um ritmo muito peculiar, específico da alvorada, que tem o pitoresco nome de "
vamos'imbora, Vitalina!". Só neste momento podemos ouvi-lo. Embora este seja o horário que consta na programação, mesmo antes se reúnem, como aconteceu o ano passado, iniciando pouco depois das 4 horas da madrugada. O pacato lugar é acordado também pelo repicar do sino do campanário e por girândolas de fogos de artifício.
Por fim se recolhem para um breve descanso e o café da manhã. Ao visitante esta é uma hora ideal para uma visita ao Cruzeiro da Pedra Ramaiuda, um mirante próximo, cerca de um quilômetro, na saída para extinta Estação de Mestre Ventura (da EFOM - Estrada de Ferro Oeste de Minas). O cruzeiro foi erguido com recursos arrecadados pela folia de Reis do distrito e situa-se em meio a uma bela paisagem aberta, junto a uma pedreira em cujos interstícios medrou uma árvore de óleo-vermelho (pau de óleo). A altitude possibilita uma visão ampla do horizonte, avistando-se as serranias em derredor. Por aproximação pode-se assim dizer: adiante, se enxerga a Serra de Santa Rita (além do Rio das Mortes vê-se inclusive a cidade de Ritápolis); a do Lenheiro, pela direita e na retaguarda; a do Caxambu, pela esquerda. O nascer do dia gera aí um cenário transcendental, em natureza generosa. O local é usado para práticas religiosas pela comunidade, incluindo a cerimônia da via-sacra.
Entre 8:30 e 9 horas o congado se reúne na Travessa Cava Funda. É a rua paralela ao largo, abaixo. O antigo congo se prepara para sair. O apito põe ordem e a cantoria irrompe abençoando o momento da partida:
"Na hora de Deus, começo,
Pai, Filho, Espírito Santo!
Deixa-me benzer primeiro
pra livrar de algum quebranto..."
O verso traduz a crença popular e firma o início da marcha pelas ruas. A primeira visita é à igreja. Depois ao mastro e ao cruzeiro. A bandeira do Rosário segue na dianteira, abrindo alas. O nome formal da guarda é "Congo-vilão Nossa Senhora do Rosário", como consta em sua bandeira e no entendimento dos dançantes é um "Cacique", que acreditam ser um congado muito antigo, de modelo ancestral. A despeito dos epítetos, esta guarda é em sua totalidade das características um congo autêntico e nada possui de elemento que em si remetam aos congados de modelo vilão ou aos de caboclos (cacique). O Capitão é o experiente Lourival Amâncio de Paula, ícone e baluarte da cultura popular local.
Neste ínterim sobe à praça o outro congado do lugar, sob a bandeira de Nossa Senhora Aparecida, que carinhosamente é conhecido por "Congado das Mulheres", em contrapartida ao grupo mais antigo, eminentemente masculino. Oficialmente o nome é "Congada Azul e Branco de Nossa Senhora Aparecida", sob o comando do Capitão Domingos Sávio dos Passos.
Aparecem também grupos visitantes à comunidade, outros ternos vindos da sede do município ou de municípios vizinhos e este ano está programada a presença do "Pilão de Nhá", vindo de outro distrito são-joanense, o Caquende, apresentando seus cantos e danças de origem rural. O grupo participará da missa inculturada das 15:30 horas.
A celebração do rosário é um dos momentos de fé mais relevantes da comunidade são-gonçalense que se esforça sobre medida para sua concretização. Ora é vinculada à Paróquia do Senhor Bom Jesus do Monte, mas já o foi da de São José Operário e primitivamente à de Nossa Senhora do Pilar. Do ponto de vista cultural é uma oportunidade ímpar para se conhecer ao vivo e in loco uma das tradições mais arraigadas desse lugar.
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Sequência de flagrantes da aurora no Cruzeiro da Pedra Ramaiuda. |
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Cartaz da Festa de Nossa Senhora do Rosário, 2016, em São Gonçalo do Amarante. Papel Couché, 29,5 x 41,7cm. |
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O antigo Congo de Nossa Senhora do Rosário em seu ritual de dança ao redor do cruzeiro da comunidade de São Gonçalo do Amarante. |
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Sob a bandeira de Nossa Senhora Aparecida, a Congada Azul e Branco congrega as mulheres na força da fé e da tradição. |
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Congados visitantes no largo da Igreja de São Gonçalo do Amarante. |
Notas e Créditos
* Texto: Ulisses Passarelli
** Fotografias: Iago C.S. Passarelli, 11/10/2015
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