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quarta-feira, 1 de outubro de 2014

A Oração do Peregrino e o Cabrugeiro

No universo da cultura popular, cabrugeiro é o sujeito que mexe com magia negra. Espécie de feiticeiro. Diz uma das versões da “Oração do Peregrino”: 


“Oração do Pelengrino, 
quando Deus era menino,
que andava pelo mundo 
com sete candeias acesas 
e sete livros a ler: 
feiticêro, mandinguêro, cabrugêro 
catimbozêro e cangerista, 
comigo não tem poder! 
Nem de dia, nem de noite
nem hora nenhuma, amém!” 

Sua jaculatória completa diz: “Deus pode! Deus quer! Eu também quero e posso e faço enquanto quiser!” (*)

A origem do termo não é clara e vem carregada de repulsa. Talvez o termo cabrugeiro possa estar corrompido: Caldas Aulete registra o verbete "cabungueirocomo: a) “indivíduo encarregado do despejo ou recolhimento de cabungos” (= penico, urinol, latrina); b) “sujeito porco ou desprezível” ... Aí estaria o sentido de opróbrio social aos praticantes?

Talvez, porém, seja alteração de "cabuleiro", praticante da cabula, religião mediúnica de matriz africana, origem banto, descrita no passado para o estado do Espírito Santo mas quiçá conhecida em outras paragens. 

Noutra possibilidade, Cascudo registra no seu dicionário o verbete ‘caborje’ no sentido de amuleto, patuá, mandinga defensora. Cabrugeiro viria de “caborjeiro”, o feiticeiro que prepara caborjes? 

De qualquer forma está implícito nesta oração a preocupação de se livrar dos encantadores, ao se enumerar vários estilos de práticas religiosas e exorcisá-las com palavras que apelam para o número cabalístico sete, símbolo da totalidade espiritual. A Oração do Peregrino visa abrir os caminhos dos empecilhos tramados pelos inimigos que trabalham na magia, com o mundo desconhecido, místico, espiritual, acreditando-se que rezando-a com fé, tais feiticeiros não terão poder, em hora nenhuma, amém!



Face de Cristo. Detalhe de um cruzeiro.
Largo da Cruz (Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno).
São João del-Rei/MG, 2013. 



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário Brasileiro de Folclore. Rio de Janeiro: Ediouro, [s.d]. 930p.
AULETE, Caldas. Dicionário contemporâneo da língua portuguesa. 3.ed. Rio de Janeiro: Delta, 1978. 5v. 3998p.


Notas e Créditos

* Informante: Elvira Andrade de Salles, Santa Cruz de Minas, 1995
** Texto e foto: Ulisses Passarelli  

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