Bem vindo!

Bem vindo!Esta página está sendo criada para retransmitir as muitas informações que ao longo de anos de pesquisas coletei nesta Mesorregião Campo da Vertentes, do centro-sul mineiro, sobretudo na Microrregião de São João del-Rei, minha terra natal, um polo cultural. A cultura popular será o guia deste blog, que não tem finalidades político-partidárias nem lucrativas. Eventualmente temas da história, ecologia e ferrovias serão abordados. Espero que seu conteúdo possa ser útil como documentário das tradições a quantos queiram beber desta fonte e sirva de homenagem e reconhecimento aos nossos mestres do saber, que com grande esforço conservam seus grupos folclóricos, parte significativa de nosso patrimônio imaterial. No rodapé da página inseri link's muito importantes cuja leitura recomendo como essencial: a SALVAGUARDA DO FOLCLORE (da Unesco) e a CARTA DO FOLCLORE BRASILEIRO (da Comissão Nacional de Folclore). Este dois documentos são relevantes orientadores da folclorística. O material de textos, fotos e áudio-visuais que compõe este blog pertencem ao meu acervo, salvo indicação contrária. Ao utilizá-lo para pesquisas, favor respeitar as fontes autorais.


ULISSES PASSARELLI




segunda-feira, 9 de setembro de 2024

Boi do Rosário

Breve descrição do impressionante cortejo oliveirense  

Ulisses Passarelli

Na cidade de Oliveira, com pouco mais de 40.000 habitantes, que encabeça uma das microrregiões do Oeste de Minas Gerais, já fora do Campo das Vertentes, mas na vizinhança imediata, compartilhando elementos culturais mutuamente, a Festa do Rosário é um marco notório da fé popular e das tradições folclóricas de base histórica afro-brasileira. 

Tais festas são muito arraigadas no Estado e na zona oeste alcançam muita popularidade, mas em Oliveira ganham uma relevância pela extensão (levantamento de mastros um mês antes dos festejos) e a festa propriamente dita mobiliza uma semana completa de reinados, capazes de mobilizar os congados da terra, entre vários moçambiques e catupés e um vilão, ao todo, algo em torno de uma quinzena de grupos culturais (guardas ou ternos). Poucos são os grupos visitantes, entretanto, a grande quantidade de guardas locais já faz uma festa de elevada qualidade. É tudo cuidadosamente pensado e cuidado: coreografias, ritmos, uniformes, cantos, fardamento, identidade cultural. O reinado tem sua passagem de forma marcante. Os coroados com toda postura e respeito, vem munidos de fato de muita legitimidade para os papéis sagrados, com trajes primorosos, zelo com penteados e adereços, marchando com postura majestática sob as umbrelas. 

Mas nesta postagem o foco recairá sobre o Boi do Rosário. Sob o olhar da folclorística pode-se qualificar esta manifestação cultural como uma forma do bumba-meu-boi, sob o viés de um rancho, sem entrecho dramático evidente, mas obedecendo a uma ritualística sólida. A multidão acompanhante se ocupa muito mais do entretenimento de atiçar o boi e fugir de suas investidas. Mas a equipe organizadora faz o boi cumprir um rito, a rigor. Apesar do aparente caos tudo é muito bem organizado. 

Das informações coligidas in loco o Boi objetiva de forma primária abrir os caminhos da Festa do Rosário. É como se o cortejo gigante fizesse uma abertura espiritual e energética das vias públicas para as passagens dos congados nos dias seguintes, tudo no campo simbólico e sob a égide da fé. Há forte vinculação entre o boi e o congado. Eles não saem juntos, mas estão interligados. A própria música do boi, de natureza percussiva, é marcada por tambores congadeiros (observamos a presença de sete caixas). O boi inicia e termina na Casa dos Congadeiros Geraldo e Conceição Bispo, no Bairro das Graças; muitos congadeiros aliás se envolvem com o cortejo do boi. 

No giro pelas ruas centrais o Boi do Rosário passa junto à Igreja Matriz Nossa Senhora de Oliveira e na lateral da praça, o boi saúda lentamente, com vênias e salamaleques, cada um dos cinco mastros (Rosário, Mercês, Senhora Aparecida, Santa Efigênia, São Benedito), sob guiamento do Candieiro (personagem que munido de uma vara de ferrão conduz o boi). Na porta da Igreja dos Passos o boi vem saudar a entrada da casa santa reverenciando as ombreiras da portada com movimentos da cabeça. Vimos o Boi do Rosário visitar no Alto de São Sebastião a casa do Rei Congo, onde o Carregador da Balaieira (o homem que vai dentro da armação do Boi), a Comissão Organizadora, os caixeiros, são recebidos com comes e bebes e o cortejo estaciona um pouco. Na sequência o boi desceu até a Casa Azul, sede do Moçambique Nossa Senhora das Mercês, da Capitã Pedrina, onde foram também recepcionados com toda gentileza e protocolo. 

Marcado para sair às 19h e 30 min, o Boi saiu quinze minutos depois, e só encerrou o giro pelas ruas meia noite e meia (zero horas e trinta minutos). Até o encerramento o movimento era frenético, os acompanhantes não esmoreceram o ânimo. Caixas zoando fortemente os couros, canto do povo a repetir com insistência o refrão tradicionalíssimo "Êh, boi!". E se o boi passa um tempo sem correr atrás do povo, se ele fica um prazo curto só no movimento de balanceio e passinhos curtos, logo o instigam: 

"E solta o Boi!

