No século XIX, o militar português Cunha Matos em seu estudo sobre Minas Gerais, relatou:
"Há poucas pontes de pedra lavrada e algumas de madeira são cobertas de telha. As pontes mais notáveis são: a do Rio Grande, perto da Vila de São João del-Rei; (...) As pontes de pedra da Vila de São João del-Rei são as melhores da Província." (p.44).
As pontes começam a surgir lá no pé do Lenheiro, no final do Tijuco, região que outrora era conhecida por Betume, por causa do barro preto untuoso ali abundante. É o atual Residencial Lenheiro. E vem se quantificando a jusante, algumas humildes como a que liga o Residencial Lenheiro e o Barro Preto, outras suntuosas como as de pedra; ou charmosa, afrancesada, como a do Teatro; de ferro como a da Biquinha, a dos Suspiros e a da Estação; velhas obras de alvenaria como a Benedito Valadares, inaugurada no centenário de elevação à cidade (1938), até hoje importantíssima no trânsito da cidade. Outras ficaram na lembrança, como a que havia possivelmente na Rua Direita (imediações do Museu de Arte Sacra) sobre o ínfimo Córrego da Muxinga, datada de 1745; a que aparece na citação de GAIO SOBRINHO (2010) de um recibo da Câmara Municipal de 1719 (recibo 168, pg.17): "Por quatorze oitavas de ouro que deu a Manoel Ferreira do conserto que fez na Ponte do Aterrado que vai para a Igreja Matriz por ordem de que se lhe passou mandado em 29 de dezembro de 1719" (p.35); ou na antiga "Rua da Misericórdia", sobre o Córrego do Segredo, a conhecida Ponte da Misericórdia, da qual sem qualquer misericórdia, foi feito drástico aterramento, substituída por sistema de galerias. A Ponte da Misericórdia era de pedra, como as da Cadeia e do Rosário, porém de um só arco. Foi construída em 1798 pelo Mestre-canteiro Aniceto de Sousa Lopes.
Mais que isto, além do fluxo mais central, do Lenheiro, mais pontes se multiplicam pelo Rio Acima, entremeio o Guarda-mor e a Vila Maria; "pras bandas" de Matosinhos, várias, ao longo do Ribeirão da Água Limpa, já abordadas em postagem intitulada "Pontes de Matosinhos"; e tantas, tantas outras pela zona rural, algumas ainda em estrutura de tabuado de madeira.
Não seria má ideia um estudo multidisciplinar de envergadura sobre essas pontes todas, mapeando-as e marcando-as por geo-referenciamento; estudo histórico, fotografias em ângulos variados, qualificação estilística, tecnicamente relato do estado de conservação que seria importante base de referência para a administração municipal planejar manutenção, e, quiçá, visionariamente, até as roteirizando como atrativo turístico: "Roteiro das Pontes"... Por que não?!
1- Córrego do Lenheiro com vista parcial em sequência das pontes da Cadeia, do Teatro e Benedito Valadares, em São João del-Rei. |
- A ata da sessão 38 da Câmara de Vereadores, de 12/03/1887, consta, segundo GAIO SOBRINHO (2010), a leitura de um "ofício assinado pelo Sr. Teófilo Reis e Joaquim Ramalhão declarando terem, com o auxílio de vários cidadãos, construído um pontilhão tosco de madeira em frente à Estação da Oeste e sobre o ribeirão que atravessa esta cidade a bem do interesse público e comercial"(p.140). Outra notícia da Ponte da Estação no século XIX é uma subscrição visando reconstruí-la, datada de dezembro do ano da abolição da escravatura (A Verdade Política, n.14, 21/12/1888). (*)
- A Ponte da Estação, ou como também era dita, Ponte da EFOM foi construída sobre o Córrego do Lenheiro, com trilhos e estabelecida acima das máximas enchentes, permitindo franca passagem. Foi originalmente assoalhada com pranchões, até a largura de 2 metros e o comprimento de 35 metros. (S.João d’El-Rey, nº3, 22/02/1899)
- Lei municipal nº214, de 05/06/1909, autoriza mudança da ponte de frente da estação ferroviária para a Rua Cristóvão Colombo. (A Opinião, n.2, 14/07/1909). Existiu naquele local, interligando-a à Praça Pedro Paulo, uma passarela de ferro, que se alinhava à Rua Aureliano Pimentel. A mesma foi profundamente danificada pela grande enchente de 1982 e passou por reparos. Outras enxurradas também deixaram seus danos e vieram reparos até que foi interditada e mais tarde removida. Por uns tempos foi improvisada um "pinguela", assim chamada a passarela provisória em madeira. Depois foi também retirada e o local ficou um tempo sem estrutura de travessia. A ponte atual veio na década de 1990.
- Operários da Ferrovia Oeste de Minas socorrem a ponte de madeira que interligava a Rua Antônio Rocha ao trecho médio da Paulo Freitas. A fortíssima enchente de 1917, que causou grandes danos na cidade, também a atingiu; mas, no dia seguinte, os referidos operários já promoveram os reparos. (O Zuavo, n.99, 21/01/1917). Esta ponte não existe nos dias atuais. Ficava entre as atuais Ignácio Zózimo de Castro (Praça Raul Soares/Rua Antônio Rocha) e Padre Tortorielo (Praça Afonso Dalle/Avenida Leite de Castro/Rua Antônio Rocha).
