A Cruz da Cristina é uma estrutura religiosa estabelecida à margem da estrada municipal não pavimentada, que interliga a cidade de São João del-Rei até a extinta Estação Ferroviária de Mestre Ventura (EFOM). Oficialmente é chamada Estrada Alcides Aquiles dos Santos, mas nos meios populares é chamada de “Estrada da Trindade”, por atravessar este povoado, em plena área de tombamento do Complexo Serra do Lenheiro. Também passa pelos povoados do Mumberra, Brumado de Cima, a sede do distrito de São Gonçalo do Amarante, a Pedra Ramalhuda e por fim na área da referida estação, à margem esquerda do Rio das Mortes, aliás, já demolida há vários anos.
Tal estrutura, a Cruz da Cristina, é
composta atualmente por uma cruz chantada no solo, uma gruta artificial
dedicada a Nossa Senhora Aparecida, ambas contidas num pequeno adro cercado e
de piso em concreto magro. Na pesquisa, não foi encontrada fonte escrita que relatasse
sua origem. É na memória popular que foram localizadas as únicas
informações.
Esta estrutura
atende aos aspectos da religiosidade popular, pautada na informalidade e em seu
aspecto atual foi um trabalho de construção dirigido pelo congadeiro local, Sr. Geraldo Rosário
de Oliveira, natural de São Gonçalo do Amarante. Narrou o mesmo que
seu avô paterno, Américo Oliveira, nascido em 1890, quando tinha 11 anos ainda
se lembrava de ter visto em São Gonçalo do Amarante uma andarilha, mulher
branca, de cabelos longos, talvez uma pessoa especial, da qual nada se sabia,
se não que era conhecida por “Cristina”, sem notícia de sobrenome, família ou
de onde tinha vindo ou por qual razão estava ali. Aparentava ser de meia-idade,
entre 40 e 50 anos. Foi então, que numa noite de intensa tempestade por volta de 1901,
estando ela andando na estrada, caiu morta, não se sabe exatamente a causa, se passou mal com o frio, se foi atingida por um raio ou se faleceu de outra causa. Localizado seu
corpo, o mesmo foi recolhido em um cobertor e trazida ao distrito, como quem se
fosse carregada numa rede de dormir. Rezaram por ela e foi sepultada no
cemitério local, que à época, ainda era na frente à igreja, como uma extensão
de seu adro. O cemitério mudou de local em, 1946 e muitos corpos foram exumados
e levados para lá, mas não todos, de modo que não se tem certeza se o dela foi
ou não transladado. As informações foram transmitidas ao informante através de
seu avô e de seu pai (nascido em 1925) e
são repetidas parcialmente por outras fontes orais.
O local exato de sua
morte tem algumas controvérsias, dizendo alguns ser o local exato onde está a
cruz, que era marcado pela existência de uma árvore grande, já inexistente, e
outros no interior da grande voçoroca que tem atrás dela, onde Cristina teria
caído. A piedade popular logo cuidou de erigir uma cruz no local, que ganhou o
nome de Cruz da Cristina. Segundo Geraldo Rosário de Oliveira esta cruz, que
durou muito anos era de madeira forte, tinha aspecto rústico, pois fora lavrada
a machado. Não obstante, com o tempo a podridão a acometeu, e por fim, uma
queimada que atingiu a pastagem local a destruiu.
Uma segunda cruz, nova, também de madeira, a substituiu no mesmo local. Esta era feita de madeira aparelhada em maquinário, sem pintura e tinha afixada ao centro uma plaqueta escrita apenas com o nome Cristina (fotografia 1). Mas sendo de estrutura mais delgada, teve menor duração e terminou da mesma forma.
Veio então uma terceira cruz de madeira, que permanece nos dias atuais. Em torno desta é que Geraldo Rosário de Oliveira liderou o movimento de estruturação com gruta e adro, tal como está hoje.
Sobre o alcance de graças, relatou que o dono do terreno, em prece na
intenção de conseguir comprar um carro, quando conseguiu, ao verificar o
documento para transferência, observou que a propriedade do mesmo era de uma
mulher chamada Cristina, coincidência que a crença popular atribui a uma
intervenção da alma da andarilha. Um outro senhor, precisava vender um terreno
e não estava conseguindo; rezou para ela e logo negociou as terras. Dentre
outros casos. Acredita que sendo ela andarilha e portadora de algum problema
neurológico tinha pureza, no sentido de iluminada, o que sugestiona a
possibilidade de intercessão pelos devotos.
Além dele, mais uma
fonte oral (Lelê) informou que no dia
de Nossa Senhora Aparecida (12 de outubro), a comunidade se reúne na Cruz da
Cristina para rezar um terço na intenção dela. No entanto, ao longo do ano
todo, pessoas visitam o local e cada um por si faz suas orações.
Ainda outra fonte
relatou com satisfação ser um local sagrado, onde as pessoas param a fim de
rezar individualmente “é um lugar sagrado,
que todo mundo respeita graças a Deus!” (José Afonso).
Edevaldo de Paula, outro informante natural de São Gonçalo do Amarante, também congadeiro, confirmou que Cristina era uma andarilha e complementou: “como vários que apareciam no Caburu. Zé do Bichinho, a Naná Doida. O Zé do Bichinho andava com um saco e comprava as coisas na venda com folha de café. A Cristina foi achada morta depois de uma noite de tempestade”, afirmou.
Onde a Cruz está instalada o terreno
relativamente ao derredor tem pequena inclinação. É coberto por pastagens
naturais, com algumas árvores e arbustos típicos de cerrado e com ilhas mais
vegetadas (capoeira ou capão). Na paisagem se destaca na linha do horizonte a
presença marcante da Serra do Lenheiro, compondo o cenário. A declividade por
detrás da Cruz da Cristina termina em uma grande voçoroca, que em tese, no caso
de se expandir, pode futuramente ameaçar o bem.
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Cruz da Cristina: vista geral e detalhe da cruz e da pequena gruta de pedras. São Gonçalo do Amarante (São João del-Rei/MG). |