_ Êh, Boi!

E solta o Boi!

_ Êh, Boi!"

De repente o batido das caixas muda para um rufado e neste instante o boi dispara sobre o público, em correria, giros, pinotes, cabeçadas. Logo para e a percussão retoma o batido padrão e a marcha pelas ruas também, mas sempre neste momento, sob os apupos frenéticos dos acompanhantes. Muitos estendem as mãos acariciando seu focinho e testa, como se de fato fosse vivo, tivesse alma. Com a longa caminhada e o passar das horas os integrantes diminuem em quantidade. Mas os muitos que ficam não esfriam os ânimos. Chega a ser bastante difícil aproximar-se do boi para vê-lo em detalhes ou fotografá-lo. 

A chegada na Casa do Congadeiro marca o fim para os acompanhantes. A Comissão adentra, há cerimônia interna com preces, janta e bebidas num momento de confraternização. O boi só sai às ruas nesse dia, durante todo o ano, apenas uma vez. 

No interior de Minas Gerais há uma diversidade de grupos de bois. Um número acentuado deles floresceu no Ciclo do Carnaval, sob várias denominações. Oliveira mesmo também possui um, intitulado Boi da Paz. Outros mais surgem na quadra natalina, mormente no norte mineiro e Vale do Jequitinhonha, batizados Reis de Boi ou ainda Boi-janeiro. Em alguns lugares os Bois se desenvolveram conectados a festas locais. Nesta última categoria está o Boi do Rosário. Aliás, sob o nome de Boi do Rosário e igualmente vinculado aos congados, o rancho do boi também acontece na abertura da Festa do Rosário na vizinha cidade de Carmópolis de Minas, também no Centro-Oeste de Minas Gerais.

Não se sabe ou não se tem clareza da data de sua fundação em Oliveira, ou como iniciou. A tradição oral o dá como muito antigo. Encontramos em um canal de vídeos uma filmagem datada de 1991 na qual o Boi do Rosário aparece, cumprimentando uma Rainha Conga com o bater a cabeça sucessivamente no ombro direito dela, no esquerdo e direito de novo, da mesma maneira do cumprimento congadeiro e do cumprimento interno entre irmãos de terreiro. O boi aparece ainda com o rosário em volta do pescoço. Estes elementos deixam claro que tem um sentido sagrado, o que a aparência da multidão em polvorosa pode ocultar. No entanto, o grande volume de gente, se por um lado é relativamente tranquilo e revela um forte senso de pertencimento da comunidade à manifestação, por outro lado, eventualmente pode gerar alguns distúrbios. Vimos na grande ladeira de subida ao Alto de São Sebastião, o embrião de uma briga entre jovens, que felizmente não foi adiante, porque as próprias pessoas da comunidade separaram a contenda afirmando: "parem com isto! o Boi vai subir!" Ouvimos relato de que alguns indivíduos extrapolando a brincadeira, há alguns anos tentavam derrubar o boi ou ainda, batiam com força em sua carcaça, ou ainda surgiam inícios de brigas. Por esta razão o boi chegou a ficar dois anos sem sair e ainda, o itinerário no Alto foi encurtado, razão pela qual o boi já não chega mais tão tarde à Casa dos Congadeiros como antes (duas a duas e meia da madrugada). Ao mesmo tempo os organizadores tem trabalhado fortemente no aspecto da conscientização, repetindo o valor sagrado do Boi. Estas medidas para reduzir a profanização tem trazido o equilíbrio à prática cultural, minimizando os eventuais distúrbios. 

Uma nota jornalística local destacou: "O capitão mor  do estado maior, órgão da festa responsável pela organização dos reinados, Geraldo Bispo dos Santos Neto, disse que o Boi do Rosário tem grande importância espiritual e religiosa, para os congadeiros e, por isso, o desfile deve acontecer com respeito e admiração." (GAZETA DE MINAS, 2024)

Das mudanças mais substanciais verifica-se que a armação (balaieira) era de bambu ou madeira, hoje de ferros encurvados. Era apenas um homem que ia de baixo, em todo trajeto (e dizem que descalço!). Mas ora se revezam na função de cinco a seis rapazes. Havia também mais cantoria, desenvolvida sob o refrão "Êh, boi!", como se observa em vídeos antigos e também se refere Waldyr Bernardino (1987). Este autor mencionou que "há sob a armação uma pessoa muito simples que o leva desde o reinício da Festa do Rosário em Oliveira, em meados de 1953, 54, por aí", atribuindo este papel então a Geraldo Tertuliano da Silva ("Geraldo Brasilino"), que "também em Divinópolis, Carmo da Mata e Carmópolis já organizou Boi". Mas o Boi não foi criado por esse Geraldo, pois diz o autor "Geraldo lembra-se da festa desde os 8 anos de idade, quando corria e tinha medo do boi.". 

