Bem vindo!
Bem vindo!Esta página foi criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas, tampouco acadêmicas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.
ULISSES PASSARELLI
Outros trabalhos
quinta-feira, 31 de outubro de 2013
Três Marias
terça-feira, 29 de outubro de 2013
Folclore dos Pássaros
Garrincha sobre um mandacaru em São João del-Rei. |
Gavião-acauã, Serra de São José, Santa Cruz de Minas / MG. |
Outro que chama chuva é o joão-bobo (galbuliformes, bucconidae, Nystalus chacuru), teimosamente pousado nos galhos do cerrado, segundo perspicaz observação dos boiadeiros. Seu canto é considerado infalível. Ao menos anuncia uma mudança rápida do tempo.
Saracura se banhando no Ribeirão da Água Limpa, Bairro Matosinhos, São João del-Rei. |
Saracura na margem do Rio das Mortes, São João del-Rei. |
Urubus aninhados na Serra de São José, Santa Cruz de Minas/MG. |
Alma de gato. Glória (Ritápolis/MG). |
Alma-de-Gato - Ave da espécie Piaya cayana, conhecida desde o México até a Argentina. Na área Amazônica há outras duas espécies congêneres. Também chamada rabo-de-palha, chincoã, tincoã e coã. De hábitos esquivos, raramente é vista. Trai a sua presença pelo vôo de uma árvore à outra, balançando a longa cauda, piando matraqueado. Tem fama de ser debochada, seja por imitar outras aves seja por se esconder muito bem. O nome vem do gosto em assaltar ninhos de outros pássaros, comendo os filhotes, como um felino. Seu ninho é muitíssimo escondido, de tal sorte que a ornitologia pouco lhe conhece dos hábitos reprodutivos. O povo logo esclarece o mistério: o ninho é tão escondido porque entre os ovos há uma pedrinha de ouro, que deve guardar a todo custo. No Nordeste origina crenças agoureiras com sua presença e canto. No boi-calemba (= bumba-meu-boi) do Rio Grande do Norte, motivou uma cantiga com refrão e quatro quadras, na série dos “bailes de sala”, entoados para entrar na casa do anfitrião (Baile da Coã). .
domingo, 27 de outubro de 2013
Na minha terra se fala assim - parte 1
Não se planeja o estudo das origens de cada palavra ou expressão. É tão somente uma mera listagem, com a explicação do significado local. Coletânea. Como a lista é vastíssima, será exposta dividida em partes (volumes), excluídos os provérbios (ditados), tema para outra série de postagens.
quinta-feira, 24 de outubro de 2013
Crispim & Crispiniano
“suas cabeças foram levadas para a Igreja de São Lourenço, em Roma, enquanto os seus corpos teriam permanecido em Soissons, onde mais tarde, pelo século VI, lhes foi erguida pelos sapateiros, uma igreja. Igual irmandade, em 1560-1572, lhes construiu também uma igreja em Lisboa”. (...) Sua ligação com os sapateiros é, segundo consta, porque, para não sobrecarregarem os fiéis com a despesa de sua alimentação, trabalhavam durante as horas vagas, como sapateiros. (...) Atribui-se a um possível milagre destes santos o tradicional costume de se colocarem na chaminé, em vésperas de Natal, os sapatinhos das crianças para receberem presentes. O costume surgiu quando, numa véspera de Natal, eles, perseguidos por bárbaros, se refugiaram num casebre rural, onde vivia uma pobre viúva com duas crianças, descalças, porque até seus tamanquinhos haviam sido utilizados para acender o fogão para preparar-lhes uma humilde refeição, inclusive com a pouca matula que eles mesmo traziam consigo. De madrugada, antes que a viúva se levantasse, eles já haviam tomado estrada. Quando a mulher se levantou e se aproximou da chaminé (...) ficou maravilhada ao ver ali dois pares de sapatinhos que os dois irmãos santos, durante a noite fizeram para as crianças. E mais, os sapatinhos estavam cheios de moedas de ouro."
