Bem vindo!

Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

O joio e o trigo

           A cerca de 20 Km a noroeste de São João del-Rei e ainda em sua área municipal, está a pequena vila de São Gonçalo do Amarante. A igreja de seu patrono data de 1732 e tem estilo inusitado se comparado aos demais templos coloniais do município. Seu primeiro nome foi São Gonçalo do Brumado, alterado pela lei estadual nº 843, de 1923, para Caburu e depois para o nome atual pela resolução nº 1.081 da Câmara Municipal em 28/06/1990 (*).

 No primeiro semestre de 2007, tive acesso a três antigos livros de atas dessa vila: dois são do Apostolado da Oração e Liga do Sagrado Coração de Jesus da Capela de São Gonçalo do Brumado (nº2  / 1923 e nº 3 / 1948-1962) e um da Conferência de São Gonçalo do Amarante (nº1 / 1936-1938).

            O empréstimo e devolução após estudos só foi possível graças à intermediação do festeiro do rosário e congadeiro daquela vila, Dorival Caim de Paula, junto a pessoas da comunidade. Dorival é filho do atual Capitão do centenário Congo que lá existe. A estas pessoas manifesto minha gratidão.

            Antes de detalhar o conteúdo das atas é mister lembrar que o catolicismo reinou hegemônico por séculos em várias partes do mundo. Não é segredo o esforço da Igreja em impor sua lei à custa de todo subterfúgio, aniquilando qualquer voz que se ousasse contrária sob o pretexto de heresia, bruxaria, adoração ao demônio. O passado é sombrio. Somente em tempos recentes foi dada abertura a novas concepções religiosas. Não era sem tempo essa adequação a novas mentes, mais tolerância e respeito às “diferenças”.

            Contudo pelo imenso interior brasileiro o catolicismo tradicional imperou incólume até data recente. Participar de uma associação católica era uma honra inquestionável para o fiel. Era um meio de se afirmar perante a comunidade. Na engrenagem social do mundo rural, a Igreja surgia mais esporádica na visita, apenas mensal, do capelão, mas nem por isso menos rígida. Os leigos, agenciados em associações católicas, faziam até certa medida o papel de agentes eclesiásticos.

            Algumas vezes, seu trabalho árduo e de fé mostrava-se útil na reversão de benefícios aos seus conterrâneos sofridos; outras vezes, porém, apenas a Igreja lucrava, numa via de mão única, numa filosofia de “venha a nós, o vosso reino nada”. Ao devoto porém, essa visão era nebulosa, como que velada pela satisfação de estar “servindo a Deus”. Não enxergava que sua servidão não era a Deus mas ao padre, que usava em vão o nome do Senhor, para objetivar suas arrecadações infindáveis.

            Felizmente, nos tempos hodiernos, embora a exploração religiosa seja ainda comum e generalizada em várias religiões, contudo, os esclarecimentos possíveis pelos meios de comunicação e a liberdade de expressão favoreceram a visão desta problemática. Este aliás é o objetivo maior do presente texto, que em momento algum visa desmerecer as pessoas que no passado deram tudo de si em favor dessas obras religiosas. Pelo contrário sou obrigado a reconhecer a dignidade dos fiéis, embora não possa dizer o mesmo de todos os sacerdotes coetâneos.
  

1-                  Apostolado da Oração & Liga do Sagrado Coração de Jesus

      O livro nº 1 está desaparecido. O livro nº 2 só possui duas atas: nº 76 (completa) e nº 77 (fragmento). Está mutilado pois veio às minhas mãos já com quase todas as páginas infelizmente, arrancadas.

Tal livro nos dá conta que, em agosto de 1923, estava assim dirigida aquela instituição: Padre Frei Simeão van den Akker (Diretor), sr. José Honório de Carvalho (Presidente), sra. Maria Estevan de Carvalho (Vice-presidente), sr. Pedro Honório de Oliveira e sra. Rita Sérvula dos Santos (Secretários). Além destes, havia vários zeladores e associados [1].

            Como não havia, e ainda não há, padre residente na vila e a sua vinda era para celebrar a missa de cada mês, fica claro que as reuniões eram mensais, após cada celebração, pois invariavelmente se faziam sob a sua presença e direção, indicando um controle eclesiástico rígido, bem ao estilo pregado pelos processos romanizadores então em voga.