Por esta breve descrição se observa a significação emblemática do boi no cenário cultural oliveirense. Oliveira que é uma cidade culta, destaca na arte musical, reconhecida no animado carnaval, com destaque para a tradição dos mascarados ("Cainágua"); os casarões e mais casarios imponentes que rememoram o fausto de sua economia nos meados do século XIX, como entreposto comercial. Oliveira que surgiu em meados setecentistas junto ao fluxo ao longo da Picada de Goiás, à época movida pela força agropecuária, hoje encontra no serviço terciário o principal ponto de sua economia. 

Vídeo: Ulisses Passarelli, 07/09/2024








Fotos: Ulisses Passarelli e Betânia Nascimento Resende, 07/09/2024. 


REFERÊNCIAS:  

BERNARDINO, Waldyr. Boi de Congo. In: Gazeta de Minas, Oliveira, 31 out. 1987 

Boi do Rosário abre a Festa do Congado: evento afro-brasileiro é um dos mais tradicionais de Oliveira. In: Gazeta de Minas, Oliveira, 08 set. 2024


VÍDEOS:

Boi do Rosário, Oliveira, 2024. In: YouTube, @up72folk, 09 set. 2024. Disponível em: https://youtu.be/Jeg1ROsBo5Q 

O Boi de Oliveira. In: You Tube, Saberes Tradicionais, 20 nov. 2018. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=dqcsdF3GvMM 

Festa de Nossa Senhora do Rosário - 1991. In: YouTube, Sidney de Almeida, 18 mar. 2024. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=GexSDd60vEs


AGRADECIMENTOS: 

A Robert Henrique Silva e Isadora Queiroz Ribeiro Leite, pelo inestimável acolhimento e grande apoio à realização desta visita a Oliveira e concretização da postagem. 

Ao folclorista Affonso Furtado e ao historiador Filipe Calil Abrão, pela disponibilização das matérias jornalísticas, respectivamente de 1987 e 2024. 






terça-feira, 20 de agosto de 2024

Boi do Major: tradição do carnaval dorense

Na Mesorregião Campo das Vertentes, situada no centro sul do estado de Minas Gerais, na Microrregião de São João del-Rei situa-se o município de Dores de Campos, muito conhecido pela forte tradição ligada ao tropeirismo, o artesanato em couro e sobretudo pela arte da selaria, que o faz se destacar. Assim, com muita razão, o município de Dores de Campos foi reconhecido como Capital da Selaria e teve o ofício de seleiro registrado como patrimônio cultural imaterial (Lei Municipal nº 1.267, 03/10/2015). Além disto é Capital Estadual da Selaria (Lei nº22.951, 08/01/2018) e pleiteia a condição de Capital Nacional da Selaria, ainda não consolidada (Projeto de Lei Federal nº 9.820-A/2018). No texto desta última, consta informação que o número de selarias no município se aproxima de uma centena.

O histórico disponível na página do IBGE (cedido pela prefeitura local) informa que no início do século XIX:  

"Bernardo Francisco da Silva adquiriu terras em nossas plagas, visando exploração da indústria agropecuária e veio a ser o fundador do povoado. Seus filhos introduziram o trabalho industrial variando no lugar em formação, que cresceu, atraindo pessoas de fora que, não raro, se mesclam à família local."

O terreno em que se assenta a cidade de Dores de Campos era chamado Pasto do Corredor, de propriedade de José Justino da Silva, que o herdou de sue pai, Manoel Justino da Silva. Primitivamente as casas foram construídas à margem da estrada. Ocorreu o falecimento, em Maio de 1899, do Senhor José Justino da Silva, ficando sua viúva e herdeira, a senhora Domitildes Teixeira da Silva que fez doação de todo o terreno ainda vago à paróquia, que vende ou afora os lotes.

Nos seus primeiros tempos, a cidade de Dores de Campos chamou-se Povoado do Patusca, depois, com a construção da Capela de Nossa Senhora das Dores, hoje Igreja Matriz, e criação do distrito de Dores de Patusca, passou a ter este nome e, finalmente, tendo sido o distrito anexado ao Município de Prados, desmembrando-se de Tiradentes, a que pertencia, foi-lhe dado, bem como ao distrito, o nome atual de Dores de Campos. A dois quilômetros da estação de Prados, da Rede Mineira de Viação, existente uma tapera situada nas proximidades da confluência do Ribeirão do Patusca com o Rio das Mortes, bem perto da Ponte do Patusca na margem esquerda do Ribeirão. Esta tapera foi, pelos anos de 1830, uma fazenda de propriedade e residência de um português, rancheiro, que entretinha animado comércio com os inúmeros tropeiros que ali passavam, pois a sua fazenda ficava a margem de uma estrada de rodagem, ainda hoje existente e por onde então transitavam as tropas vindo de vários lugares dos atuais municípios de Prados, Oliveira, João Ribeiro, Lagoa Dourada, Rezende Costa, Tiradentes, etc. Este fazendeiro era o gênio folgazão, pelo que os tropeiros apelidaram de 'Patusca'. Essa, a origem dos nomes do Ribeirão do Patusca, o curso d'água que banhava a sua fazenda, e do Povoado de Patusca, a localidade que então formava daí a quatro quilômetros, na margem esquerda do referido Ribeirão e que hoje é Dores de Campos.