"faziam da sua banca de trabalho uma cátedra evangélica, e com tal persuasão pregavam, que, duarnte quarenta anos de apostolado amável e insinuante, fizeram toda aquela gente desertar os templos pagãos, deitar por terra os ídolos, convertendo-se à adoração do verdadeiro Deus toda a cidade e redondeza." (p.195)
Uma outra notícia desta festa é oferecida por outro jornal desta cidade, A Tribuna, n.692, de 25/10/1925:
Agora, são os sapateiros que vão homenagear o seu padroeiro, estando programmatizados para hoje, consagrado a S.Crispim e S.Crispiniano, diversos actos religiosos, que serão encerrados com uma luzente procissão e um solemne "Te Deum Laudamus".
A adoção de um patrono para uma classe profissional é um costume enraizado na Idade Média, das corporações de ofício com seus mestres, aprendizes e um santo patrono. A mesma nota supra, por exemplo, dá conta que no dia 16 daquele mês e ano os alfaiates da cidade haviam promovido os festejos de São Geraldo, "protetor da laboriosa classe." (*)
A festa dos gêmeos não é mais realizada. Aliás, já quase não há sapateiros.
Sua oração consta no tradicional livro de preces espiritualistas “Cruz de Caravaca da Capa Preta” e pede pelas tantas... “união, concórdia e confiança”, graça que teriam alcançado pela intercessão da Virgem Maria.
CINTRA, Sebastião de Oliveira. Efemérides de São João del-Rei. 2.ed. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1982. 2v.
REZENDE, José Severiano de. O meu flos sactorum. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1971. 258p.
* A ofício de alfaiate tem menção muito antiga em São João del-Rei. Sebastião Cintra informa uma licença concedida pela Câmara em 26 de março de 1719 a Manoel André, "para abrir sua loja e para exercer seu ofício de alfaiate."
** Texto: Ulisses Passarelli
quarta-feira, 23 de outubro de 2013
Mês do Rosário - parte 2
Os tríduos ou as novenas, preparam o espírito dos devotos católicos para o dia maior da comunhão com o sagrado, festivo e respeitoso como deve ser, alegre e cultural no seu fluir. Para as missas e procissões surgem os fiéis, que engalanam as vias públicas para os préstitos. O congadeiro, herdeiro do africano, mostra sua força, canta sua luta. Cruza rosários no peito, pendura-os ao pescoço, enrola-os na cintura, pende-os do alto do mastro, balança-os nas bandeiras, traz um terço no bolso, outro preso no pulso direito; mais um no tamborim e no bastão de comando. O coração transborda rosários. Não tem onde carregar mais rosários. E como seu coração derrama essa fé, a canta e recanta, proclama o nome da Virgem Maria; assume-a como Mãe, plenamente, e de forma briosa torna pública sua crença. Sua vida muitas vezes é um doloroso mistério de dificuldades cotidianas, que se abrandam na dança, como o escravo amainava sua dor nas raras ocasiões possíveis de cantoria e expressão da fé.
segunda-feira, 21 de outubro de 2013
A Condenação da Mãe de São Pedro
Esta narrativa se enquadra na categoria dos Contos Religiosos, segundo a classificação de CASCUDO, que transcreve uma versão mineira de Juiz de Fora, na qual a famigerada alma sobe suspensa numa folha de cebola, que rebenta precipitando-a no castigo infernal. Cita outras onde ocorre o tema, em contos açorianos, italianos, franceses, da Córsega e até dos Irmãos Grimm.
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São Miguel Arcanjo, o Condutor das Almas.
Imagem da Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar, São João del-Rei/MG.
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Quebrar o galho: fazer uma favor, em geral inconveniente
Dar com a língua nos dentes: revelar um segredo
Créditos
* Informante: Joaquim Maia Filho, 14/03/2000, São João del-Rei/MG.
**Texto e foto: Ulisses Passarelli
sexta-feira, 18 de outubro de 2013
A Batina do Padre tem Dendê...
O canto congadeiro difundido nesta região alude à concepção geral do mistério (daí a palavra africana "dendê") que envolve o sacerdote, identificado no seu paramento típico e sagrado. Muitas vezes o padre sem a batina é tido como "sem força", posto que despido da sua veste sagrada. Dizia-me um senhor em São João del-Rei que os padres de hoje não tem a força dos antigos porque andam pelas ruas em trajes comuns, sem batina.
