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quinta-feira, 25 de junho de 2015

Roda, morena!

Uma antiga tradição nesses dias frios de junho era a dança em redor das fogueiras dedicadas aos santos desse mês: Santo Antônio, São João Batista e São Pedro, em festas de intenso valor comunitário e de forte apelo rural. A confraternização se fazia por gestos simples de alegria espontânea e através das danças, das quais a quadrilha se tornou a soberana. 

Mas além desta outras existiram pelos povoados semeados entre as serras do interior. Algumas, de herança cultural africana, como os batuques, caxambus, quimbetes e lundus; outras, evocando movimentos ibéricos, como o desaparecido esquinado, o engenho-novo, a cana-verde e a roda-morena (também chamada rodinha, roda de São João, chora-morena). 

Sobre esta última em especial, acontecia sem época certa para ser efetuada, conquanto fosse comum nas festas juninas. Nesta dança rural os dançantes, sem distinção de sexo ou idade, formavam um círculo e dançavam, com um personagem solista ao centro, que cantava uma quadra dentro do ritmo certo. Os demais respondiam com o refrão. Voltava à roda e outro vinha ao centro, cantando outra quadra. O coro repetia o refrão e assim por diante. 

A título de exemplo eis uma roda procedente de Coronel Xavier Chaves (*):

Refrão (coro): 
"Roda, Morena! 
Morena, roda!” - bis

Estrofes (solista): 
“Eu vim de longe, 
tô chegando agora, 
eu vim com Deus 
e Nossa Senhora!” 

ou 

“Você disse que vai, 
eu também quero ir; 
você não vai mais 
também já decidi ...” 

Mas além da dança, sob o mesmo nome foi conhecida uma modalidade de canto de trabalho adotado nos mutirões e nos serviços pagos de roçar pasto. Os trabalhadores mais rápidos ficavam nos extremos do eito e os menos habilidosos ao centro. Na medida que o eito avançava, os da beirada iam adiantando mais com os golpes da foice fechando gradativamente um semicírculo. Uma vez formado, trabalhavam no sentido de desfazê-lo e assim caminhava o eito. Numa versão de Antônio Carlos, cantavam (**): 

Refrão (coro): 
“Roda morena! 
Roda morena! 
Você vai, não me leva, 
oi, morena!...” . 

Estrofes (solista): 
“Eu desci pra rua abaixo 
num cavalo marchadô, 
uma moça na janela 
banô lenço e me chamô...” (abanou lenço)

“Moça tu não me conhece, 
não sabe da onde eu sô, 
da macega eu faço a cama, 
do sereno o cobertô...” 

“Eu sou o cravo da índia, 
que o destino estraçaiô! 
Abrandai meu coração 
que a saudade me deixô...” 

“Querido cravo da Índia, 
que o destino estraçaiô, 
se o cavalo der garupa, 
me leva, qu’eu também vô!”


Notas e Créditos

* Informante: Sr. Luís Santana, 1996. 
** Informantes: Sr. José Cândido de Salles e Sra. Elvira Andrade de Salles, 1999. 
*** Texto: Ulisses Passarelli


Apresentação de "chora morena" em Itutinga/MG, 2019

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