No ano de 1856, o antigo povoado achava-se em estado embrionário pois contava com apenas cinco casas. O primeiro morador foi Bernardo Francisco da Silva, fundador do lugar. Os outros quatro moradores foram seus filhos Francisco da Silva Sena, Antônio da Silva Sena, Manoel Justino da Silva e Luiz Joaquim da Silva. Havia ainda a casa de José Cajuru, nos fundos da de Bernardo Francisco, as famílias do Capitão Vicente Teixeira de Carvalho e de João Francisco."

Ainda segundo o IBGE a formação administrativa se baseia no Decreto n°41 (15/04/1890) que determinou o seu desmembramento do território tiradentino e incorporação ao pradense; e o Decreto-lei nº148 (17/12/1938), que conferiu a Dores de Campos a emancipação político-administrativa. 

Dores de Campos se destaca também pela forte tradição musical, representada por suas corporações registradas como patrimônio do município em 2011: Lira Nossa Senhora das Dores e Sociedade Musical São Sebastião (Prefeitura Municipal, Lista de Bens Protegidos).

Entre as festas religiosas, destaca-se principalmente a Semana Santa. Nossa Senhora das Dores é a padroeira e concentra grande devoção entre os católicos da cidade. Há também a festa de Nossa Senhora do Rosário, com participação do congado local, mais especificamente da tipologia "marujos", agregando também grupos visitantes de outros lugares. Na zona rural do município é tradicional a festa do padroeiro do distrito de São Sebastião das Campinas.

É muito típica a folia de Reis, na comunidade do Caxambu de Cima, com fama de centenária.

Além da comida mineira, comum à região, em Dores de Campos um biscoito assado é o carro-chefe das quitandas, afamado sob o nome de curruscuba, iguaria de seu patrimônio imaterial.

Dores de Campos tem um carnaval bastante animado, impulsionado por agremiações muito ativas, sendo igualmente um bem patrimonial reconhecido e protegido. Além de blocos e escolas de samba, um grupo cultural muito querido é o Boi do Major. Embora na prática se apresente na avenida central da cidade como um bloco é uma modalidade ainda que simplificada do tradicional folguedo do Bumba meu Boi, de ocorrência nacional, que localmente ganha este nome em homenagem ao saudoso Dácio Silva (1942-2009), músico e folião, alcunhado carinhosamente por "Major", trombonista lembrado atenciosamente pela grande dedicação às manifestações culturais ao longo de sua vida, às quais foi um dedicado organizador e incentivador.

Sobre ele, diz um trecho de matéria jornalística: "começou quando o Boi ainda era feito pelo senhor Doca Ferreira. Mas efetivamente ele começou a participar quando o senhor José Amâncio assumiu o Zé Pereira." (AGORA, 2005). Por esta transcrição se deduz que Major não criou o Boi, mas ingressou e depois abraçou a manifestação. Daí é interessante observar que mesmo após seu falecimento o folguedo permanece chamado Boi do Major, o que demonstra a vitalidade dos trabalhos impulsionados pelo sr. Dácio Silva e seus amigos, tornando-se icônico. Mas disso resulta uma indagação: antes do sr. Dácio, que nome o Boi teria? Diz a mesma fonte que "Major" introduziu no Boi outros personagens (girafa, mulinha e boneco Zé Maria) e que seu apelido foi dado na infância, pela semelhança física com um palhaço circense que usava o nome artístico de "Major", que fez sucesso na temporada de uma companhia de circo na cidade. Em tal matéria constam relatos sobre as dificuldades financeiras para conservação do Boi e pouco reconhecimento do poder público. Relatos da mesma ordem ressurgem em matérias veiculadas em 2017 no Portal Dores de Campos, citadas nas referências desta postagem. Tais recursos são usados para fazer reparos no boi, custear os músicos da banda e o pessoal de carregação do boi (ORGANIZADORES DO BOI DO MAJOR ESTÃO PEDINDO AJUDA AOS DORENSES, 2017). Com as ajudas arrecadadas, auxílio da Prefeitura Municipal e comércio local, o Boi foi então revitalizado (PARA A ALEGRIA DA CRIANÇADA DORENSE, O BOI DO MAJOR ESTÁ DE VOLTA, 2017).

Na ficha patrimonial dessa manifestação tem-se a informação que há mais de três décadas antes (anos 70) o grupo era formado por José Amâncio, que carregava um pequeno boi e Antônio Lima ("Tiro") que carregava um gorila. Foi quando o sr. Dácio Silva começou a participar com seu trombone e alguns percussionistas tocavam tarol e bumbo. Com a morte dos dois primeiros, Dácio Silva deu continuidade, ainda por bom tempo com o boi pequeno. Foi quando, certa vez, veio se apresentar na cidade o Boi Mofado, da vizinha cidade de Prados, que usa um boi grande, que fez sucesso. O então prefeito, Antônio Alves Moreira ("Totinho"), deu um boi grande ao Dácio, que também ganhou uma girafinha e uma mulinha, feitas pelo sr. Zé da Vila. O boi, por ser pesado, difícil de manusear, logo quebrou. Então, o artista plástico Tuta do Zé Lucas fez outro boi grande para Dácio, e em 2005 fez também uma girafa. O ano de 2005 foi também o do registro cartorial, com constituição sob a forma de associação civil. O inventário contém uma fotografia do bloco datada de 1965 (IPAC, 2011).

