Várias localidades das Vertentes surgiram da mineração do ouro ou a vivenciaram durante um período de sua história. O ciclo do ouro deixou fortes impressões na cultura popular (*). Ainda hoje, passados tantos anos, correm na boca do povo estórias alusivas àquela atividade econômica que foi muitas vezes o embrião de um núcleo urbano. O ouro é parte importante de nosso folclore.
Contam (**), por exemplo, que o ouro de São João del-Rei foi descoberto nos arredores da atual Igreja do Carmo por três rapazes que localizaram um veio enorme. Começaram a extração às escondidas mas tiveram de parar por causa da grande quantidade de água subterrânea. A Igreja do Carmo teria sido construída bem em cima das principais "panelas" de ouro descoberta pelos três rapazes. Corre também a narrativa que esse famoso veio começaria na bêta do Tanque aos fundos do Barracão da Prefeitura, e como um túnel, passaria por baixo da Rua Marcondes Neves, da Rua Gomes Pedroso e da Praça Augusto das Chagas Viegas ficando as principais galerias por baixo do templo carmelita, onde imensas riquezas ainda existiriam. Dizem que a mineração naquele ponto era tão intensa que demandava centenas de escravos. Um desmoronamento certa feita soterrou trezentos trabalhadores braçais e alguns feitores. Depois disto, a escavação parou e construíram a Igreja do Carmo em cima, marcando o local da tragédia.
A história contudo ensina que o ouro de São João del-Rei não foi descoberto nos arredores do Carmo, embora essa região da urbe também tenha sido escalavrada pelos almocafres, picões e alavancas. Os primeiros descobertos teriam se dado em 1704 no Alto das Mercês pelo português Manoel João de Barcelos e concomitantemente por Lourenço da Costa por detrás daquele morro, no Ribeirão São Francisco Xavier.
Outro conto (***) diz que certo homem comprou uma velha bêta, praticamente improdutiva. Seu objetivo era reativá-la e ficar rico. Tinha uma ganância desmedida. Como a produção fosse baixa, querendo enriquecer, fez um trato com o capeta prometendo-lhe em troca da riqueza a própria filha como pagamento.
Certo dia a mocinha estava caminhando quando por acidente escorregou e caiu na bêta pedregosa. Lá no fundo o rabudo (****) a possuiu, confirmando assim o pacto. Correram para resgatá-la e de forma impressionante foi retirada de lá sem nenhuma lesão, algo inexplicável, pois qualquer um que ali caísse morreria sem dúvidas.
Naquele mesmo dia acharam grandes pepitas de ouro e também nos dias consecutivos se achava do nobre metal em abundância. Lavraram o veio rochoso, como muito sucesso para riqueza do proprietário.
Mas assim como o dono da bêta enriqueceu de repente, dado um prazo começou o infortúnio. O ouro sumiu da mina, nada se achava e o que tinha guardado foi perdido em gastos sucessivos e rápidos, até a miséria absoluta. O rico minerador terminou seus dias como um mendigo.
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Serra do Lenheiro no Alto das Mercês, São João del-Rei, 12/08/2013: vestígios de mineração - à esquerda um mundéu; à direita, escavações e cascalheiras. |
Notas e Créditos
* A exemplo desta afirmação, leia também neste blog:
OURO: UM CICLO CULTURAL
** Informante: Sr. Aluísio dos Santos, 05/01/1994, São João del-Rei
*** Informante: Sr. Luís Santana, 19/01/1994, São João del-Rei
**** Rabudo: um dos muitos sinônimos do demônio... tinhoso, cão, bruto, capiroto, pemba.
***** Texto e fotografia: Ulisses Passarelli
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