Primeiro de abril é conhecido por Dia da Mentira desde longa data, conforme um costume de origem europeia, que os colonizadores do velho mundo nos trouxeram. Neste dia é bastante comum se contar mentiras, fazer pilhérias, pregar peças de puro motejo, sempre simulando ser o fato narrado uma verdade, mas realmente é uma inverdade.
As crianças são especialmente adeptas das brincadeiras deste dia, aprontando troças com muito bom humor sobre colegas. Alguns mais espertos, já desconfiados pela data, descobrem a farsa e desmascaram o brincalhão; outros mais são vitimados e sob assuada dos colegas tem que aguentar a onda de zombaria que se abate sobre ele.
Nas escolas dizem a um que a diretora o chama e logo volta da diretoria sob apupos; a outro, que teve nota baixíssima numa certa prova e põe crédito, mas logo descobre a trapalhada que lhe armaram e assim vai.
Adultos também embarcam na brincadeira, sobretudo entre amigos próximos, colegas de trabalho, gente da mesma empresa. É o cônjuge que descobriu a existência de um amante, é o patrão que viu na câmera de segurança uma brincadeira indevida; é o inimigo que simula reaproximação; é o convite para uma festa que não existe... tudo mentira de primeiro de abril. Na cultura popular ela tem licença livre nesse dia e corre solta, sem punições, sem censuras.
Ainda nos anos setenta em São João del-Rei, quando um moleque caía numa destas ciladas, logo os demais punham-se ao motejo cantarolando: "É primeiro de abril! Sua calça caiu, seu pai não viu e sua mãe vestiu!!!" Era a revelação da trama deixando ora envergonhada ora enfurecida a criança vitimada.
Sobre a origem do Dia da Mentira explica o mestre folclorista Luís da Câmara Cascudo sua procedência europeia, francesa, posteriormente difundida com grande amplitude:
"até a segunda metade do séc. XVI o dia primeiro de abril começava o ano. Abril, aperire, abrir. O Rei Carlos IX, por uma ordonnance do Roussillon, Dauphiné, em 1564, determinou que o primeiro de janeiro iniciasse o ano na França, daí por diante. Com as consequências da transferência de festas e solenidades do Ano-Novo, muita gente ficou perturbada com o desaparecimento das datas tradicionais, retardando entendimento e uso."
Logo, primeiro de abril ficou sendo o falso dia de ano-novo, motivo para presentes irreais e festas simuladas. O costume de brincar com o assunto permaneceu, perdida a motivação inicial. O primeiro de abril é a data que rompe com a ordem reinante, derruba momentaneamente a regra social da verdade, como se fosse um protesto contra ela.
Notas e Créditos
* Texto: Ulisses Passarelli
Referências bibliográficas
CASCUDO, Luís da Câmara.
Dicionário do Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro; Ediouro, [s.d.]. 930p. Verbete: Primeiro de Abril.
Muito legal essa descoberta! Obrigada.
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