No desfile do Boi do Major que assistimos em 2024 não vimos a bandeira, bichos e bonecos mencionados na ficha de inventário. Havia apenas o boi e a banda acompanhante.

O Boi do Major replica no município a tradição regional do Bumba meu Boi, em grande parte já perdida em municípios próximos, conhecida sob outros nomes na região e por vezes com outras características (PASSARELLI, 2024): é tipicamente carnavalesco, constituído de um desfile de rua, bastante espontâneo, animado por uma banda de metais e percussão formada pelos músicos da cidade. Eles tocam marchinhas carnavalescas e saem à rua movimentando uma grande quantidade de pessoas da cidade e visitantes, sendo bastante característica a presença inclusive de famílias. É possível ver entre os foliões pessoas de todas as faixas etárias, desde avós com netinhos, casais, jovens e também turistas. O boi promove uma grande correria pelas ruas, brincando com as crianças de pega. Ele cerca e avança, recua, agita, mas não fere ninguém. É só alegria e brincadeira. A banda vem na retaguarda e a multidão de foliões adiante. O boi em correrias não tem lugar fixo, sempre instigado pelas crianças. A criançada, em grande parte fantasiada, fica em polvorosa e apronta grande correria e alarido, ora provocando ora fugindo do boi. Algumas crianças usam pequenas alegorias de boi, refletindo a popularidade do rancho carnavalesco. Como um carnaval de ambiente familiar, tudo transcorre com plena tranquilidade. De criancinhas a idosos, as diferentes gerações prestigiam e se esforçam por manter a tradição.

Uma peculiaridade interessante é que quando o dançante que está debaixo do boi para um instante para descansar, sai de baixo da alegoria do boi e vai tomar um fôlego, o boi fica parado no chão, deitado no asfalto. Então, as crianças cercam esse boi e brincam com ele: passam a mão, acariciam, riem, querem tirar fotos com o boi, intencionam subir sobre a alegoria. Isto demonstra um carinho especial por ele e então fica muito evidente em Dores de Campos o sentimento de identidade cultural envolvendo esta manifestação legítima da cultura popular.

Contemplar o Boi do Major é uma oportunidade de vislumbrar uma manifestação identitária com a cultura popular dorense, que nitidamente desperta um elevado senso de pertencimento nas pessoas participantes.






Cartaz para divulgação digital do carnaval de Dores de Campos, 
vendo-se no primeiro item a participação do Boi do Major (16/02). 


Agradecimentos:

pela prestimosa colaboração para a pesquisa que resultou nesta postagem agradeço a gentileza de Paula Maria Nascimento Moreira e ao historiador Wellington José Tibério Silva.

Vídeo:

Boi do Major, Dores de Campos, 2024. In: YouTube, 11 ag. 2024. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=yKftcFNsBlg


Sobre o folguedo do bumba-meu-boi nesta região ver:

O folguedo do boi no Campo das Vertentes. In: Tradições Populares das Vertentes, 11 mar. 2024. Disponível em: https://folclorevertentes.blogspot.com/2024/03/o-folguedo-do-boi-no-campo-das.html

A Festa de Ogum e o Boi de Ronda: breve relato. In: Tradições Populares das Vertentes, 07 maio 2024. Disponível em: https://folclorevertentes.blogspot.com/2024/05/a-festa-de-ogum-e-o-boi-de-ronda-um.html


Referências:

Bloco Carnavalesco o "Boi do Major". IPAC - Inventário de Patrimônio Cultural, 2011. Prefeitura Municipal de Dores de Campos.

Dores de Campos - histórico. IBGE Cidades. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/dores-de-campos/historico Acesso em: 14 ag. 2024.

Lista de bens protegidos. Prefeitura Municipal de Dores de Campos. Disponível em: https://www.doresdecampos.mg.gov.br/pagina/7763/Rela%C3%A7%C3%A3o%20dos%20Bens%20Protegidos Acesso em 14 ag. 2024

Major e sua turma: tradições que ainda resistem ao tempo. Jornal Agora, Dores de Campos, fev.2005, ano 2, n.4.

Organizadores do Boi do Major estão pedindo a ajuda dos dorenses. Portal Dores de Campos. fev. 2017.

https://portaldoresdecampos.com.br/organizadores-do-boi-do-major-estao-pedindo-a-ajuda-dos-dorenses/ Acesso em: 17 out. 2021.


Para a alegria da criançada dorense, o Boi do Major está de volta . Portal Dores de Campos. fev. 2017. Disponível em:

https://portaldoresdecampos.com.br/para-a-alegria-da-criancada-dorense-o-boi-do-major-esta-de-volta/ Acesso em: 17 out. 2021.


Legislações:

Lei Municipal nº1.267, 03/10/2015. Prefeitura Municipal de Dores de Campos.
Disponível em: https://www.doresdecampos.mg.gov.br/texto_lei/14012

Lei Estadual nº22.861, 08/01/2018. Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Disponível em: https://www.almg.gov.br/legislacao-mineira/texto/LEI/22861/2018/ Acesso em 14 ag. 2024.