            O livro 3 está completo, exceto pela folha nº 4 que alguém extirpou. Suas atas são sempre curtas e tem uma formatação padronizada: abertura com datação, chamada dos presentes, intenções das preces, prestação de contas das esmolas angariadas pelos zeladores, exposição do número de comunhões e encerramento.

            Perpassando sucessivas atas, observa-se sua monotonia ao repisar num roteiro convencional, cuja rotina assim se pode resumir: o padre comunicava a normalidade com que tinha acontecido a missa e frisava o número de comunhões, separando-as numericamente entre homens e mulheres. Os zeladores prestavam ao mesmo contas das coletas realizadas ao longo do mês sob a dianteira de seu presidente. Antes de encerrar lia-se a aprovava-se a ata da sessão anterior.

            Para exemplificar o que pretendo demonstrar destaco as intenções das preces, ditadas a cada reunião pelo sacerdote, no prazo de cerca de um ano:

nº da ata/data
1ª intenção
2ª intenção
5 (14/11/48)
Para que a Igreja atraia cada vez maior multidão de operários
Para que na África os direitos dos operários sejam reivindicados de modo cristão
8 (20/02/49)
Luta contra o ateísmo moderno
A Igreja no Congo Belga
9 (20/03/49)
Sumo Pontífice
Cristãos da Mandchúria e Coréia
10 (24/04/49)
Vocações sacerdotais e religiosas
Missões da Birmânia e Ceilão
11 (13/06/49)
Cinqüentenário da consagração do gênero humano ao Sagrado Coração
Neófitos do Japão
12 (17/07/49)
Consciência das próprias obrigações
Ensino superior e universalidade das missões
13 (21/08/49)
Amor fraterno entre os homens
Caridade entre as nações na grande imprensa
14 (03/10/49)
O apostolado pelo rádio
Propaganda missionária na grande imprensa
15 (20/11/49)
Instruções religiosas mais profundas entre católicos
Paz e concórdia em Madagascar
16 (08/12/49)
Orações quotidianas na família
Os países dominados pelo islã

            Ao longo dessas e outras atas vão surgindo os nomes de vários padres que por ali passaram dando sua “orientação espiritual”. Pediram preces para Uganda e Kênia Tanganika[2] , Índia [3], Palestina [4], Austrália [5], etc. Rogaram as sinceras ave-marias dos participantes em favor do desenvolvimento da Igreja entre os negros na América [6], a santificação do clero indígena e a conversão dos ateus e protestantes [7], “para que o sudeste da Ásia se veja livre do perigo comunista[8], “pelas missões entre índios e negros na América do Sul[9], etc.

            Não há notícias do emprego das ofertas ou de preces em favor do sacrificado povo do lugar que assim se tornava fonte de arrecadação e serviço voluntário em nome de Deus sem nenhuma reversão prática em seu favor. As intenções para as preces dos fiéis desfilavam entre reuniões abordando países os mais distantes, pouco imaginados pelos naturais da pequenina vila e igualmente o povo daquelas nações jamais poderiam imaginar a existência do nosso distrito.

            Em junho de 1949 surge a notícia da realização de um leilão e depois aconteceram outros esporádicos, como mais uma via de arrecadação para a Igreja além das coletas convencionais.

            O cenário segue assim sombrio até que na ata nº85, sem data, assume a direção do Apostolado & Liga o muito conhecido Padre Pedro Teixeira Pereira, felizmente ainda vivo e ativo religioso nesta cidade (**), sendo muito respeitado pela qualidade de seu sacerdócio. Padre Pedro, ora citado como vigário, ora como capelão, imprime uma mudança no andamento desta instituição, tornando-a mais humanitária. As atas mudam de estilo e entram novas zeladoras. As comunhões são ressaltadas como tesouro espiritual. A postura é mais humilde: “o sacerdote na missa é apenas instrumento para pronunciar as palavras do sacrifício[10]. Mas a doutrina então vigente não deixava de ser anunciada [11]: “Quando a um católico fosse oferecida a Biblia por algum protestante, devemos repelir com horror, e lançá-la ao fogo ou entregá-la ao vigario”, visão natural para o contexto de meio século passado.

