De
início é fundamental observar algumas informações panorâmicas sobre o
município, extraídas do portal do IBGE: população estimada em 2024 de 10.994
pessoas; densidade demográfica em 2022 de 21,02 hab./km2. Gentílico
alto-rio-docense. Área municipal 518,053 km2, sendo a área urbanizada de 2,37
km2. Está inserido na Mesorregião Zona da Mata, Microrregião de
Viçosa, Zona Intermediária e Zona Imediata de Barbacena. O bioma predominante é
a Mata Atlântica. O gado leiteiro e a produção de carvão vegetal são
expressivos no município. Na agricultura o cultivo de cereais tem seu expoente
no milho, seguido do feijão; entre as lavouras permanentes o destaque é a
tangerina e nas temporárias, a cana de açúcar (BRASIL, 2025).
Um
resumo do histórico, segundo a mesma fonte é o seguinte:
antes
da colonização, era habitado por índios Croatas e Puris, de origem Tupi,
espalhados por toda a região. Os primeiros exploradores vieram de Guarapiranga,
atual município de Piranga. Desceram pelo Rio Espera e daí subiram pelo Rio
Xopotó, objetivando a exploração de minérios. Em 1711, o Alferes Francisco
Soares Maciel, líder de uma bandeira, chega à região do Xopotó e funda um dos
primeiros arraiais da região, denominado São Caetano do Xopotó. Este arraial
trouxe ainda mais exploradores que se espalharam e se fixaram às margens do Rio
Xopotó, criando novos povoados.
Em 1759, quando José Alves Maciel chegou à região, esta já se encontrava
habitada por bandeirantes e índios Croatas e Puris. Tais terras haviam sido
doadas para José Alves Maciel pelo Rei de Portugal, recebendo do Governador
interino, José Gomes Freire de Andrade, uma sesmaria, denominando sua
residência Xopotó. Acima, mais tarde, casou-se com D. Vicência Maria de
Oliveira, mulher que muito influenciou para a construção da primeira capela e a
doação de terras para a atual cidade de Alto Rio Doce. A sesmaria de terras
doada a José Alves Maciel transformou-se em fazenda e passou a denominar-se Fundão
e posteriormente, com a construção da capela, passou a chamar-se Sítio São José.
Com a fixação de mais moradores, fundou-se o povoado de São José do Xopotó, em
19-03-1764, onde foi construída a primeira Capela de São José, no alto do Morro
Seco, desenvolvendo ali o povoado núcleo da cidade. Em 1820 foi construída
pelos moradores uma capela maior no lugar onde hoje está a Igreja Matriz. Em
1830 a Capela foi elevada a Curato, e em 1832 o Curato foi elevado à Freguesia,
tendo as Capela de Desterro do Melo, Rio Espera, São Caetano e Senhora dos
Remédios como filiais. A Paróquia foi instituída em 1833, tendo o Padre
Agostinho Cezário de Andrade como seu primeiro Pároco. Em 1882 a Capela foi
demolida e foi construída em seu lugar uma Igreja de duas torres. Entre 1917 e
1919 essa Igreja foi demolida e construída a atual Igreja Matriz de São José
pelo Padre Messias de Senna Batista. O nome de São Sebastião do Xopotó, permaneceu
até a emancipação política do Município. Quando foi elevado à categoria de
Vila, a Sede Municipal passou a denominar-se Alto Rio Doce, por ser naquela
época a mais alta cidade localizada na zona das cabeceiras(nascentes) do Rio
Doce. O povoado foi elevado a Vila com o nome de Alto Rio Doce através do
Decreto n° 26, em 07-03-1890. Em 24-05-1892, foi elevada a categoria de Cidade.
(BRASIL, 2025).
Sobre
a sua história administrativa consta que:
Freguesia
com a denominação de São José do Xopotó, pelo Decreto de 14-07-1832 e pela Lei
Estadual n° 2, de 14-09-1891. Elevado à categoria de Vila com a denominação de
Alto Rio Doce, pelo Decreto Estadual N° 26, de 07-03-1890, desmembrado do
Município de Piranga. Sede na antiga povoação de São José do Xopotó.