Projeto de Lei Federal nº 9.820-A/2018. Portal da Câmara dos Deputados.
Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1687717

Créditos:

Fotos: Iago C.S. Passarelli, 08/02/2024
Texto: Ulisses Passarelli

quarta-feira, 17 de julho de 2024

A tradicional quadrilha junina de Coronel Xavier Chaves

O município de Coronel Xavier Chaves está localizado no centro-sul do estado de Minas Gerais, na Mesorregião Campo das Vertentes, Microrregião e Região Imediata de São João del-Rei, Região Intermediária de Barbacena. Área territorial de 140.954 km2, população 3.486 habitantes (senso IBGE/2022). Seus primórdios remontam à primeira metade do século XVIII, com histórico de mineração aurífera e atividades de fazendas. 

Nos dias atuais a sede municipal se destaca pelo patrimônio edificado bem cuidado, ruas extremamente limpas, boa arborização, tradição consolidada na produção de esculturas em pedras ("Cidade das Pedras"), notável artesanato de bordados e rendas de abrolhos, eventos culturais concorridos e bem organizados, grupos da cultura popular bem ativos e genuínos (Boi de Caiado, Folia de Reis, Congado, Quadrilha), além de Banda de Música em plena atividade e um grupo de trabalhos de inculturação com valores afro, que trabalha fortemente na conscientização contra o racismo e a discriminação. Afamados são os torresmos dessa terra e a produção de cachaça tem muita relevância, com destaque para a existência de um engenho que remonta ao século XVIII (considerado como o mais antigo em funcionamento no país).

Nesta postagem o Blog Tradições Populares das Vertentes focará suas atenções no grupo de quadrilha junina local, batizado "Arraiá dos Fundos", sediado no bairro Vila Mendes, abordando um pouco da história oral de seu surgimento. 

Os grupos de quadrilha junina na região se rarefizeram com os anos, diluídos diante de novas influências aportadas nas festas de inverno, onde habitualmente ocorrem (junho-agosto). Neste sentido, os grupos independentes, de organização com base comunitária são poucos nesta região atualmente. Entretanto são mantidas as danças de quadrilhas juninas no contexto das escolas e feiras, mais ou menos improvisadas e sujeitas aos modismos impostos pela cultura massiva, muitas vezes se aproveitando dos ritmos em voga a cada época (sertanejo, country, funk, etc), com estilizações acentuadas de figurino e coreografia, que as distanciam imensamente de suas raízes. 

No entanto, o Arraiá dos Fundos se comporta como uma exceção neste cenário regional, pois se mantém como uma quadrilha independente de outra instituição, algo que até quarenta anos passados era relativamente comum. Tanto mais, conserva o figurino típico, marcação e coreografias tradicionais. Para falar deste grupo cultural irremediavelmente é preciso mencionar que, de um modo geral, o povo xavierense participa de seus aspectos culturais com muita autenticidade e afinco. Destaca-se no campo cultural por cultivar diversas manifestações populares em plena autenticidade.  

Num segundo aspecto é preciso referenciar com louvores o papel do marcador da dança de quadrilha aqui abordada: Rosnei José Silva, mestre de obra de profissão. Natural de Coronel Xavier Chaves, nascido na Canoa de Cima, em 1966. Sua sensibilidade para os movimentos culturais e sociais o torna muito ativo na participação na banda (tocando pratos) ou na folia (pandeiro). Já organizou um time de futebol infantil, batizado Ypiranga, entre 1993 e 1996. Mas é na quadrilha que expande suas potencialidades, na qual, de fato tornou-se um mestre. 

Narrou que em sua infância (aos 12 anos de idade) havia uma antiga quadrilha de adultos na sua cidade. Ele ia com a irmã para dançar. O organizador da época não consentia a participação de crianças, mas a irmã podia dançar, pois já era maior um pouco. Rosnei nutria grande desejo de ingressar nas fileiras de dançadores, mas ante a proibição, sentava-se nos degraus do salão paroquial a observar a dança, gostando do que via, mas, decepcionado por não poder fazer parte, jurava a si mesmo que um dia ainda marcaria uma quadrilha. Desta passagem inicial que reflete o sonho de uma criança, o vislumbre de planejamento do futuro, Rosnei fez um desenho, muito representativo, aqui exposto: 


Segundo sua narrativa, certa ocasião faltou um par na dança e o marcador o chamou a participar. Foi quando começou. Uma vez, numa quadrilha da escola estadual, o marcador não foi ensaiar e Rosnei se candidatou, dizendo à professora que marcaria a quadrilha. Continuou marcando na escola desde os 13 anos e seguiu. Aos 18 anos intensificou a atividade já fora da escola, em quadrilhas improvisadas. Até que um dia, no povoado da Água Limpa, o convidaram a marcar e foi então a primeira vez que marcou uma quadrilha oficial de adultos, e desde então continuou. Desta quadrilha marcada na Água Limpa, em 1991, é que  Rosnei conheceu Maria Aparecida  Silva (conhecida Cida), que se tornou sua esposa e ela é a atual Presidente do grupo, nos seus dizeres, seu braço direito em tudo, no sentido do protagonismo. Destacou também o papel do sr. Benedito  Trindade da Silva,  conhecido Bené, Vice Presidente. 