            Contudo no geral sua direção foi repleta de êxito e marcou tanto por ser positiva, que na ata que registra a entrada de um sacerdote substituto, há esta homenagem a Padre Pedro [12]: “O povo e as crianças terão sempre em seu coração o seu nome Padre Pedro Teixeira Pereira. Os caburuenses, jamais, esquecerá deste verdadeiro discipulo do Divino Mestre, está alma magnifica, consoladora. Que leva sempre nas horas certas da nossa vida, uma palavra de consolo e conforto espiritual. Aos pés do nosso Patrono S.Gonçalo a figura inesquecível do querido Padre Pedro Teixeira Pereira. (sic)”

            Após a sua saída volta o estilo antigo com muito pouca exceção (por exemplo, auxílio financeiro a uma zeladora doente por determinação da presidente da mesa [13]).

            Questões político-econômicas vieram à tona orientando-se os fiéis pela técnica da imposição do medo [14]: “para que todos pressintam e detestem as perversidades e os perigos das doutrinas marxistas”.

            Na mesma ata surge uma notícia de ajuda de Cr$100,00 por parte da prefeitura para uma determinada festa.  Na ata seguinte se fica sabendo que esta festividade fora dedicada a Santo Antônio. (Atualmente não há mais esta festa em São Gonçalo do Amarante).

            Por fim destaco os números da atividade das zeladoras, expresso com o nome de “Tesouro do Coração de Jesus”, referente aos meses de fevereiro, março, abril e maio de 1962, que mostram os agigantados atos de fé dos associados [15]: “missas = 233; comunhões = 133; terços = 2003; visitas ao Santíssimo = 183; atos de zelo = 294; atos de caridade = 310; mortificações = 400; jaculatórias = 6.133.”

2 – Conferência de São Gonçalo do Amarante

            Seu primeiro livro de atas está muito bem conservado e foi redigido com letra impecável. Consta como data de sua fundação 10 de maio de 1936. O vigário era o Padre Francisco Tortoriello; o delegado representante do Conselho Central Diocesano, o sr. Christovam Teixeira; na presidência estava sr. Leopoldo Rodrigues Ferreira (por aclamação), tendo por vice sr. José Honório de Carvalho; a secretaria estava a cargo do sr.  Albino Lopes de Oliveira e a tesouraria era responsabilidade do sr. Flávio Cândido Alves. Por razões históricas registro os demais mesários da sua primeira administração: srs. Modesto Estevam dos Santos, Rozalino Freitas de Oliveira, Alípio Rodrigues Ferreira, João Ferreira de Andrade, José Baptista de Carvalho, Miguel Marcos do Nascimento, José Elias da Silva, Antônio da Silva Reis, José Coelho de Gouvêa, José Pedro de Oliveira. Membros honorários: Carlos Augusto Alves, Antônio Emydio de Resende, Francisco José dos Santos, Arthur Maximiano de Souza, Geraldo Magella de Carvalho, José Joaquim Machado, Antônio Balbino de Souza.

As reuniões eram aos domingos, às 12 horas, na capela local. Em cada dia de reunião o presidente indicava dois confrades para exercer ajuda material (e oportunamente outro tipo de ajuda) a um necessitado.

Numa das atas [16] é apresentado o nome de Antônio Cipriano de Andrade. Rozalino pede correção de seu nome: Rozalino Augusto Freire de Rezende. Apresentado para sindicância os nomes de Carolina Izidora de Paula, Rosa Mathias e Daniel Galiano. Para cada indicado dois vicentinos visitavam para ver suas reais condições de vida e, portanto, as necessidades de fato.

Era possível a transferência de pobres para assistência noutra instituição quando a necessidade requeria. Exemplos: 1 - José Affonso Calçavara, representante da Conferência do Sagrado Coração de Jesus, da Colônia do José Teodoro, trouxe uma carta do presidente da mesma, pedindo aceitação pela Conferência de São Gonçalo dos pobres Augusta Machado, José dos Passos e Chrispim Ribeiro. Aceitaram [17]; 2- “Como se achava enferma a nossa pobre socorrida Augusta Machado, a reunião rezolveu interna-la no Albergue em S.João del-Rey a qual foi muito bem acolhida, graças ao nosso Revmo. Vigario Francisco Tortoriello, que não poupou esforços para este fim, foi tirado da caixa da conferencia a importancia de 4:000 para dispesas de carregadores de Augusta Machado, então os confrades que não puderam acompanha-la, resolveram a indenisar a caixa desta conferencia importancia recebida 7:000[18].

Os novos membros eram apresentados como “sócios aspirantes” e depois de um tempo e treino se efetivavam como “sócios ativos” [19].

