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terça-feira, 9 de outubro de 2012

Um tradicional grupo de pastorinhas das Vertentes

PASTORINHAS EM SÃO TIAGO [1]

         Sob o nome de pastorinhas é conhecido um grupo folclórico do Sudeste do país, constituído de crianças, no geral meninas, trajadas à pastora. No período natalino visitam as residências e igrejas, cantando na Missa do Galo ou noutra celebração. Saúdam os presépios com cantos, danças e toques instrumentais.

É uma tradição de bases históricas ibéricas. Através de variados personagens e por vezes de cenas dramáticas, anunciam a natividade de Jesus e episódios correlatos à boa nova, tais como a visita dos magos e dos pastores. Além disso, podem recolher ofertas. É uma modalidade reiseira.

Existe Brasil afora diferentes versões congêneres dessa manifestação. Rarefeita em toda sua área geográfica de ocorrência, encontra em Minas Gerais algum refúgio nas comunidades tradicionais. No centro-sul do estado, microrregião Campo das Vertentes, foi costume muito arraigado e ora em ocaso. Persistem três grupos ativos, sendo um em São João del-Rei, outro em Tiradentes e um terceiro em São Tiago. Deste último se ocupa este texto, segundo observações realizadas em 2001.

            Desconheço a data precisa de sua introdução nesta cidade, o nome do primeiro responsável ou de onde seria o seu modelo. Já existia na década de 1940, organizadas pela sra. Percília Maria da Conceição. Mais tarde assumiu o grupo a sra. Antônia Geralda São Tiago. Desativou-se em 1981. Reativou-se vinte anos mais tarde, com notável apresentação na Festa do Divino, de São João del-Rei.

            O grupo conta com 16 a 20 crianças pré-adolescentes. As Pastoras trajam vestido branco, com avental vermelho, chapéu de palha com fita vermelha ao redor da copa. Carregam xique-xiques feitos de tampinhas de garrafas amassadas, trespassadas por um arame e presas a uma haste de madeira. São os únicos instrumentos. Há também os personagens: São José, Nossa Senhora (que carrega a imagem do Menino Jesus, oferecendo-a para o beijo devoto) e os Três Reis Magos, todos com trajes caracterizadores.

            Não é grupo peditório, mas levam uma bandeja sobre a qual se pode depositar o donativo voluntário.

            O primeiro canto que entoam é o seguinte:

Natal! Natal!
Os anjos cantaram
Glória in excelsis
Nasceu Jesus!
glória a Belém,
ao peregrino,
Nasceu a vida,
hinos entoaram
Filho do Eterno,
nasceu a luz.
vamos também.
Jesus Menino.

            A primeira quadra é muito tradicional. Bisada, funciona como refrão.

A seguir entoam qualquer outra peça do repertório, que inclui também a conhecida canção natalina “Noite Feliz”, de Franz Gruber. Não há ordem fixa para a execução. Outro canto:

Louvemos ao Filho
Louvemos ao Filho
Louvemos ao Filho
da Virgem Maria;
que veio da altura;
que é feito menino;
que glória na Terra,
tomando os aspectos,
terá sobre a Terra,
no céu alegria!
da humana figura!
sublime destino!

            Também aqui a primeira quadra é o refrão.

Vinde cristãos,
Foi numa noite venturosa
Juntemos aos pastores,
vinde à porfia,
em que nasceu o Salvador
vamos com eles a Belém
cantar um hino de louvor
e os anjos com voz harmoniosa,
e lá nós cantemos
hino de paz e alegria.
deram no céu este clamor.
ao Salvador que hoje vem.

            O refrão lamentoso é em latim: “Glória! / In excelsis Deo” (Glória a Deus nas alturas).

Ainda em latim, cantam um tradicional hino natalino. A tradução é uma gentileza do professor Antônio Gaio Sobrinho:

Adeste fideles
(Aproximai-vos fiéis
Natum videte
(Vêde nascido
laeti triunfantes,
alegres, triunfantes,
regem angelorum!
o Rei dos Anjos!
venite, venite,
vinde, vinde,
Venite, adoremus! - bis
Vinde, adoremos!
in Bethlém!
a Belém!)
Venite adoremus Dominum
Vinde adoremos o Senhor!)

            A coreografia das partes é quase inexistente, limitando-se o pé de dança ao balançar ritmado do corpo na cadência da toada musical.

            O grupo mescla características eminentemente folclóricas com outras de origem erudita ou ao menos semi-culta, como o hino católico cantado em latim. Sua organizadora é uma devota afeita aos rituais da Igreja, sendo muito ligada à vida musical daquela cidade e a outras manifestações folclóricas locais.

            Chama especialmente a atenção no conjunto sua composição estritamente feminina, inclusive nos papéis masculino, a saber, São José e os Reis Magos, representados por meninas travestidas de homens, segundo observação efetuada em 2001. Note-se que alguns grupos deste folguedo abrem exceção à participação de meninos na execução dos papéis masculinos. Ë de se observar também que certos versos são tradicionais no repertório de outras pastorinhas e folias de Reis.

            Anoto por fim, que se confrontado com outros modelos de Pastorinhas é um grupo relativamente simples na sua estruturação, com poucos personagens, conservando além das Pastoras, apenas aqueles outros de cunho bíblico. Sua singeleza não lhe diminui o valor, senão mesmo o reforça.

            A vida ativa deste grupo se deve hoje, sem dúvida alguma, aos esforços abnegados de sua fiel organizadora, que merece aplausos e o respeito de todos nós.

Pastorinhas, São Tiago / MG,1947. Foto de arquivo, que ilustrou a edição deste texto no jornal Cidadania (São Tiago, n.54, dez./2006 – jan./2007), uma gentileza do editor Ricardo Alessandro da Mata.


Pastorinhas,São Tiago / MG, 1981. Foto cedida para reprodução pela mestra do grupo, sra. Antônia Geralda, a quem dedico e manifesto gratidão. 
* Texto: Ulisses Passarelli


[1] - In: Cidadania, São Tiago, n.54, dez./2006 – jan./2007. 

2 comentários:

  1. Prezado Ulisses,

    Um humilde tributo de reconhecimento ao seu trabalho.

    http://diretodesaojoaodelrei.blogspot.com.br/2012/10/sao-joao-del-rei-alem-do-rei.html

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    1. É... além do rei tem muita coisa! E São João é o pólo cultural dessas vertentes do saber! Parabéns ao "Direto de São João del Rei" que enxergou a muito esta riqueza! Obrigado!!!

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