Mais tarde, porém, resolveu fundar um outro grupo. Isto foi nos idos de 1993. Os ensaios aconteciam na rua, diante da sua residência, como organizador, à Rua Geraldo Passarini, nº267, no bairro Vila Mendes. Inicialmente ele marcava um pouco da quadrilha, e um senhor idoso, José Catarino, marcava outro tanto, intercalando ambos para cumprir as quatro partes. Nos ensaios não havia sanfoneiro, dançavam ao som mecânico (disco de vinil), mas no dia da apresentação iam com sanfoneiros. A ausência de cobertura levou-os num segundo momento a transferir os ensaios para a sede do salão comunitário do bairro, onde ainda permanecem. Rosnei informou, que ao contrário do antigo marcador de quadrilhas que não consentia a participação das crianças ele incentiva sua presença, como aposta na semente da continuidade da tradição pela força do aprendizado e prática, sem excluir ou menosprezar os adultos e idosos. Desta disposição decorre que em 2018 o grupo tinha participantes na faixa etária dos 10 aos 84 anos. Sua paixão pela quadrilha se revela também pela afirmação que, a serviço, residiu por dez anos na capital mineira, donde vinha aos finais de semana para ensaios e apresentações da quadrilha. Ao longo dos anos muitas pessoas passaram pelo Arraiá dos Fundos como participantes, que se tornou um grupo de convívio, prática cultural e aprendizado. 

Com o passar dos anos o grupo adotou uma bandeira e um hino, em 2014. A primeira bandeira  foi pintada por Romulo, irmão de Rosnei, a atual foi pintada pelo próprio Rosnei. 

Rosnei e o autor deste texto segurando a bandeira da quadrilha Arraiá dos Fundos. 
Foto: Betânia Nascimento Resende, 12/09/2022. 

Trajes da quadrilha, no salão onde ensaiam, fotografados durante a pandemia de COVID-19. 


O hino foi uma criação conjunta de Rosnei, sua esposa Maria Aparecida; Rosiana - irmã do marcador, Tamara e Márcio Natal.  É cantado na mesma melodia da conhecida música sertaneja "Moreninha linda!" (canção da dupla Tonico e Tinoco). 

Rosnei também desenha e corta parte dos figurinos dos vestidos. 



Conjunto de bonecas vestidas com manequins da quadrilha. 

O grupo ensaia alguns meses antes do período de apresentações (junho a agosto). Formado por voluntários e sem fins lucrativos, atende aos convites do poder público e da iniciativa privada para suas exibições coreográficas, bastante variadas e bem ensaiadas, caracterizadas por movimentos bem sincronizados e marcação irreverente. O grupo sobrevive de doações para custeio geral das despesas, sobretudo do figurino. Faz se acompanhar por músicos populares, tocando acordeon, violão, pandeiro e caixa, com grande animação.

Desde o ano de 2017 o grupo ocupa o restante do ano que não há apresentações e ensaios da quadrilha com práticas de teatro amador, promovendo ensaios e apresentações.


Desenhos de Rosnei, alusivos à tradição da quadrilha junina. 

Ao comentar sobre esta quadrilha, quando de uma participação em festa junina acontecida na cidade de São João del-Rei, Sacramento (1999) afirmou: "Aquela quadrilha, com seus trajes típicos representou, com a maior autenticidade e valor folclórico, o Casamento Caipira e, em meu modesto entendimento, está apta a animar qualquer Festa Junina que tenha o desejo de ser eminentemente autêntica."

Recorte de jornal contendo matéria de autoria de SACRAMENTO (1999), colada em caderno, conservada pelo Marcador e Coordenador da Quadrilha Junina, Rosnei. 


O grupo de Quadrilha Arraiá dos Fundos, da Vila Mendes, foi formalmente constituído em cartório no ano de 2002, contando com diretoria e é um bem inventariado (ano 2019) e por este mecanismo reconhecido formalmente como patrimônio cultural do município de Coronel Xavier Chaves.



Fotografias da Quadrilha Arraiá dos Fundos, apresentando-se na festa de Santo Antônio,
no povoado do Sumidouro (Coronel Xavier Chaves). Fotos: Ulisses Passarelli, 15/06/2024. 


Referências:

Coronel Xavier Chaves. Portal do IBGE - panorama.  (Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/coronel-xavier-chaves/panorama - acessado em 23/06/2024) 

Prefeitura Municipal de Coronel Xavier Chaves / Prefeitura / Patrimônio Cultural / Lista de Bens Protegidos. (Disponível em: https://coronelxavierchaves.mg.gov.br/prefeitura/wp-content/uploads/2021/12/CXC_Divulgacao-1.pdf  - acessado em 11/07/2024) 

SACRAMENTO, José Antônio de. Festas Juninas: tradições ainda vivem! Gazeta de São João del-Rei, 03/07/1999; Tribuna Sanjoanense, n.986, 06/07/1999. São João del-Rei. (Disponível em: https://patriamineira.com.br/wp-content/uploads/2023/10/Tradicoes-das-Festas-Juninas-Sao-Joao-del-Rei-1.pdf - acessado em 11/07/2024) 

Rosnei José Silva: informações pessoais e via aplicativo Whats App - a quem agradecemos inclusive por ceder para esta postagem, as fotos das bonecas e de seus desenhos. 