Constituído de 3 Distritos: Alto Rio Doce (ex-São José do Xopotó), Dores do
Turvo e São Caetano do Xopotó. Instalado em 30-08-1890.Elevado à condição de
Cidade com a denominação de Ato Rio Doce, pela Lei Estadual nº 23, de
25-05-1892. Em Divisão Administrativa referente ao ano de 1911, o Município é
constituído de 3 Distritos: Alto do Rio Doce, Dores do Turvo e São Caetano do
Xopotó. Nos quadros de apuração do Recenseamento Geral de 1-09-1920. Pela Lei
Estadual n° 843, de 07-09-1923, Alto do Rio Doce, adquiriu do Município de
Barbacena o Distrito de São Domingos de Monte Alegre.
Em Divisão Administrativa referente ao ano de 1933, o Município é constituído
de 4 Distritos: Alto Rio Doce, Dores do Turvo, São Caetano do Xopotó e São
Domingos do Monte Alegre. Assim permanecendo em Divisões Territoriais datadas
de 31-12-1936 e 31-12-1937. Pelo Decreto-Lei Estadual N° 148, de 17-12-1938, é
criado o Distrito de Abreus e anexado ao Município de Alto Rio Doce. Sob a
mesma Lei supracitada desmembra do Município de Alto Rio Doce o Distrito de
Dores do Turvo, para formar o novo Município de Senador Firmino (ex-Conceição
de Turvo). E, ainda o Distrito de São Caetano do Xopotó passou a chamar-se
Cipotânea e São Domingo de Monte Alegre tomou a denominação de São Domingos. No
quadro fixado para vigorar no período de 1939-1943, o Município é constituído
de 4 Distritos: Alto do Rio Doce, Abreus, Cipotânea e São Domingos. Pelo
Decreto-Lei Estadual n° 1058, de 31-12-1943, o Distrito de São Domingos passou
a chamar-se Missionário.
No quadro fixado para vigorar no período de 1944-1948, o Município é
constituído de 4 Distritos: Alto do Rio Doce, Abreus, Cipotânea e Missionário.
Assim permanecendo em divisão territorial datada de 01-07-1950. Pela Lei
Estadual n° 1039, de 12-12-1953, desmembra do Município de Alto Rio Doce o
Distrito de Cipotânea. Elevado à categoria de Município. Em Divisão Territorial
datada 01-07-1955, o Município é constituído de 3 Distritos: Alto do Rio Doce,
Abreus e Missionário. Assim permanecendo em Divisão Territorial datada de
01-07-1960. Pela Lei Estadual n° 2764, de 30-12-1962, é criado o Distrito de
Vitorinos e anexado ao Município do Alto Rio Doce. Em Divisão Territorial
datada de 31-12-1963, o Município é constituído de 4 Distritos: Alto Rio Doce,
Abreus, Missionário e Vitorinos. Assim permanecendo em Divisão Territorial
datada de 2007. (BRASIL, 2025).
A drenagem fluvial do município faz parte da bacia doceana, “banhado
pelos rios Piranga, Xopotó, Mutuca, Brejaúba” contando com o atrativo
paisagístico de diversas quedas d’água, sendo favorecido pela amenidade
climática (temperado úmido). Tanto mais, destacam-se os “eventos voltados para
gastronomia tais como: Festival de Angu, Festival de Cachaça e Festival de
Gastronomia na modalidade comida de boteco” (MINAS GERAIS, 2025).
O
brasão municipal destaca a agropecuária (ramos de café e milho; cabeça de boi)
e a devoção católica a São José, padroeiro do município. (ALTO RIO DOCE, 2025).
No
campo da cultura popular é tradicional a congada (marujos) do distrito de Missionários.
Já no decorrer do carnaval o “Bloco da Burrinha” reúne grande quantidade de participantes e acontece desde
1968. Atualmente o bloco desfila em três dias sucessivos: domingo, segunda e
terça de carnaval, denotando sua grande popularidade.
