Conta-se que surgiu no período da escravidão, pelas mãos dos cativos. Terminados os festejos, em razão da dificuldade que tinham de conseguir material para um novo boi, guardavam-no num canto da senzala, em condições precárias de iluminação, ventilação e umidade. No outro ano, quando iam dançar com ele de novo, o pano de revestimento ("couro") tinha manchas de bolor. O mofo acumulara pela má conservação. O nome surgiu então pejorativo, mas com o tempo se fixou como identidade, perdendo o tom zombeteiro.
Os grupos se mantiveram ao longo das gerações. A tradição oral diz que o grupo que havia na localidade do Muniz, na zona rural, era o mais antigo; mas, extinguiu-se. Em contrapartida formaram-se outros na cidade. Dos mais velhos era o do Bairro Pinheiro Chagas, ora desativado, mas com promessas de reativação. Perseveram três grupos de boi mofado em atividade, que tem seu próprio nome: o "Boi Chitado", na Atalaia, o "Boi Chitão", na Rua de Baixo e o "Boi Topa Tudo", no Quebra Castanha. No ano 2000, acompanhando o encontro dos bois, nas ruas centrais da acolhedora cidade, ainda vimos os quatro grupos em ação (*). Nesta postagem as imagens se atém aos dois últimos grupos.
Em suma o desenvolvimento dos grupos é o mesmo, ainda que cada um tenha sua identidade própria e alguns detalhes distintivos. Em essência se compõe de uma charanga de músicos da comunidade, com indispensável percussão (surdo, bumbo, tarol, pandeiro) e harmonizando vem um acordeon ou instrumentos de sopro (trombone, trompete, sax). Na frente surge o boi em bailado livre, negaceando para todas as direções; avança, recua, corre, gira, faz salamaleques, ataca repentino. Nessa movimentação brinca com adultos e crianças, mas são sobretudo estas que se envolvem em correria danada, rindo... As menorzinhas tem medo; as maiores são provocativas. Além do boi sempre aparecem mascarados diversos, gente enfeitada, foliões desgarrados que aderem à passagem animadíssima do boi, que carreia grande acompanhamento de gente fazendo coro. Alguns grupos mantém um personagem tradicional: o cavalinho, burrinha ou mulinha, feito de uma armação em balaio emborcado, revestido por um pano, no qual se mete o folião como se o cavalgasse. A cabeça e o rabo fingidos compõe a alegoria. O cavalinho rodeia o boi, como se o acompanhasse na movimentação. Por vezes também aparece um toureiro.
O boi em si é relativamente grande em relação a outros bois de bumbas. A estrutura corporal é rígida ("boi duro"), mas o pescoço, que é relativamente longo, mostra uma flexibilidade limitada. Os chifres são enfeitados de fitas coloridas e costumam ser argolados, como os de um boi carreiro.
Naturalmente existe uma certa rivalidade entre os bois, sadia, contudo. Um momento pitoresco é quando se encontram sob a tenda armada na praça: frente a frente se ameaçam numa cabeçada simulada, como dois marruás brigando num pasto. Mas a briga de fato não acontece, a não ser no campo simbólico.
Os grupos cantam. Ora música comum de carnaval, bem popular; ora a marcha própria do boi, com um verso solista intercalado com o refrão coral fixo, "êh boi":
Em tudo o boi mofado é espontâneo. Manifestação legítima da cultura popular ele é livre de amarras de formato. É aberto à adesão da assistência por onde passa. Sua passagem alegre contagia o folião, agita o turista e envolve as crianças. Percebe-se o carinho do pradense para com a manifestação, que indubitavelmente faz parte de seu folclore.
O Boi Chitão e o séquito de crianças. |
Crianças fugindo das investidas do boi. |
O boi põe a criançada em correria. |
Músicos do Boi Chitão. |
Mascarados diversos se mesclam ao alegre cortejo do boi. |
Aspectos do Boi Topa Tudo
O boi arrasta uma multidão. |
Desde muito jovem se aprende a admirar o boi. |
A mulinha. |
Outro aspecto da mulinha. |
As correrias do boi. |
A charanga do boi: percussão e metais de sopro. |
Alguns personagens que acompanham o boi. |
Boi Mofado: algumas imagens do tradicional carnaval de Prados
Bumba ... meu boi!
Boi de Caiado: o Bloco do Boi em Coronel Xavier Chaves
** Agradecimentos especiais a "Ti'Mané" (Edmilson Cândido da Silva) e ao sr. Joaquim Henrique, pelo atenção do acolhimento e presteza das informações.
*** Texto e acervo: Ulisses Passarelli
Maravilhoso. Belo post.
ResponderExcluirGratidão!
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Me senti absurdamente representada, cresci com essa cultura que é exclusiva de Prados e só tenho orgulho da minha cidade presépio. Impressionada com a explicação e como é único e daqui. Nostalgia demais <3
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