- O tráfego de veículos sobre a Ponte do Teatro se dava de um por vez, devido à sua pequena largura. O fechamento dessa ponte ao tráfego de veículos automotores gerou muita polêmica (Tribuna Sanjoanense, n.189, 02/09/1977; O Sabiá, n.7, set./1977)
- Em abril de 1990 é inaugurada a Ponte Ignácio Zózimo de Castro, nome que homenageava um comerciante que tinha uma mercearia na Rua Paulo Freitas/Praça Raul Soares. Esta ponte substituiu outra que havia no mesmo lugar, menos robusta e que havia sido sucessivamente danificada por enchentes, sobretudos por trombas d'água da década anterior: o famoso e medonho temporal de 1982 causou-lhe profundos danos. Apesar dos reparos não foi mais a mesma... chegou a estar um tempo interditada ao tráfego. A gestão municipal que veio após a da inauguração, alargou a sua pista de rolamento.
- A calçada da Ponte da Cadeia é alargada através da remoção de uma faixa de pavimentação de paralelepípedos para extensão dos passeios em 40 cm de ambos os lados. Com isto ganhou-se segurança para os pedestres e as pista de rolamento tendo ficado mais estreita, impossibilitou o trânsito de veículos de grande porte, protegendo este patrimônio da cidade. Apesar da lei municipal nº2.487, de 1989 proibir o trânsito de veículos pesados no centro histórico, o desrespeito por parte dos motoristas e a fiscalização insuficiente levaram a esta medida (Gazeta de São João del-Rei, n.263, 30/08/2003). Contudo, na Ponte do Rosário, a medida de alargamento das calçadas com o mesmo intuito só viria uma década depois, em julho de 2013.
- Servidores da Secretaria de Obras trabalharam para fazer reparos na cabeceira da Ponte da Rodoviária, que cedeu em 17/01/2005. A fotografia estampada na fonte jornalística mostra os trabalhadores batendo estacas, mas as obras previam também aplicação de concreto armado, aterro, "abertura de passagens de água e reforma nos passeios." (Gazeta de São João del-Rei, n.334, 22/01/2005)
2- Queda da ponte de madeira sobre o Córrego do Limpa-goela, na Colônia do José Teodoro, que dá acesso à centenária Capela do Sagrado Coração de Jesus, após as fortes chuvas de fevereiro de 2004. |
Referências Hemerográficas
CINTRA, Sebastião de Oliveira. Efemérides de São João del-Rei. 2.ed. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1982. 2v.
GAIO SOBRINHO, Antônio. São João del-Rei através de documentos. São João del-Rei: UFSJ, 2010. 260p.
MATOS, Raimundo José da Cunha. Corografia Histórica da Província de Minas Gerais (1837). Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: USP, 1981. v.2, 337p. p.44.
** A Ponte Vitório Tarôco sobre o Rio Carandaí, na Colônia do Giarola, liga este bairro às colônias do Felizardo e Recondengo (ainda em São João del-Rei) e ao povoado do Barreiro (Cel. Xavier Chaves), sitos do outro lado do mesmo rio. A que atualmente se encontra instalada foi inaugurada em abril de 1995, pelo Prefeito Nivaldo Andrade, em substituição à anterior, que era de madeira e estava muito precária. Na verdade muito antiga. A Ponte de Santa Rita citada no texto jornalístico é a ponte sobre o Rio das Mortes no povoado de Ibitutinga, no acesso ao então distrito de Santa Rita do Rio Abaixo, hoje município de Ritápolis. Situa-se ao longo da Rodovia Federal BR-494.
**** A Ponte Chafy Moyses Hallak é uma das três que leva popularmente o cognome de "Ponte da Biquinha". Ela se situa sobre o Rio Acima (nos tempos coloniais conhecido como Córrego das Barreiras) e acessa a Praça da Biquinha à Avenida Eduardo Magalhães. A outra, é uma pequena ponte de ferro rebitado, piso cimentado, tendo uma cruz de ferro trabalhado, suspensa em cada cabeceira, sendo que a do lado do Tijuco se encontra desaparecida. Situa-se entre a Praça e a Rua Rossino Baccarini; e, finalmente a terceira, está imediatamente à montante desta e tem o nome oficial de Ponte Braz Camarano Primo, datada de 1994, obra criticada por causa de sua altura mínima. Contudo, informações dão conta de uma ponte inaugurada em 1968 com o nome de "Padre José de Anchieta", durante a administração Milton Viegas, que interligou a Rua Padre José Maria Xavier à Praça Fausto Mourão. Seria esta uma ponte anterior à Chafy Moyses Hallak ou apenas seu nome anterior? Ou seria a pequena passarela de ferro sita a montante no Rio Acima? O assunto exige pesquisa nos arquivos municipais e velhos jornais são-joanenses.
***** Texto, pesquisa, acervo e fotografias 2 e 3: Ulisses Passarelli
****** Fotografia 1: Iago C.S. Passarelli, 24/09/2014.
Muito bom trabalho!
ResponderExcluirSão notícias importantíssimas!
Miranda.