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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Calango-tango: parte 3

Linha do Bicharão: um calango diferente

A cantoria do calango, que pode ou não ser dançado, é muito disseminada no interior mineiro e bem conhecida nos Campos das Vertentes. Foi alvo de dois textos neste blog, intitulados "Calango-tango".

Dentre as modalidades, uma muito específica é o "Calango dos Bichos", que enumera de 1 a 25 os animais do popular jogo do bicho, considerado contravenção no país (*). No referido texto foi transcrito um exemplar e ora segue este outro, oriundo de Santa Rita do Ibitipoca, informado em 1996 pelo sr. Júlio Prudente de Oliveira.

Como outras versões, faltam alguns números e outros tem o bicho original trocado por eventual lapso da memória (19 é pavão e não peru, que é o 20), mas seja como for, é um exemplar muito significativo deste gênero poético-musical, que carrega no enunciado o sabor da versificação e da pronúncia interioranas.

Senhor me dá licença,
d'eu começar minha coleção,
eu agora vou cantar 
na minha linha do bicharão. 

Número 1 deu n'avestruz,
acompanhando de vão em vão;
número 2 deu na águia,
caiu no chapadão. 

Número 3 deu no burro,
quando não é marcha é trotão;
número 4 na borboleta,
voando de vão em vão. 

O 5 é o cachorro, 
tem apelido de cão;
o 6 deu na cabra,
que dá leite p'ros pagão. 

O 7 deu carneiro,
que de Deus tem a benção;
o 8 o camelo,
que pega peso no chão. 

O 9 na cobra,
que é bicho da maldição;
o número 10 no coelho,
pastando capim-melão. 

O 11 no cavalo,
que dá sela e dá silhão;
0 12 no elefante
que na tromba traz argolão. 

O 13 deu no galo,
que tem espora mas não é pião;
o 14 deu no gato,
destampando o caldeirão. 

O número 15 no jacaré,
nadando no ribeirão;
o 16 no leão,
que é o rei do bicharão. 

O 17 deu no macaco
que pulou do galho no chão,
o 18 deu no porco,
cozido no caldeirão. 

O 19 deu peru, 
arrastando a asa no chão;
(falta o 20)

O 21 deu no touro,
puxando carretão;
o 22 deu na tigre (**),
só pega às traição.

(falta o 23 - urso)
o 24 no veado,
correndo no chapadão. 

25 deu na vaca,
terminei minha coleção. 




Notas e Créditos



* Em razão da ilegalidade, a repressão ao jogo do bicho é muito antiga. A mais de um século a imprensa são-joanense elogiava o Dr. Vieira Marques, de Belo Horizonte, chefe das polícias, pela ordem expedida aos delegados distritais, no sentido de que perseguissem o jogo do bicho (Fonte: jornal A Tribuna, n.49, 13/06/1915, São João del-Rei).

**Na tigre: a expressão no feminino é tradicional entre as vozes populares. No meio caipira a palavra tigre é por vezes sinônimo de onça, o que não corresponde naturalmente aos ensinamentos da zoologia. Mas o costume dessa denominação é antigo. Já Diogo de Vasconcelos escrevera a mais de um século sobre a onça preta, variedade melânica da pintada (jaguar), chamando-a de "onça tigre": "é preta, como o tigre, e tem de ordinário da cabeça à extremidade da cauda, de dez a dezesseis palmos de comprido, o tronco varado, peitos e quartos largos; a forma é a de um gato e serve-se das unhas retráteis como um anzol para chegarem a presa à boca, com a qual a despedaçam; é a mais formidável de todas as feras por sua agilidade, e arteira de modo que, com a dissimulação, assalta a todos os animais; seus urros são medonhos; habita as grandes matas e serras fragosas; nutre-se de toda a espécie de carnes, ama com preferência o gado vacum e cavalar. Atrai as presas por meio da imitação, fingindo o pio do macuco ou do inhambu ou de qualquer ave que pretende apoderar-se." (VASCONCELOS, Diogo Pereira Ribeiro de. Breve descrição geográfica, física e política da Capitania de Minas Gerais. Belo Horizonte: Sistema Estadual de Planejamento/Fundação João Pinheiro/Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1994. Coleção Mineiriana, Série Clássicos. 188p. p.68)

*** Texto e foto: Ulisses Passarelli

**** Para saber mais sobre calango veja neste blog: 


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