Em conformidade ao seu comportamento quando encarnado, fidelidade à ordenação sacerdotal, benevolência, retidão de conduta, carisma, dons, caridade e firmeza de ações, o padre goza em vida de um respeito imenso dos fiéis, que o tem como um orientador espiritual, conselheiro, chefe religioso. A alguns se atribui um valor excepcional da eficácia das preces e do poder das palavras. Uma crendice arraigada por exemplo é da "praga de padre", considerada a pior de todas pois não há quem a expurgue e ainda mais, pode ganhar força cármica, digamos assim, passando para as gerações subsequentes daquela família. Então se acredita no campo do folclore que se um padre amaldiçoar alguém, a má sorte o acompanhará doravante. A maldição pode gerar uma limitação física que acompanhará os descendentes da vítima, de forma congênita.
Sobre este aspecto negativo do comportamento de algum padre é corrente entre algumas pessoas que, se quando encarnado, um padre tiver sido ruim poderá virar depois de morrer um exu no mundo espiritual. Mas por outro lado os excepcionalmente bons podem depois de mortos se tornarem como entidades ou no mínimo operarem a intermediação de graças, tal como os santos, mesmo que oficialmente não sejam reconhecidos.
Este aspecto positivo é o preponderante na cultura popular. Eis uma notícia jornalística a respeito, coligida em São João del-Rei: “por uma graça alcançada pela alma de Frei Orlando, fará celebrar dia 28 do corrente, ás 6 horas, uma missa em ação de graças, na Igreja de S. Francisco. Iná.” (O Correio, nº2.054, 26/05/1946). Ora corre oficialmente o processo de beatificação desse frei. Mas em 1995, um pai de santo de São João del-Rei, já falecido, dizia-me que depois de dias de uma presença espiritual não identificada, enfim, numa sessão a cerca de meio século, se manifestou num jovem médium um espírito dizendo-se Frei Orlando e clamava ajuda pois sofria do outro lado por dever uma missa às almas, ou seja, foi feito o pedido e dado o valor do costume, mas a missa não foi celebrada. Uma vez que o pai de santo fez conforme seu pedido aquele espírito teve paz de seguir seu progresso espiritual e não se manifestou mais.
Em Nazareno, do túmulo do ‘Padre Heitor’, diz-se que pessoas de muita pureza e fé conseguem extrair um bálsamo miraculoso, espécie de gotas oleosas que conservam num recipiente de vidro para pingar na água de beber ou passar numa ferida.
Da mesma forma em São Miguel do Cajuru, na sepultura do Padre Afonso Miguel de Andrade. A tradição oral naquele distrito são-joanense é muito forte sobre este padre, correndo várias narrativas sobre o poder de suas preces.
Um anúncio dos classificados da Gazeta de São João del-Rei, nº648, 29/01/2011, em forma de corrente, rogava a “Frei Silvério” a graça de ter o amado para sempre _ “paixão eterna, amor infinito” _ diz expressamente.
Em São João del-Rei o túmulo do Cônego Osvaldo Lustosa, nas Mercês, é dos mais visitados da cidade, onde, segundo observação do ano 2000, se encontram muitas velas acesas, preces manuscritas em folhas extraídas de cadernos e oferendas de flores. Acreditam que seja um taumaturgo.
É corrente também uma grande devoção popular à alma de Padre Vítor (do sul de Minas Gerais, mas que se irradiam até aqui nas Vertentes) e nalguns terreiros clamam curas a Frei Rogério.
Em outras regiões do país também existem tradições populares religiosas em torno de certos padres, como se poderia citar os casos do Padre José Maria em Natal/RN e em todo o Nordeste, do Padre Cícero Romão Batista e do Frei Damião. Em Belo Horizonte o nome de relevo é Padre Eustáquio, que se irradia até aqui. A título de exemplo (não é um caso isolado), segue fotografia um velho caderno de orações (esquerda), de São João del-Rei, manuscritas e coladas, com um exemplar em destaque (direita) da prece a Padre Eustáquio datada de 1956.
Repassando a vista sobre estes relatos da religiosidade rememoramos a mensagem bíblica: "Terás, pois, o sacerdote por santo, porque ele oferece o pão de teu Deus" (Levítico, capítulo 21, versículo 8).
* Texto e foto: Ulisses Passarelli