Sobre esta quadrilha ver: 

Quadrilha Arraiá dos Fundos, Lei Aldir Blanc, 2020  

Quadrilha Arraiá dos Fundos na Festa do Sumidouro, 2023 

Grupo de Quadrilha Arraiá dos Fundos da Vila Mendes - Coronel Xavier Chaves/MG  

Quadrilha Junina, Coronel Xavier Chaves/MG, 2023

sábado, 8 de junho de 2024

14º Encontro da Cultura Popular do Caquende

No extremo sudoeste do município de São João del-Rei, junto à represa de Camargos, que armazena as águas do Rio Grande, está o povoado do Caquende, junto ao antigo ponto de travessia do atalho do Caminho Velho, por onde passaram sertanistas e povoadores no início do século XVIII, em pleno Ciclo do Ouro. 

Caquende celebra sua identidade cultural e o valor do homem do campo através do Encontro da Cultura Popular. O evento como em geral toda área cultural, foi impactado pela pandemia de COVID 19, estando sua ocorrência comprometida por algum tempo. Ora retomada a sua plenitude, já está na décima quarta edição, acontecida de 25 a 28 de abril de 2024. Como de costume, a cada ano homenageia um renomado escritor (a). Desta vez a escolhida foi a escritora Conceição Evaristo. A programação foi bastante diversificada e digna de atenção. 

                                       

                                        

                                       

                                       

                                       

Como novidade as apresentações das danças rurais foram transferidas para o sábado, deixando o domingo mais livre para as congadas e folias.

O café da manhã comunitário contou como de costume com as quitandas tradicionais, um café muito saboroso e de fartura, seguido a partir das 10 horas pelas atividades do grupo Artes das Gerais, vindo de São João del-Rei, que trouxeram exímias apresentações de capoeira e maculelê. 

Também notável foi a participação do grupo de jomba de roça local, centrado nos lavradores, fazendo a percussão de suas ferramentas, quais sejam enxadas, machado, serra, em movimentos coreográficos e cantorias até a roça de milho, onde transcorreu a representação da colheita do milho. Como sempre, à colheita e quebra do milho se segue a típica distribuição de alimentos: angu doce, na panela de ferro, e as broas, nas peneiras de taquara. O almoço traz o sabor da comida mineira e a união ao redor do alimento, como momento de convívio social, congraçamento, reencontro de amigos e troca de experiências. 

As congadas e folias participaram do cortejo no largo do povoado e na sequência fizeram apresentações individuais na tenda armada ao centro. Fechando a tarde, houve o concerto de encerramento com a Banda de Música Aquiles Rios, de São Sebastião da Vitória. 

O Encontro da Cultura Popular continua sendo um evento da maior significação por valorizar fortemente o homem do campo, ao revelar as manifestações culturais de alguma forma vinculadas à vida do lavrador tradicional. Seja pelas danças, pelo uso de artefatos típicos da agricultura familiar de raiz como carro de bois, monjolo, serra, engenhoca, seja pela própria ambientação e figuração das atividades. Está nítido que se enaltece a cultura caipira, tantas vezes tratada com opróbrio, mas nesse encontro elevada ao patamar de protagonista. Ao mesmo tempo, o Encontro traz um releitura do mundo rural em sua tipicidade, hoje de espaço muito restrito em razão das mudanças da sociedade,  com o êxodo do campo e o crescimento do agronegócio, dando uma nova configuração ao trabalho e espaço rurais. 

É um evento de grande significação, que merece um alto nível de atenção, apoio, suporte, para que possa continuar acontecendo da melhor forma possível, com toda autenticidade que lhe é característica.  Funciona como se fosse um mutirão de cultura, onde os grupos não são apenas meras atrações, mas de fato partícipes inseridos numa ambiência de tradição. O Encontro da Cultura Popular do Caquende oportuniza uma vivência do patrimônio cultural imaterial em sua essência. 

Bandeira da Folia de Reis de Carrancas - pintura dos Reis Magos do Oriente.

Catirina segura a bandeira da folia de Carrancas. 

Folia de São Sebastião "Cláudio Bento", Lagoa Dourada. 

Os tradicionais bonecos do grupo Pilão de Nhá, Caquende. 

Pilão, Caquende. 


Mastro usado para a dança das fitas, pelo grupo cultural de Brasilinha (Madre de Deus de Minas). 

Monjolo, Caquende. 

Maculelê, pelo grupo Artes das Gerais, São João del-Rei. 

Jomba de roça, pelos lavradores, Caquende. 

Colheita do milho, Caquende. 

Folia de São Sebastião, de Coqueiros (Nazareno). 

 Represa de Camargos, Caquende. 

Placa de Sinalização Turística próximo à margem da represa. 

Engenhoca Quebra-peito, Caquende. 

A importância de uma árvore: espaço para convívio social no largo do povoado. 

Capela de Nossa Senhora do Carmo, Caquende. 

Cruzeiro no largo do Caquende. 

Congo de Carrancas. 

Marujos de Dores de Campos. 

Demonstração de manejo da serra de desdobrar. 

Folia das Mulheres, Jardim São José, Bairro Tijuco, São João del-Rei

Folia do Divino "Embaixada Santa", Bairro Araçá, São João del-Rei.

Créditos: 

Texto e fotos - Ulisses Passarelli