Continuam as atas aceitando novos confrades como aspirantes, outros sendo promovidos a efetivos, expedindo sindicâncias para socorrer mais gente.

Registravam cada doação em espécie, objetos, roupas, etc.: 1- Daniel Galiano recebeu uma calça e Carolina Izidora um vestido[20]; 2- Augusta Machado ganhou um colchão [21] – ocasião que visitou aos vicentinos o Padre Tortoriello; 3- com oferta de tecidos: “foi entregue pela conferencia, a pobre Emilia Silveira, 4 metros de riscado, 2 metros de algodão e um carretel de linha, na importancia de 7$400[22]; 4- “foi dado pela conferencia um vestido a pobre de nome Maria Antonia, residente em Caxambú no valor de 6300[23].

          Quando havia necessidade, e era possível, as ajudas habituais eram acrescidas. Um aumento dos óbolos é anunciado, bem como enaltecido o nome da benfeitora Dona Francisca Clara de Jesus [24].

Na ata nº 14 registrou-se a visita de Atanásio de Paulo representando a Conferência de Nossa Senhora do Pilar e José Fellipe de Azevedo a do Senhor dos Montes, ambas da cidade de São João del-Rei [25]. Vicentinos de São Gonçalo logo também os visitaram e então se tornaram comuns estas visitas mútuas entre conferências, fosse por iniciativa própria ou por retribuição: de Santo Antônio (Rio das Mortes – nº17), do Rosário (São João del-Rei – nº 18), de São Geraldo (idem – nº 19), do Senhor do Bonfim (ibidem – nº 20), de N.S. das Mercês, ainda da mesma cidade (nº 65), Piedade do Rio Grande (nº63), Coronel Xavier Chaves (nº 64), da Matriz de Tiradentes (nº92). 

Para maior clareza dos recursos angariados em favor da pobreza, foi tomada uma resolução em 30/08/1936, conforme registra a ata nº17: as coletas então se processavam de duas formas: a do dia e a da bolsa. Ficou resolvido o fim da bolsa, substituída por caderneta, onde cada vicentino anotaria suas coletas a fim de prestar contas mensalmente. Isto denota a honestidade dos integrantes.

Outras vias eventuais de arrecadação de fundos podem ser detectadas: 1- “foi entregue a esta conferencia, a importancia de 7600, encontrado no cofre da ex-conferencia de Ibitutinga[26]. 2- oferta por uma graça alcançada 31.000 [27]. 3- idem, 1.000 [28]. 4- ibidem, 7.000 [29]; 4- doação de 10.000 por promessa [30]; 5- realização de leilões [31].

Mudanças de status ou transferência de uma para outra conferência aconteciam. Vemos na ata nº 27 que “passa a pertencer a esta conferencia transferido da conferencia de S.Antonio de S.João del-Rey, o confrade honorario Snr. João Baptista Sandim.” Na nº 96 consta a exoneração do 2º secretário que foi passado à categoria de honorário.

            A conferência arcou com as despesas do funeral do socorrido Daniel Galiano [32]. Outra morte foi anunciada [33]: “a pobre Carolina Izidora socorrida desta conferencia residente em Mama-Rosa.”

            A preocupação com a moral dos socorridos era grande, como se pode constatar destas notícias: “deu alta de seu socorro o snr. Joaquim Mendes por já se achar em estado de trabalhar, foi aumentado os socorros de Maria de Aguiar com mais 1:000 por se achar adoentada.” [34]; “foi abolido os socorros desta conferencia do pobre Chrispim por não estar mais em condições de socorro e se achar forte em condições de trabalho[35]; “foi aprovada em sessão suspender os socorros da pobre Roza Mathias por ter em sua companhia a sua filha de má vida, isto temporariamente ate que possa corrigi-la[36]. Sobre este último caso, curioso aos olhos atuais, diz a ata subsequente que a ex-socorrida conseguira reatar a filha ao marido e assim a conferência encaminhou um confrade em missão de sindicância para verificar a verdade do fato. Na outra reunião resolveram os vicentinos retornar com a ajuda por ser fato verídico.

            A central era repassada certa importância: valor de 5.000, por exemplo [37], ou “offerecido ao conselho central os 10 % 10.000[38]; “foi remettido desta conferencia para o snr. prezidente do conselho central em S.João del-Rey, Dr. Paulo Lustosa a importancia de 105,00, destinado ao santuario de S. Vicente de Paulo em Belo Horizonte[39].
  