Em
linhas gerais atende ao padrão geral dos Ranchos de Boi brasileiros, com desfile alegre,
descontraído, que reúne fantasiados de todo tipo, e o boi ao centro fazendo
correrias de pega nos foliões incautos ou naqueles provocadores. Junto a este
núcleo surgem outros personagens gravitando em torno da movimentação do boi. No
caso específico de Alto Rio Doce, são vários bois e burrinhas (ou mulinhas, como ouvimos foliões também a chamarem), além de diversos
bonecos gigantes. Embora sejam personagens comuns a outros blocos ou ranchos
equivalentes, neste município em especial a burrinha se sobrepôs em preferência
à nomenclatura da manifestação cultural, um fato incomum. No geral é o boi que
polariza o nome do grupo.
Ao
observar as alegorias algumas características afloram de imediato. Os bonecos
tem estrutura corporal simples, trajes imitando a roupa humana (calça, camisa,
vestido) em grande tamanho; mas a cabeça tem aspecto aprimorado, sendo possível
reconhecer as fisionomias que retratam, de personagens reais ou fictícios. Os
bois e burrinhas possuem o mesmo sistema construtivo: armação metálica leve,
fina, revestida de tecido de cor intensa. O brincante fica dentro da alegoria
até a altura da cintura e o restante do corpo de fora, como se cavalgasse o boi
ou a burrinha. Essa leveza estrutural e a cabeça totalmente para fora (o que dá
boa visão), favorece as corridas atrás das pessoas. No geral os bois tem o
chifre longo, bem arqueado, em forma de meia lua. Todos tem cabeça de pano, o
que também contribui para a leveza da alegoria. Todo dançante de um boi ou de
uma burrinha veste-se com calça e blusa de corte simples, tosco no acabamento,
em tecido ramado ou florido (chitão) e invariavelmente mascarado. As máscaras
observadas são de feitura industrial, em látex, silicone ou acetato, representando
monstros e outros seres bestiais. É provável que esses aspectos representem
processos de alteração evolutiva, favorecida pelas múltiplas possibilidades de
material industrializado facilmente disponível, mais acessíveis, e já praticamente
prontos, em relação ao grande trabalho manual para produzir cabeças de bois a partir
de caveiras, armações trançadas de bambu e máscaras a partir de pedaços de
couro.
A
parte musical fica a cargo de uma banda de música, acompanhada de bateria de
percussão. Tocam marchinhas carnavalescas durante o cortejo. Não observamos
canto específico.
Uma
característica observada em Alto Rio Doce é o translado das alegorias e músicos
antes do desfile. Na tarde, carros e ônibus atravessam a cidade carregando-os,
sob o som de buzinas e sirenes, como que emitindo um alerta de preparação a
chamar a atenção das pessoas. Dentro dos ônibus os percussionistas põem-se em
batucada. Bois, burrinhas e gigantes vem em uma carroceria de caminhão. O
cortejo motorizado atravessa diversas ruas e se concentra em um dos extremos da
cidade. Na hora aprazada, partem de volta pelas ruas com os veículos, para o outro
extremo da cidade, próximo ao cemitério. No largo fazem a concentração final
antes da saída. Descem todos dos veículos e de pés no chão vão preparar-se
dentro das alegorias, vestir as máscaras, dar vida aos bonecos. Músicos
aprontam os instrumentos, afinam, aquecem os tambores. Há muita agitação,
principalmente dos jovens, que formam uma grande massa de foliões. A animação
toma conta do ar.
Autor: Betânia Nascimento Resende, 03/03/2025
O cortejo inicia a descida ao centro da cidade. Na ladeira, já os bois e burrinhas disparam desenfreados na frente, pondo em corrida uma multidão de crianças até a praça onde está a Prefeitura e o Fórum. Os bonecos descem no meio do cortejo, devagar, com dança comedida e compassada. Um mais habilidoso faz corrupios com a grande estrutura de um boneco. Na retaguarda os músicos. E o povo folião ao redor, por toda parte. A alegria é contagiante, o ritmo envolvente. Uns jogam confete, outros, espuma de spray. Há muitas pessoas com fantasias variadas, mas nota-se ser comum as fantasias de “coelhinho” por parte das jovens.
