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Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Mês do Rosário - parte 2

Outubro se aproxima do poente, mas a força dos festejos do rosário, que o nominam e dominam não arrefeceu. Em verdade, aqui no território das Vertentes, durante longo período do segundo semestre vertem as tradições congadeiras do rosário de Maria. Cantos e prantos ecoam sob o balançar de bandeiras floridas onde se estampa uma fé inabalável.
Os tríduos ou as novenas, preparam o espírito dos devotos católicos para o dia maior da comunhão com o sagrado, festivo e respeitoso como deve ser, alegre e cultural no seu fluir. Para as missas e procissões surgem os fiéis, que engalanam as vias públicas para os préstitos. O congadeiro, herdeiro do africano, mostra sua força, canta sua luta. Cruza rosários no peito, pendura-os ao pescoço, enrola-os na cintura, pende-os do alto do mastro, balança-os nas bandeiras, traz um terço no bolso, outro preso no pulso direito; mais um no tamborim e no bastão de comando. O coração transborda rosários. Não tem onde carregar mais rosários. E como seu coração derrama essa fé, a canta e recanta, proclama o nome da Virgem Maria; assume-a como Mãe, plenamente, e de forma briosa torna pública sua crença. Sua vida muitas vezes é um doloroso mistério de dificuldades cotidianas, que se abrandam na dança, como o escravo amainava sua dor nas raras ocasiões possíveis de cantoria e expressão da fé.

Moçambiqueiros de Passa Tempo.
Foto: Ulisses Passarelli, 20/10/2013. 

Ainda somos barrocos. A pujança festiva move e comove o mineiro. A festa irmana e redireciona.
Alguns festejos fazem exceção no adiantamento, por particularidades de sua comunidade de origem, como a festa de Piedade do Rio Grande (maio) e a de Ibituruna (junho); outras, estão a meio caminho, como a de Nazareno e a do Bairro São Geraldo, em São João del-Rei, esta, que em data instável tem experimentado ao longo dos anos algumas variações entre outubro e agosto, mas neste ano em especial veio para julho.
Porém, é a partir de meados de setembro que os tambores realmente se aquecem em louvor a Nossa Senhora, numa sequência de finais de semana que dura cerca de dois meses, nos quais os grupos se congraçam, compartilhando encontros nos largos festivos, cantorias nas capelas, danças nas procissões, músicas nos ruidosos salões de almoço, cores bailarinas nas velhas ruas de mineiríssimas cidades e povoações.
A parceria dos congados faz com que uns participem do festejo do outro, para que possam ser retribuídos no seu próprio, produzindo um evento mais rico não só no volume de participantes mas sobretudo no espírito de irmandade. Mas não se engane o olho superficial. Existem algumas tensões entre os grupos, que se podem dizer históricas, ou quiçá culturais, que, contudo, não ultrapassam a união pela causa comum e nem dispensam a praxe respeitosa e amistosa do encontro de suas bandeiras em plena via pública, configurado num ritual próprio.
Assim é que uma longa agenda vai se traçando a partir dos povoados da Restinga e do Ramos, nos dois últimos domingos de setembro e vara outubro adentro, passando então pela cidade de Ritápolis e pela Terra de Nhá Chica (Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno), distrito de São João del-Rei, onde o antiquíssimo congo louvou este ano a Maria em luto pela passagem do grande líder Dezinho; no mesmo dia aconteceu também a Festa do Rosário em Bom Sucesso, congregando grupos dos Campos das Vertentes e centro-oeste do estado, área intermediária e de transição cultural que é, tal como Ijaci, nas portas do sul mineiro, com festas em Nova Pedra Negra.
No segundo domingo de outubro foi a vez de outro colonial distrito são-joanense, São Gonçalo do Amarante, com o centenário congo e a jovial guarda Azul e Branco, além de congados visitantes da cidade; também correram festejos em Santa Cruz de Minas e Conceição da Barra de Minas.

Procissão do Rosário em São Gonçalo do Amarante. 
Foto: Iago C.S. Passarelli, 13/10/2013.

No terceiro final de semana, um dia calorento, confluíram os fiéis do rosário para Passa Tempo, onde os festejos tem um vigor especial e digno de nota por ser também uma área de transição cultural, embora oficialmente fora dos Campos das Vertentes, mas sob sua influência imediata. Aconteceu também na vizinha Coronel Xavier Chaves, na pitoresca igrejinha de pedra, onde um ícone da tradição local, “Zé Carreiro”, dá provas cabais que é um mestre no ofício de louvar ao rosário pela arte congadeira. Caquende também, na beira das águas represadas do extremo sudoeste de São João del-Rei, com o 6º Encontro de Cultura Popular, reuniu vários grupos folclóricos e lá estiveram os congadeiros, pertinazes em cantar o nome mariano.
Aproxima-se o último domingo do mês. A irmã colonial do Ciclo da Mineração, Prados, prepara-se para mais uma festa na poética igrejinha daquela urbe, a meia-encosta do vale que trabalha tão bem o artesanato no couro e na madeira. No mesmo dia os festejos correm no Ribeirão de Santo Antônio, distrito de Resende Costa. Enquanto isto, cá em São João del-Rei, na mais antiga igreja da cidade, Nossa Senhora do Rosário é lembrada barrocamente pelos devotos, sob os auspícios de sua Venerável Confraria, que cuida a mais de três séculos da veneração à sua gloriosa protetora. A característica festiva é pautada na tradição litúrgica, sem a presença dos congados.

Rainha e Rei na Procissão do Rosário em São João del-Rei. 
Foto: Ulisses Passarelli, out.1999.

Mas o fim de outubro não representa o fim dos festejos, pois falta ainda a tão concorrida festa de Resende Costa, a Cidade dos Teares, que na altitude de seus lajedos tem uma das maiores festas regionais do Rosário, sempre no primeiro domingo de novembro, congregando um grande número de congados .
O segundo domingo de novembro é a vez do povoado da Canela, na zona rural de São João del-Rei, com uma festa animada unicamente pelo congo do Rio das Mortes, como uma peculiaridade já bem fixada na tradição local. E coincidindo datas, Jacarandira, distrito de Resende Costa. 
Só então se ponto-finalizarão os tambores neste ano. Pelo menos os congadeiros... porque, enquanto estes relaxam seus cordéis e tarraxas de afinação, esticam-se os das pequenas caixas das folias de Reis cujos mestres por essas alturas já se organizam para os festejos do Natal. 

* Texto: Ulisses Passarelli

2 comentários:

  1. Moço! Parabéns, vou ficar fã do seu blog, grande abraço!!

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    1. Seja bem vindo! Com gratidão convido-o a acompanhar as postagens. Visite também meu outro blog, Matosinhos: história & festas.
      Abç.

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