Dois de fevereiro. Hoje é dia de Nossa Senhora das Candeias, uma invocação pouco difundida em relação a outras expressões marianas.
Informações indicam para uma origem espanhola, especificamente em Tenerife, nas Ilhas Canárias, no século XV, donde se difundiu para Portugal. A América recebeu e fixou esta devoção.
A origem do título se prende ao preceito judaico da purificação da mulher após o parto. Quando a Virgem Maria, quarenta dias depois de dar à luz a Jesus Cristo, apresentou-se ao Templo em Jerusalém e ofertou seus sacrifícios diante do sumo-sacerdote Simeão, este profetizou as glórias do Menino e as dores de angústia que Nossa Senhora enfrentaria (Lc. 2, 22-35).
Como o Messias foi então profetizado como a luz do mundo, surgiu a crença na iluminação, simbolizada neste dia, daí o nome do título mariano: candeia é um tipo rústico de objeto para iluminar, espécie de lampião. Considera-se em sinonímia outros títulos correlatos: Nossa Senhora da Luz, Nossa Senhora da Candelária, Nossa Senhora da Purificação e Nossa Senhora da Apresentação.
Era costume outrora marcar este dia como a data limite do ciclo festivo do Natal. Por isto a cultura caipira aceitava a folia de Reis e o presépio até esse tempo, segundo revelaram os estudos de Alceu Maynard Araújo.
Pode-se a grosso modo dizer que na região das Vertentes as tradições acerca do festejo deste dia estão em ocaso.
Notícias orais da região de Antônio Carlos e Bias Fortes, no limite cultural entre os Campos das Vertentes e a Zona da Mata de Minas Gerais, dão conta de que nos povoados rurais faziam procissões
luminosas neste dia, passando pelas estradas rurais. Os sitiantes procuravam
vestir-se de branco (sinal de pureza) e levar velas acesas. Luminárias de barro (tigelinhas com
combustível e pavio) ficavam acesas sobre os batentes das janelas, evocando as ordens coloniais de iluminação por ocasião das grandes festas do reino.
Caminho afora,
pelos mourões e porteiras amarravam luminárias feitas de um gomo de bambu
fechado nos extremos pelo próprio nó, onde, por um furo, era introduzido o azeite de mamona como combustível e a mecha
de pavio para queimá-lo. Na região em questão são conhecidas por cambonas e em São João del-Rei, tuchos.
Adiante da humilde procissão de roça seguia como abre-alas a
bandeira com a efígie da santa ou a sua imagem numa charola enfeitada de papel colorido picotado e colado em sua estrutura e flores dos jardins dos lavradores. Ao longo do trajeto os devotos iam rezando um terço, cuja jaculatória, repetida a cada mistério, era a seguinte: “Valei-me Senhora das Candeia, que o sole (sol) abranda e a lua alumeia!” Na chegada
da procissão armas de fogo davam salvas de tiro para o alto.
Em São João del-Rei ainda há quem tenha o costume de levar velas à missa neste dia. Alguns pedem aos padres para benzê-las. As velas do dia de Nossa Senhora das Candeias são guardadas para o ano todo, para serem acesas em situações especiais, pois como se fossem amuletos poderosos, banem os males físicos e espirituais, como fortes tempestades, doenças, tentações e iluminam a cabeceira de um moribundo cuja vida dá sinais de brevidade.
Nos terreiros de religiões de matriz africana, Nossa Senhora das Candeias é lembrada neste dia com toques festivos a Oxum e Iemanjá, orixás femininos das águas, com as quais se encontra sincretizada conforme a linha espiritual e região.
ARAÚJO, Alceu Maynard. Folclore Nacional. 2.ed. São Paulo: Melhoramentos, 1964. 3v.
BÍBLIA SAGRADA. Novo Testamento. Evangelho de São Lucas, capítulo 2, versículos 22 a 40.
Referência na Web
Informantes
- Elvira Andrade de Salles, 1996 (Bias Fortes)
- José Cândido de Salles, 1996 (Antônio Carlos)
- Rodrigo de Oliveira Lima, déc. 2000 (São João del-Rei)
- Otávio Félix Pereira da Silveira, déc. 2000 (São João del-Rei)
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