O
desfile segue ao lado da Igreja Matriz e vai até a Capela do Rosário, junto ao
coreto. Param ali por um tempo. Há muita gente reunida naquela praça, que os
estava esperando. Igualmente pelas calçadas, pessoas em aguardo do cortejo
passam a acompanhar na passagem do grupo de foliões, que desta forma vai se
encorpando.
Depois
descem a grande ladeira ao centro e vão por fim em direção à área próximo a
Rodoviária para o encerramento.
Não
restam dúvidas ao contemplar este folguedo acerca de sua tradicionalidade e o aspecto
identitário com o povo alto-rio-docense. O envolvimento da parcela juvenil e
infantil da cidade faz antever a esperança de continuidade com o passar dos
anos; a grande quantidade de pessoas à margem das calçadas ansiosas pelo
cortejo demonstra com clareza o senso de pertencimento. A própria ornamentação
carnavalesca das ruas por parte da Prefeitura Municipal remete à estética do
Bloco da Burrinha. Tudo isto se soma para demonstrar as características
imateriais desse genuíno patrimônio cultural de Alto Rio Doce.
Referências
BRASIL. Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE: Alto Rio Doce. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/alto-rio-doce/panorama Acessado em: 04 mar. 2025.
MINAS GERAIS. Portal
Minas Gerais: Alto Rio Doce. Disponível em: https://www.minasgerais.com.br/pt/destinos/alto-rio-doce Acessado em: 04 mar. 2025.
ALTO RIO DOCE. Site
Prefeitura Municipal. Disponível em: https://www.altoriodoce.mg.gov.br/portal/servicos/1011/simbolos-oficiais/ Acessado
em: 04 mar. 2025.
Créditos
Texto: Ulisses
Passarelli
Fotografias
(03/03/2025): Ulisses Passarelli (1 a 17) e Betânia Nascimento Resende (18 a 27).
Informantes locais: irmãos Márcio e Edmilson Teixeira Guimarães, sobrinhos de um dos fundadores, Zé Marcelo. Agradecemos a gentileza da atenção e informação.
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1- Brincante em uma alegoria de boi. |
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2- Diversidade de bonecos. |
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3- Boi mocho (sem chifres). |
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4- Burrinha. |
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5- Boneco representando Zé Marcelo, um dos fundadores. |
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6- Mais um boi. |
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7- Bonecos em ação durante o desfile. Aos fundos, o imponente prédio do Fórum. |
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8- Traje típico e riqueza de movimento. |
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9- Cortejo ganha as ruas, enchendo-as de alegria. |
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10- Bloco na rua une a contemplação do patrimônio material e imaterial. |
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11- Desfile diante do prédio escolar. |
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12- Detalhe de um boneco. |
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13- Boneca ornamentada com adereços carnavalescos. |
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14- Coreto ornamentado; banner tematizado no Bloco da Burrinha. O coreto funciona como base de sonorização. |
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15- As crianças iniciam na brincadeira. |
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16- Criança descansa sentada sobre um boi. |
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17- Placas de ornamentação carnavalesca na via pública, tematizadas no Bloco da Burrinha. Ao fundo, a Igreja Matriz de São José. |
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18- Boneca inspirada na "Rainha de Copas", personagem do conto "Alice no País das Maravilhas". |
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19- Boneca com adereço de cabeça que lembra uma "Melindrosa". |
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20- Bonecos ao lado da Igreja Matriz. |
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21- Detalhe da banda. |
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22- Bateria e Igreja Matriz. |
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23- Cores vivas são onipresentes. |
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24- Folião com camiseta alusiva ao nome do bloco. |
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26- Ornamentação da Praça do Rosário. |
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27- Outro aspecto da ornamentação. |
Precioso registro. Parabéns. Luiz Cruz
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