Facécias são brincadeiras verbais, de crianças ou adultos, no geral de aspecto disparatado, sem qualquer sentido aparente, que na verdade existe, desde que contextualizado nos parâmetros da cultura popular.
As facécias desafiam a imaginação, descontraem e socializam. Muitas vezes, senão mesmo sempre, elas vem recheadas de verve e às vezes sarcasmo. Seu enunciado se desenvolve entre duas crianças, crianças e adultos ou mesmo apenas entre adultos, mantendo viva a criança que existe dentro de cada um.
Uma categoria das mais conhecidas é a do "cúmulo", com a qual se brinca com o extremo imaginário das coisas ou circunstâncias, no sistema de pergunta e resposta entre duas pessoas. Exemplos coligidos em São João del-Rei nos anos noventa do século passado:
_ Qual é o cúmulo da rebeldia?
_É morar sozinho e querer fugir de casa...
_ Qual é o cúmulo da lentidão?
_ É jogar uma bola na sexta e ela só cair no sábado...
_ Qual é o cúmulo da economia?
_ É usar papel higiênico dos dois lados...
_ Qual é o cúmulo da magreza?
_ É se deitar na agulha e se cobrir com a linha...
_ Qual é o cúmulo da inocência?
_ É uma menina-moça espremer os peitinhos achando que é espinha (acne) inflamada...
_ Qual é o cúmulo da rapidez?
_ É fechar uma gaveta (ou cofre) trancando a chave de dentro...
_ Qual é o cúmulo do silêncio?
_ São dois esqueletos brigando sobre uma folha (chapa) de zinco...
_ Qual é o cúmulo da força?
_ É dobrar uma rua e quebrar duas esquinas...
Outra categoria é o "pelo sinal", de que existem muitos exemplos, e que ora segue este de Santa Cruz de Minas, colhido no final dos anos noventa:
"Pelo sinal
do bico real,
comi angu com toicinho
me fez mal"
As facécias brincam com frequência com o tema alimentar, como estes exemplares da mesma cidade e época:
"Boi magro ficou no cocho,
não come mais porque tá frouxo..."
"Bendito paca,
louvado cutia,
se tivesse mais,
ainda queria..."
Alguns exemplares se fixaram como dísticos de Santa Cruz de Minas:
"A minha vida é uma traficança:
O destino aperta, a saudade avança."
"Sô do Morro da Bananeira,
Olho sua cara, me dá caganeira..."
Em São João del-Rei o exemplar abaixo aproveita-se da rima do trocadilho:
"Seu Chico Tripa
quando fica tiririca,
põe o dedo na titica
da Chiquinha pra cherá...
A Mariquinha,
comeu tripa de galinha
foi contar pro namorado
que comeu macarronada..."
Outro da mesma fonte:
"Cumpadre Zacarias,
que mora lá no sul
barba de sapé
do olho azul..."
As facécias possibilitam a combinação de elementos espontâneos da cultura popular, compondo gracejos que contribuem com momentos simples de entretenimento pela força da oralidade.
Notas e Créditos
* Informantes: Aluísio dos Santos, São João del-Rei, 1996; José Cândido de Salles e Elvira Andrade de Salles, Santa Cruz de Minas, década de 1998.
** Texto: Ulisses Passarelli
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