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sábado, 7 de julho de 2018

Violas: de Portugal aos sertões

             As violas são instrumentos musicais cordofones dedilhados, de procedência ibérica, derivadas da vihuela medieval, que por sua vez procede de primitivos instrumentos de cordas do oriente médio, notadamente de antigos alaúdes, da época do império árabe, de quando os mouros dominaram a Península Ibérica.

                Em Portugal desenvolveram-se várias modalidades de violas, distintas por algumas características e agrupadas em dois conjuntos, com maior ou menor curvatura do corpo (enfranque). Assim, no território insular surgiram as “violas de arame”, ganhando peculiaridades na Ilha da Madeira (viola madeirense) e no Arquipélago dos Açores (viola micaelense e viola terceirense). Igualmente na parte continental daquele país: viola campaniça ou de Beja, típica do Alentejo; viola braguesa, da região do Minho; viola beiroa, da Beira Baixa; viola toeira, da região da Beira Alta, sobretudo Coimbra; viola amarantina, do Douro Litoral, que evoca em seu nome a cidade de Amarante, onde faleceu o célebre São Gonçalo (*), protetor dos violeiros.

Chegaram ao Brasil no princípio da colonização portuguesa, ainda no século XVI. Das caravelas desembarcaram e os padres jesuítas as usaram para os trabalhos de catequese dos índios nos aldeamentos ao longo da faixa litorânea. Logo o instrumento caiu no gosto popular e passou ao uso da população comum, na mestiçagem cultural de tantas etnias formadoras da nacionalidade brasileira.

                Então a viola original portuguesa passa a ser feita aqui, com madeiras tropicais, que lhe conferiram outra sonoridade. A adaptação de formas e curvaturas possibilitou o ajuste de novas madeiras. As facilidades ou dificuldades de toques, as experiências de execução das músicas, as características regionais de cada cultura, contribuíram para o surgimento de muitas afinações diferentes, que ganharam nomes pitorescos: rio abaixo, rio acima, cebolinha (simples e ré acima), cebolão (em ré / em mi), natural, paulistinha, paraguaçu, cana verde, boiadeira, riachão, repentista e outras.

                Essa adaptação da viola portuguesa à realidade brasileira gerou a viola caipira, tipicamente nacional, também conhecida por viola sertaneja. Uma de suas variações, no nordeste brasileiro, alcançou grande popularidade a partir da década de 1940, a chamada viola dinâmica, característica pelo som melódico, de timbre metálico, graças à presença estrutural de um disco metálico contido no bojo do instrumento, cuja vibração se reverbera por pequenos amplificadores na caixa. A viola dinâmica é característica do uso dos poetas repentistas nordestinos.

                Em outras regiões nacionais a viola se firmou na tradição musical folclórica, desde as danças populares como as catiras, curraleiras, fandangos, dança de São Gonçalo, até as congadas e folias de Reis, do Brasil Central e do Sudeste ao Sul. Para o Norte, em terras amazônicas, entrou a viola como acompanhamento de certas danças típicas e no aparato musical religioso de benditos e ladainhas.

Para mais, Brasil afora, acompanhava modinhas e lundus, colaborando intensivamente para a construção do universo da música popular brasileira. Mas foi sobretudo nas modas e toadas de violas, ponteios e rasqueados, na mão hábil e trabalhadora do homem rural, que a viola se despontou na composição das chamadas duplas caipiras e se popularizou imensamente no centro-sul brasileiro. Em oposição, o violão era um instrumento desde sempre mais urbano, ligado aos poetas e literatos, música de boemia e das canções. Mas na formação das duplas, viola e violão se casaram em perfeita harmonia, aquela com dez cordas, este com seis.

Por toda parte a cultura tradicional a envolveu em lendas. Desenvolveram-se simpatias ao seu redor e um universo cultural próprio se estabeleceu sobre a viola, se configurando como um dos instrumentos mais importantes da música brasileira.

                Assim a viola participou como elemento estruturante e simbólico da música sertaneja, vista sempre pelo aspecto poético, bucólico, evocador de brasilidade, trazendo à tona a nostalgia da roça.

Depois de longo período de ocaso, a viola experimenta desde meados dos anos 80 ou começo da década seguinte um soerguimento e agora um período de efervescência musical, graças ao virtuosismo de grandes músicos solistas ou de conjunto, que trabalhando na mídia e na educação patrimonial, nos revelam o valor incomensurável deste instrumento, tão afeito aos cantares brasileiros, de caráter identitário à própria cultura nacional. A viola hoje galga os rumos da música profissional, em franco crescimento.

Violeiro - Lourival Amâncio de Paula, folião e capitão - São Gonçalo do Amarante (SJDR-MG). 2010.

Violeiro - Manoel Teodoro do Nascimento - participante das contradanças, Passos/MG, jul.1997.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS (básicas)

ANDRADE, Mário de. Danças Dramáticas do Brasil. São Paulo: Martins, 1959.
ARAÚJO, Alceu Maynard Araújo. Folclore Nacional. 2.ed. São Paulo: Melhoramentos, 1964.
CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário de Folclore Brasileiro. Rio de Janeiro: EDIOURO, [s.d]. 930p.
HINDLEY, Geoffrey. Instrumentos musicais. São Paulo: Melhoramentos, 1981. Coleção Prisma.

REFERÊNCIAS NA INTERNET (básicas)

Violas portuguesas. Wikipédia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Violas_portuguesas (acesso em 04/07/2018, 15h 53min)
As afinações da viola. Casa dos Violeiros: http://casadosvioleiros.com/homolog/index.php/a-viola/9-a-viola-caipira/13-afinacoes-da-viola (acesso em 04/07/2018, 15h 54min)
Viola caipira: por que uns usam afinação em Mi e outros em Ré? Curso de Viola: http://auladeviola.com/viola-caipira-por-que-uns-usam-afinacao-em-mi-e-outros-em-re/#sthash.pXLhruvE.dpbs  (acesso em 04/07/2018, 15h 56min)
Viola dinâmica. You Tube: https://www.youtube.com/watch?v=Z2IrbScNy44  (acesso em 04/07/2018, 15h 56min)     
Notas e Créditos

* Sobre São Gonçalo do Amarante ver: https://pt.wikipedia.org/wiki/Gon%C3%A7alo_de_Amarante    
** Texto (04/07/2018) e fotografias: Ulisses Passarelli
*** Revisão e acréscimos: 18/02/2024

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