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segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Grutas religiosas em São João del-Rei - parte 2

A tradição das grutas religiosas é muito arraigada em nossa região. Em São João del-Rei essas construções de pedra são especialmente abundantes e queridas. Em torno delas se aglomeram os fiéis das pequenas comunidades para a reza dos terços, para festejos do orago, coroações de Nossa Senhora e por vezes, para recepcionar as Folias de Reis que de passagem por sua área as visitam.

A imagem posta em seu interior é tratada com veneração. Amiúde recebe flores e velas.

Procuram via de regra dar um tratamento urbanístico ao redor, com calçadas de pedras ou concreto magro, instalação de bancos e mesas, jardins, iluminação, grades e lixeiras. Tudo é instalado e mantido pelos devotos da comunidade que assim convertem o aspecto de praças, largos, cantos de rua fora do alinhamento geral. O fato motivado a princípio pelo elemento religioso, termina por ultrapassá-lo pois este espaço se torna uma área de socialização comunitária, uma referência: as crianças para iniciar uma brincadeira marcam de se encontrar na gruta, tal hora; senhoras sentam-se nos bancos na fresca da manhã para fazer um crochê; alguns homens se aproveitam do banco largo ou da mesinha para uma partida de damas ou de xadrez, dominós, dados ou purrinha. Demonstra também o desejo da população pela melhoria do espaço urbano, tomando a atitude de fazê-lo da sua forma e por seu meio, onde o poder executivo municipal deixa a desejar.

A edificação das grutas não raro obedece a regime de mutirão.

Embora existam noutras regiões, aqui são abundantes e sua construção é um fenômeno crescente nas duas últimas décadas. São numerosas na zona urbana de São João del-Rei e começam também a se expandir para a zona rural.

É um fenômeno a ser devidamente estudado. O ponto de partida da investigação talvez seja o caminho inverso ao êxodo rural, que traz a cultura das roças à cidade. As populações distritais, com dificuldades de acesso a vários serviços ou tendo de se deslocar com muita frequência à cidade para acudir às suas necessidades mensais, tem contato na cidade com essas construções singelas e não tarda a instalá-las também nas vilas. Por outro lado existe a questão da própria liberdade religiosa. Nas igrejas existe um sistema hierárquico vigente a ser respeitado e os agentes eclesiásticos controlam as atividades conforme as normas católicas. Ali se congregam irmandades, pastorais, movimentos, cada qual delimitando sua função, espaço, prestígio e influência. Já as grutas não tem isto definido. Seus zeladores podem agir livremente, o que não significa que o façam de forma desenfreada, pois se obedece a uma norma social, e existe coerência com a doutrina religiosa. Contudo, é inegável que estejam mais soltos. O agente leigo trata mais perto de sua comunidade do elemento religioso e busca integrar as atividades da gruta à programação religiosa do lugar. Não é raro que convidem um padre para celebrar uma missa campal nas grutas.

Além da motivação propriamente de pesquisa antropológica, as grutas bem serviriam para desenvolvimento de um roteiro turístico-religioso, demarcadas em mapa, com georeferenciamento, etc. E o estímulo ou incremento criterioso e dialogado com a comunidade seria uma ação a se pensar.

Em São Gonçalo do Amarante (ex Caburu) a gruta foi construída com recursos angariados pela folia do Divino local, em jornada de visita às casas da própria comunidade. Ainda hoje serve também de local onde se concentra o reinado na Festa do Rosário. Os congados vem até ela recolher os reis, rainhas, príncipes e princesas para escoltá-los até a igreja.



Gruta de Nossa Senhora de Lourdes, 29/05/2013.
São Sebastião da Vitória (São João del-Rei). 

Gruta do Divino Espírito Santo, 10/06/2010.
São Gonçalo do Amarante (São João del-Rei).  

Gruta de São Pedro, 24/10/2016.
Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno (São João del-Rei).

Para saber mais sobre este assunto acesse o link abaixo e leia a seguinte postagem, ora revista, ampliada e acrescida de fotografias: Grutas Religiosas em São João del-Rei.

Notas e Créditos

* Texto e fotografias: Ulisses Passarelli

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