2-                  Comentários finais

As fontes pesquisadas indicam de forma clara o contraste entre o papel do leigo e o do agente eclesiástico numa comunidade rural, de vida tradicionalmente vinculada sobretudo à pecuária extensiva de gado leiteiro e à agricultura familiar de subsistência, durante parte do período de vigência da ideologia romanizadora da Igreja Católica. Pela forma como o vimos, neste contexto específico, os papéis se inverteram e o fiel é que dava exemplo aos doutrinadores.

Em si não vemos em ponto algum qualquer tendência a valorizar os elementos da cultura local, muito menos os da religiosidade popular, riquíssima fonte evangelizadora.

A orientação no Apostolado & Liga era para questões internacionais, admoestando sempre para os interesses universais da Igreja e as obrigações locais dos fiéis, numa relação muito nítida de submissão. O fiel se tornou servo e não povo de Deus. Não se podia usufruir nem dos benefícios espirituais teoricamente oferecidos pela Igreja. Uma notícia a propósito é esta: “esse mês não houve missa do ‘contrato’ e por isso nem a do Apostolado[40]”. Na mesma linhagem é este gasto: “Retiramos Cr$100,00 para duas missas, uma pela intenção do Apostolado, outra por alma de Ana Maria de Jesus[41]. É admirável o grau de exploração da boa vontade e boa fé destas pessoas por parte da Igreja, que, mesmo com tanto trabalho em seu exclusivo favor, tinham que pagar pelas missas!

A realidade da conferência era até certa medida semelhante, contudo, favorecida pela maior liberdade de ação. A linha de conduta caritativa voltava-se de forma muito útil para os anseios do próprio lugar, beneficiando os necessitados dali mesmo, fazendo na prática um cristianismo muito verdadeiro.

      Ambos, porém, dentro de suas respectivas diretrizes tiveram plena dignidade, um mérito extraordinário de dedicação, na certeza de estarem exercendo a sua fé, vencendo as lutas contínuas dos trabalhos infindáveis da vida rural a despeito do desamparo da Igreja. Fazendo um paralelo com a famosa parábola bíblica, no caso aqui exposto, no contexto da época abordada, o fiel era o trigo e a Igreja, o joio.

Vista noturna da Igreja de São Gonçalo do Amarante, abril/2009.
                                  
Vista diurna da Igreja de São Gonçalo do Amarante, outubro/2011.
Notas e Créditos

* Texto publicado em 14/08/2012. Para acessar a publicação original clique no link:
** Infelizmente este sacerdote faleceu em 2015. Vide: ADEUS, PADRE PEDRO...
*** Texto e fotografia: Ulisses Passarelli
**** Agradecimentos especiais a Dorival Caim de Paula. 


[1] - nº76,12/08/23.
[2] -  nº19, abr./50.
[3] - nº20.
[4] - nº 26.
[5] - nº 52, ag./53.
[6] -  nº18, mar./50.
[7] - nº21, jun./50.
[8] - nº 47, mar./53.
[9] - nº75, nov./55.
[10] - nº101, 10/11/57.
[11] - nº100, 13/10/57.
[12] - nº104, 09/03/58.
[13] - nº106, 11/05/58.
[14] - nº107, 13/07/58.
[15] - nº132, 13/05/62.
[16] - nº 2, 17/05/36.
[17] - nº 3, 24/05/36.
[18] - nº 48, 04/04/37.
[19] - nº 3, 24/05/36 e  nº 6, 14/06/36.
[20] - nº9, 05/07/36.
[21] - nº10, 12/07/36.
[22] - nº 86 26/12/37.
[23] - nº42, 21/02/37.
[24] - nº 12, 26/07/36.
[25] - nº 14, 09/08/36.
[26] - nº 82, 28/11/37.
[27] - nº 81, 21/11/37.
[28] - nº81, 21/11/37.
[29] - nº 96, 06/03/38.
[30] - nº42, 21/02/37.
[31] - nº 41, 14/02/37; nº46, 21/03/37 e ss.
[32] - nº34, 27/12/36.
[33] - nº 36, 10/01/37.
[34] - nº 42, 21/02/37.
[35] - nº79, 07/11/37.
[36] - nº88, 09/01/38.
[37] - nº 65, 01/08/37.
[38] - nº95, 27/02/38.
[39] - nº 90, 23/01/38.
[40] - nº103, 20/01/58.
[41] - nº117, 13/09/59. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário